Em julho de 1979, o Brasil foi surpreendido com uma carta de Carlos Drummond de Andrade endereçada a uma poeta, até então, pouco conhecida, com o seguinte texto: “Não tendo seu endereço, lanço essas palavras ao vento, na esperança que ele as deposite em suas mãos (...) Seu livro é um encanto, seu lirismo tem a força e a delicadeza das coisas naturais.” A poeta em questão, uma senhorinha de quase noventa anos, nasceu Ana Lins dos Guimarães Peixoto e a essa altura era conhecida como Cora Coralina, a doce poeta de Goiás.
Embora escrevesse desde menina, essa senhora só publicou seu primeiro livro pouco antes de completar 76 anos, depois de ter ficado viúva. O que ela fez então nesses anos todos, antes de encantar o público e a crítica com sua prosa e seus poemas? Criou quatro filhos e trabalhou muito enquanto poetou. Morou por 45 anos no interior e na capital de São Paulo, onde vendeu livros, teve uma loja de armarinhos e uma chácara de flores. Ao voltar para Goiás, tornou-se doceira, junto a um fogão a lenha.
Conhecedores da doçura de seus versos, os leitores de Cora Coralina sempre se perguntaram como teriam sido os doces feitos por ela. Para matar essa curiosidade, a Global Editora, com a anuência de Vicência Brêtas Tahan, filha da poeta, está lançando Cora Coralina – Doceira e Poeta. Uma obra planejada não só como um livro de receitas, mas também em comemoração aos 120 anos de nascimento da poeta e em homenagem a esta mulher aguerrida, que sempre esteve à frente de seu tempo.
Enquanto decidiam quais receitas integrariam o livro – escolhidas a dedo em cadernos amarelecidos pelo tempo –, a equipe percebeu que, mesmo tendo vivido mais de quarenta anos no estado de São Paulo, as receitas tinham uma profunda relação com os costumes goianos, em especial com a cidade de Villa Boa de Goyaz (atual Cidade de Goiás), terra natal de Cora Coralina. Com isso, os organizadores viajaram para Goiás com o objetivo de captar momentos reveladores dessa relação e tornar visíveis para os leitores as circunstâncias da vida da poeta.
Para concretizar o projeto a contento, foram necessárias algumas adaptações, ou melhor, atualizações, com redução ou substituição de ingredientes, pois os originais continham receitas com uma grande quantidade de ovos, outras com banha de porco, etc. A apresentação de "Cora Coralina – Doceira e Poeta" traz a assinatura do jornalista J. A. Dias Lopes, um dos nossos decanos do jornalismo gastronômico.
Entremeando as receitas com belíssimas fotografias, ilustrações e poemas, também selecionados criteriosamente, o leitor irá descobrir os segredos da doceira poeta, diversão e gosto bom em quitutes às vezes muito simples, mas sempre saborosos. Muito saborosos.