Janaina 26/04/2023
Com uma linguagem realmente fabular, num texto curto e agradavelmente diagramado, o autor consegue a proeza de transformar um dos momentos mais aterradores da História em pura beleza. Uma beleza triste, é verdade, mas, ainda assim, belo. Muito belo.
De um lado, um casal que dá à guerra sua força de trabalho, nutrida pelo discurso distorcido, criminoso e conveniente do nazi-fascismo, enquanto vive cada dia para manter a própria subsistência.
Do outro, um casal judeu, ?grávido?, que se vê diante da necessidade de tomada de importantes decisões, enquanto transitam do campo de concentração de Drancy, na França, em direção ao desconhecido, na Polônia, na primavera de 1942.
Entre eles um trem. O trem que a lenhadora todo dia vê passar pelo bosque, supondo transportar mercadorias importantes sabe-se lá para onde, e que os operários da guerra imaginam levar judeus preguiçosos, desumanos e sem-coração para viagens de férias.
Quando a mercadoria mais preciosa, num ato de profundo desespero, é lançada pelo vagão, alcançando os braços da lenhadora, realizando o maior sonho que ousara sonhar, mudanças incontornáveis se instalarão na vida de ambos os casais.
Esta hora exige uma pausa, um respiro e pode nos levar a lágrimas e julgamentos. Mas quem somos nós, pobres mortais, para tentar entender, quiçá julgar, a atitude extrema de quem se vê diante da morte e imagina poder reduzir o seu efeito?
A história fala de coragem para tomar decisões, para enfrentar o sistema, para questionar o que antes parecia inquestionável. Mostra também o peso da comunicação como sustentáculo da ideologia desumanizante que justificou a mortes de tantos. E tangencia os efeitos colaterais da guerra em quem sobreviveu a ela.
Um texto lindo e triste que, pelo menos, nos presenteia com um final confortante que, infelizmente, não espelha a realidade do destino da maioria das vítimas do Holocausto