Nirvana: A verdadeira história

Nirvana: A verdadeira história Everett True


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Nirvana: A verdadeira história (Rock Legends #01)





As histórias precisam começar por algum ponto.
A minha história é uma bagunça, uma confusão de boates e trotes que deram errado; nomes e rostos que entravam por um lado e saíam pelo outro; noites que começavam com bebedeira e terminavam em amnésia; rastejando de quatro por aeroportos; socando paredes com as mãos nuas; cabeça raspada no terraço de um prédio, sob a lua vermelha; risadas, gritos e – bem no meio disso tudo – música; alta e farta, espontânea e rude, bonita e emocionante.
Eu preciso sempre lembrar. Este é um livro sobre o Nirvana. Não é sobre Kurt Cobain. As fofocas e as teorias da conspiração já foram todas retratadas detalhadamente por pessoas muito mais qualificadas para falar sobre esses assuntos do que eu – gente com interesse em história, em hits de sucesso e em manter o mito vivo. Foi o mordomo. Todo fã de Agatha Christie sabe disso. O mordomo é o culpado. Se não foi ele, então deve ter sido a babá. Acesso fácil, oras. As drogas cobraram seu preço. Era hereditário. Deve ter sido a babá. Talvez a esposa seja a responsável. Palavras são jogadas até que toda a percepção de realidade desapareça, sufocada por textos cínicos repetidos e piadas inocentes do passado.
“[…] os Melvins estavam saindo em turnê, e Kurt me convidou para ir até lá. Ele disse: ‘Ei, eles nos deixaram morar nesses apartamentos, venha quando quiser passar o fim de semana, Shelli está aqui com Krist’. Eles me ligavam e falavam: ‘Quando você vem, quando você vem?’. Finalmente, decidi ir passar um fim de semana. Combinamos de nos encontrar num show do Butthole Surfers e do L7 no Hollywood Palladium, e de lá seguiríamos para os apartamentos. Nós pegamos um avião, alugamos um carro, nos perdemos, e aí conseguimos achar o clube. Chegamos lá muito tarde. Encontramos Kurt, e Krist estava superbêbado.
Ou ele levou uma multa (por dirigir embriagado) ou atropelou alguém no estacionamento naquela noite. Então me lembro da Courtney – sobre quem tinha lido e ouvido falar por anos, através de outras pessoas que a conheciam ou tinham sido casadas com ela. Ela estava por perto […]”
Este é um livro sobre o Nirvana. Eu tenho que ficar me lembrando. Nirvana. Os amigos de escola Kurt Cobain e Krist Novoselic formaram a banda em Aberdeen, Washington, em meados dos anos 1980, levados por uma mistura de tédio e amor pela música. Não havia muito mais acontecendo. A rotina em casa era uma droga; nada para fazer além de assistir à TV – Saturday Night Live, The Monkees e filmes de ficção científica tarde da noite. A indústria madeireira que ajudara a erguer sua cidade natal havia muito tinha se mudado para outro lugar atrás de mão de obra barata. A vida era uma sucessão de empregos sem futuro, limpando quartos de hotel e servindo mesas. O punk rock os chamava – o punk rock e a cidade de Olympia, Washington. Formem uma banda. Por que não? Se é disso que vocês gostam, vão em frente.
“Morando em Olympia aos 20 anos, eu vivia em uma cidade onde as bandas não tinham baixista ou eram formadas por um teclado e um cantor, ou então alguém cantando junto com uma fita gravada ou com apenas um guitarrista. Tudo o que ouvíamos do resto do mundo era: ‘Vocês não são legítimos, isto não é rock de verdade’, principalmente vindo da cidade grande vizinha, Seattle. Eles riam da nossa cara, com piadas como:
‘Vocês não sabem tocar esses instrumentos, vocês não sabem o que estão fazendo, isto não é rock ’n’ roll’. Nos dias do hardcore, se você não fosse o Black Flag, ou não soasse como o Black Flag, as pessoas ririam de você por dizer que fazia punk rock. Hoje, os jovens vivem num mundo onde os duos são como The White Stripes e Lightning Bolt – bandas grandes e pequenas, duplas e artistas de laptop como RJD2 são a norma do mundo pós-Pitchfork. Nossa luta fez com que isso se tornasse possível. Eu ria dos velhos quando eu tinha 20 anos, quando eles diziam que haviam aberto o caminho para nós, e realmente não posso esperar que os jovens de 20 anos entendam que o Godheadsilo possibilitou o surgimento dessas bandas atuais, ou o Beat Happening ou o Mecca Normal. Eles passaram por toda a degradação, todo o trabalho duro sem retorno e todos os anos de chacota para que outras bandas pudessem fazer sucesso […]”
O Nirvana alterou sua formação e seu nome muitas vezes, trocando de baterista e mudando de cidade conforme as circunstâncias – antes de passar para o lado errado da cultura de celebridades. Eles eram ingênuos, acreditavam no poder da espontaneidade. Lançaram três álbuns durante sua trajetória e mudaram, naquele momento, a vida de alguns milhões de pessoas. Eles se apresentaram muito na MTV e ajudaram a sustentar e a reinventar uma decadente indústria patriarcal da música que professavam desprezar, assim como os punk rockers haviam feito duas décadas antes. O show no palco principal do Reading Festival foi memorável. A apresentação beneficente para ajudar vítimas de estupro da Bósnia, no Cow Palace, em São Francisco, foi outro ponto alto. As diversas turnês menores que fizeram em clubes nos Estados Unidos, no Reino Unido e na Europa ajudaram a afiar ainda mais suas tendências destrutivas. Kurt, Krist e Dave. Kurdt, Chris e Chad. Pat e Lori; e Earnie Bailey, o técnico de guitarra sorridente; e Alex MacLeod, o sarcástico agente de turnê escocês; e Craig, Monte, Anton e Nils; e Susie, Charles, Jackie, John, Janet e Danny; e Jon e Bruce, da gravadora independente Sub Pop… Muitos nomes, com certeza, mas não tantos quanto na maioria das grandes corporações que movimentam milhões no mundo inteiro.
Nirvana: que grande banda ao vivo!
“Começamos a liberar muita raiva e a destruir instrumentos, mas não foi logo de cara. Acho que foi lá pelo terceiro show. E não foi de propósito, nem nada. Eu me deixei levar pelo que já estava rolando. Mas foi divertido. Não foi como se alguém dissesse: ‘OK, Krist, você pula bem alto e joga seu baixo para cima e deixa cair na sua cabeça; e Kurt, você se joga no chão e faz uma dança estilo worm’. Na verdade, estávamos cansados daquele rock grandioso. Aquele rock de arena cheio de efeitos especiais e tudo o que resultava daquilo não tinham nada a ver com a gente.”
As histórias precisam começar por algum ponto, mas nem sempre é assim que acontece.
Este é um livro sobre o Nirvana. O Nirvana entendia a regra principal do rock ’n’ roll: que a espontaneidade está no cerne de toda grande música de rock, que você só precisa ser capaz de reagir instantaneamente às circunstâncias e ao contexto, que os programas e gravações de TV idiotas entorpecem nossos sentidos. A arte muda constantemente. Por isso é arte. Não está lá para ser documentada e examinada em galerias e bibliotecas abafadas. Mas todo mundo precisa de uma vocação. Todo mundo precisa de um pouco de história para entender melhor suas próprias circunstâncias. E alguém com certeza merecia ganhar muito mais royalties por ter desenhado todas essas camisetas!
“Acho que ele suspeitava que ela o traía com Evan Dando e Billy Corgan. Ela traía? Acho que sim. Quero dizer, defina traição. Se eles ficaram loucos e deram uns amassos numa noite? Isso conta muito para um marido com dúvidas. Foi um caso de verdade? Não, provavelmente não. O único momento intenso, me adiantando aqui, foi quando ele me ligou da Itália e eu estava em Londres com Courtney. Estávamos atrasados para vê-lo. Três semanas atrasados. Ele estava muito sério e calmo, tipo: ‘Eu sei que você não se mete nos nossos assuntos e que não toma partido, mas posso te perguntar uma coisa como amigo?’. Eu só respondi: ‘Sim’. E ele: ‘Ela está me traindo?’. Foi sério, não era besteira. Lembro-me de pensar: ‘Acho que sim’, mas não falei nada. Eu não tinha certeza. Se eu tivesse dito: ‘Pode ser, talvez?’, não creio que eu o teria salvado de porcaria nenhuma.
“Estávamos adiando a ida para a Europa. Fomos para Los Angeles por alguns dias porque Courtney tinha alguma coisa para resolver. Ela imediatamente reservou dois bangalôs no Chateau [Marmont, hotel superpretensioso em Hollywood] – eu fiquei em um com a Frances, ela ficou no outro. No segundo dia, ela alugou um carro para mim e tudo o mais. Depois de algumas semanas, parei de perguntar constantemente quando iríamos embora. Ela continuava adiando, e eu falava, tipo:
‘Bem, quando quiser ir, me avise’. Não sei exatamente quanto tempo ficamos lá, mas me lembro de ele telefonar perguntando:
‘Vocês vêm ou não?’. E eu dizia: ‘Ei, eu vou.
Quando a Courtney estiver pronta, nós vamos’. Não lembro quanto tempo ficamos lá, o que sei é que vi a conta do hotel quando saímos: 37 mil dólares.”
Eu tenho que ficar me lembrando. Este livro é sobre o Nirvana.

Biografia, Autobiografia, Memórias

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on 12/7/23


Narrando em tom de testemunha ocular, nos deparamos (em demasiados momentos) com o autor se colocando como protagonista da história. Desnecessário as biografias pormenorizadas de bandas e pessoas coadjuvantes nesta trajetória. Martelado á exaustão a busca incessante pelo sucesso e a total falta de preparo para ele, adquirindo repugnância pela exposição. Nosso “narrador protagonista”, que odeia passagens romanceadas, caracteriza aquele que deveria ter sido o personagem principal com... leia mais

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