Larissagris 14/07/2023O SAL DAS LÁGRIMAS (RUTA SEPETYS)O medo é um caçador. Mas nós, bravos guerreiros, afastamos o medo com um peteleco. Rimos na cara do medo, o chutamos como uma pedra na rua. (Pág. 13)
Adolf Hitler havia declarado que os poloneses eram sub-humanos. Devíamos ser destruídos para que os alemães pudessem possuir a terra de que precisavam para seu império. Hitler dizia que os alemães eram superiores e não viveriam entre poloneses. Não éramos germanizáveis. Mas nossa terra era. (Pág. 15)
Pensei nos inúmeros refugiados que percorriam a dura e longa trilha para a liberdade. Quantos milhões de pessoas teriam perdido a casa e a família durante a guerra? Eu havia concordado com mamãe em mirar o futuro, mas, em segredo, sonhava voltar ao passado. Será que alguém tinha notícias de meu pai ou de meu irmão? (Pág. 17)
Em que os seres humanos haviam se transformado? Será que a guerra nos tornava perversos ou apenas ativavam uma perversidade que já espreitava dentro de nós? (Pág. 64)
Se observar com cuidado, querida, você não terá que perguntar. (Pág. 102)
Fiquei boa em fingir. Tão boa que, passado algum tempo, os limites entre minha verdade e a ficção ficaram borrados. E, às vezes, quando eu fingia realmente bem, chegava até mesmo a me enganar. (Pág. 115)
Mãe era âncora. Mãe era consolo. Mãe era lar. Uma moça que perdia a mãe tornava-se, de repente, um barquinho num oceano enfurecido. Alguns barcos acabavam flutuando para o cais. E alguns, como eu, pareciam flutuar cada vez para mais longe da costa. (Pág. 122)
- Disseram que só posso escolher um filho para levar no navio. Como posso fazer isso? Por favor, não me façam escolher. (Pág. 123)
Quando eu era pequeno, minha Mutter protegia meus olhos das doenças e deformidades. E tinha toda razão para fazê-lo. Há muita feiura e imperfeição no mundo. Sabemos que elas existem, mas criamos traumas adicionais quando somos forçados a olhá-las. Há coisas que é melhor ignorar. (Pág. 124)
- Nem sempre quem mata é assassino. Às vezes, nem sequer tem sangue nas mãos. (Pág. 133)
Cautela nunca é demais, Hannelore. O simples fato de alguém bater à porta não significa que você tenha que abri-la. Às vezes, doce menina, há lobos à porta. Se a gente não toma cuidado, eles podem nos devorar. (Pág. 134)
- Mas, Eva, minha cara, seus sapatos carregam o seu bem mais precioso: a sua vida. Não de atrase. Tudo o mais pode ser substituído. (Pág. 150)
- O Wilhelm Gustloff estava prenhe de almas perdidas, concebidas na guerra. Essas almas entupiriam seu ventre e ele daria à luz a liberdade delas. Mas será que alguém percebia? O navio fora batizado em homenagem a um homem, Wilhelm Gustloff. Meu pai me falara dele. Tinha sido líder do Partido Nazista na Suíça. Fora assassinado. O navio tinha nascido da morte. (Pág. 172)
Sua presunção era irritante. Aquele era o tipo de homrm que via uma fotografia numa parede e, em vez de admirar a imagem, olhava para seu próprio reflexo no vidro. (Pág. 235)
Espiei por uma brecha no aço e, na mesma hora, desejei não ter olhado. A cena lá em baixo era apavorante. Eu nunca tinha visto tamanho desespero. Os que foram deixados no cais estavam aflitos para subir a bordo. Os rostos se contorciam com seus gritos e súplicas. Mães tentavam atirar seus filhos pequenos para os passageiros no convés, mas não conseguiam jogá-los alto o bastante e eles caíam no mar. Mulheres gritavam e mergulhavam na água atrás dos filhos. (Pág. 236)
Que tolice a minha achar que éramos mais poderosos do que o mar ou o céu. Observei da balsa quando o belo mar profundo começou a tragar o navio de aço. De um só gole. (Pág. 272)
Flutuando no negrume do mar, fomos obrigados a assistir à morte maciça e grotesca de milhares de pessoas. Segurei a bebê com força e fechei os olhos. Mas as cenas continuaram a se desenrolar em minha mente: o convés fortemente inclinado. Uma mulher jogando seu bebê para um marinheiro. Ele estendeu os braços. Não alcançou. A criança bateu na balsa de metal e rolou para o mar. Milhares de pessoas desesperadas saltavam, batiam as pernas, engoliam água. A água do mar enchia bocas e narizes, causando o colapso dos pulmões. Ondas altas, mar raivoso, neve e vento. (Pág. 278)
Sabe, o medo é um caçador. Cerca-nos quando estamos desarmados e quando menos esperamos. E, depois, somos forçados a tomar decisões. (Pág. 282)
Durante minhas semanas em fuga, eu havia imaginado toda a sorte de situações. Havia contado todas as maneiras possíveis de morrer. Eram horripilantes, assustadoras. Eu tinha planejado cuidadosamente como me defenderia, que armas usaria. Mas isto eu nunca havia imaginado. Como é que a pessoa se defende da prolongada e insuportável agonia de saber que se renderá ao mar? (Pág. 284)
Se os romances históricos despertam o seu interesse, busque os fatos, a história, as memórias e os testemunhos pessoais que estiverem disponíveis. É sobre esses ombros que se assenta a ficção histórica. Quando os sobreviventes se vão, não devemos deixar que a verdade desapareça com eles. Por favor, dê-lhes voz. (Pág. 305)