O Homem Sem Qualidades

O Homem Sem Qualidades Robert Musil




Resenhas - O Homem sem Qualidades


23 encontrados | exibindo 1 a 16
1 | 2


Filipe 21/12/2023

Dentro de um grande oceano de metáforas, vemos aqui um retrato do homem intelectual e da sociedade europeia nos anos 1910 - com um relevante paralelo com o que vimos durante a segunda guerra mundial e vemos nos últimos anos.

A jornada que Musil escreve aqui é extensa e pode ser cansativa. Quando não há uma discussão entre os atores, há grandes monólogos dentro da cabeça de um dos personagens a respeito da questão central do livro: o ser humano e seus valores.

Para mim, o livro ganha uma segunda vida quando entra Ágata, irmã do personagem principal, Ulrich. Ágata nos traz mais do que já vemos, mas com uma dose de maior vulnerabilidade e humanidade, fugindo das grandes poses e máscaras que são repetidas ao longo das 1240 páginas.

No mais, é claramente uma das super-obras da literatura de língua alemã e, como tal, traz mais do que entretenimento, traz reflexão e análises precisas de uma sociedade que parece estar condenada às eternas quedas dentro de um eterno império hegemônico.
comentários(0)comente



Marcos606 16/08/2023

Na superfície, um retrato espirituoso e urbano da vida nos últimos dias do Império Austro-Húngaro, o romance também é uma farsa trágica que dá conta do lento colapso de uma sociedade na anarquia e no caos e uma acusação de uma sociedade que abraçou o fascismo.
comentários(0)comente



spoiler visualizar
comentários(0)comente



Francisco240 08/12/2022

Bem confuso, profundo, experimental e clássico nato
O homem sem qualidades é definitivamente um clássico que estava bem à frente do seu tempo.
Mulsil viu vai através da sua escrita Vai expressar de maneira ágil e Mas antigo dia dia de pessoas comuns e de alta classe na Áustria antes da primeira guerra mundial.
E o curioso é que no decorrer da narrativa vai se misturando com o gênero ensaio, isso fica mais forte nas páginas finais do livro, pois o leitor fica um tanto quanto perdido, por não saber se está lendo um ensaio ou a narrativa explanada.
Uma pressão barométrica mínima pairava sobre o Atlântico; dirigia-se para leste, rumo à pressão máxima instalada sobre a Rússia, e ainda não mostrava tendência de se desviar dela para o norte. As isotermas e isóteras cumpriam suas funções. A temperatura do ar estava numa relação correta com a temperatura média do ano, a do mês mais frio e a do mês mais quente e a oscilação aperiódica mensal. O nascer e o pôr do sol e da lua, a variação do brilho da lua, de Vênus, do anel de Saturno, e outros fenômenos importantes transcorriam segundo as previsões dos anuários de astronomia. O vapor d?água no ar estava na fase de maior distensão, a umidade era baixa. Numa frase que, embora antiquada, descreve bem as condições: era um belo dia de agosto de 1913.
comentários(0)comente



Luiz 14/11/2022

No século XX as qualidades se desprendem dos homens
Livro: O Homem Sem Qualidades
Autor: Robert Musil

No livro acompanhamos um recorte da vida de Ulrich, conhecido e apelidado de "O Homem Sem Qualidades", acompanhamos sua história ao sair de sua cidade em busca de uma "indicação de emprego" feito por seu pai em outra cidade ao meio de uma classe política. Neste ínterim é apresentado o surgimento, do que veio à ser chamado, Ação Paralela, que visa criar uma iniciativa política que possa fazer frente à Alemanha, assim intelectuais, políticos, militares, empresários e etc, se reúnem para debater e discutir as mais diversas idéias, enquanto sua amante, Bonadeia, reaparece para Ulrich. Em concomitante à isto, a região é debate um grande assunto político, Moosbruguer, um homem cujo a presença perturba a sociedade das mais diversas formas, é acusado de assassinato, tido também como louco, a comunidade debate a sua presença na sociedade e seu julgamento. Outro núcleo abordado é o casal Walter e Clarisse, Ulrich por vezes se vê em meio aos dois nas mais diversas discussões, inclusive sobre Moosbruguer. Por fim, um núcleo a parte é de Agatha, irmã de Ulrich, que surge na segunda parte do livro apresentando os mais diversos dilemas.

O livro possui mais de 1200 páginas, é o maior livro que já li até o momento, e logicamente, esse brevíssimo resumo do enredo é o que há de mais superficial pra descrever sobre a obra de Musil, pode-se dizer que a obra vai muito além de sua história, os mais diversos temas são abordados e discutido, como um grande romance filosófico, com características de um diário do autor. Temas diversos são apresentados e refletidos das mais diversas maneiras, pode-se facilmente dizer que qualquer coisa que tenhamos visto e presenciado em nosso tempo é discutido, ao menos, minimamente nesta obra.

Agora, se por um lado é um livro com muito conteúdo, muitas reflexões excelentes como proposta, e uma história por vezes intrigante, por outro lado, possui a mesma proporção em prolixidade, por vezes chega a ser extremamente chato e desinteressante em grande parte dos momentos, minha experiência é de mais 50% em chatice e 50% surpreendente. Ao passo que possui partes extremamente incríveis é geniais, possui, partes de matar de tédio.

Mas a grande pergunta fica: "por que Ulrich é um homem sem qualidades?" Essa pergunta em grande parte do livro dá o tom do livro. Ulrich é alguém que tentou e fracassou nas profissões que se propôs (militar, engenheiro e matemático), incapaz de desenvolver uma "habilidade" que possa fazê-lo bem sucedido financeiramente, respeitado e etc, é se quer capaz de ter a honra de ser chamado pelo sobrenome do pai; um homem sem atributos, alguém indefinido, sem forma, volátil, sem aparência, sem identidade... ainda que seja muito sagaz e inteligente, é muito mais um homem de senso de possibilidades do que um com senso de realidade, pois não leva em consideração necessariamente o que lhe é apresentado como concreto, mas sim almeja o que está para além, essencialmente um homem de idéias abstratas negando tudo que é sólido por natureza, moldável em certo sentido às contingências do momento... um reflexo do nosso tempo regido pela técnica científica, pelo matematização e pelo poderio político-militar, religião e espírito revolucionário de transgressão, o vazio existencial, o niilismo e materialismo, um verdadeiro retrato do século xx.

Mas uma coisa é interessante nisso tudo, os personagens em grande maioria possuem um certo niilismo, crença no materialismo e cientificismo, parecem plásticos, caricatos, mas Ulrich, sem dúvida, é o mais indefinido de todos. Mas existem aqueles que fogem a regra, pois existem aqueles que em alguma medida, em oposição à Ulrich, possuem "qualidades", como Lindiner, Arheim, Walter e seu pai; todos esses personagens provocam efeitos interessantes no personagem principal, elencado reflexões e discussões fortes na obra.

Musil escreveu este livro em grande parte da sua vida, por volta de 40 anos, e possuiu muita dificuldade de publicação de suas partes, muito do que relata na obra possui semelhança com a vida pessoal do autor, seja na visão do pai do personagem principal e seu próprio pai, como também os empregos obtidos por ambos, fora a controversa relação entre irmãos explorada no livro, com seus próprios pais que viviam uma relação triangular. O que revela em muito não só o espírito da época em que o livro é escrito, como traços pessoais transpassados para a obra.

"[...] Não notaram que as vivências agora independem das pessoas? Transferiram-se para os teatros, os livros, os relatórios dos centros de pesquisas e viagens de estudos, estão nas comunidades ideológicas ou religiosas, que desenvolveram certos tipos de vivência à custa de outros, como uma tentativa experimental no campo social. É na medida em que hoje as vivências não se situam no trabalho, ficam no ar; quem ainda pode dizer, hoje em dia, que sua raiva é realmente sua raiva, quando tantas pessoas se metem no assunto e entendem mais do que ela?! Surgiu um mundo de qualidades sem homem, de vivências sem quem as vive, e quase parece que, num caso ideal, o ser humano já não vive mais nada pessoalmente, e o amável peso da responsabilidade pessoal se dilui num sistema de fórmulas de significados possíveis. [...]"
(Robert Musil, p. 166)

"[...] Aprendeu durante séculos que vícios podem se tornar virtudes, e virtudes vícios, e no fundo julga apenas falta de habilidade não se conseguir, no curso de uma vida, transformar um criminoso numa pessoa útil. Não reconhece nada permitido ou ilícito, pois tudo pode ter uma qualidade através da qual um dia participará de alguma nova e grande estrutura. Secretamente odeia, como à
morte, tudo o que finge ser definitivo, os grandes ideais e leis, e sua pequena imitação petrificada, que é o caráter satisfeito. Ele não considera nada sólido; nem o eu, nem ordem alguma; porque nossos conhecimentos podem se modificar a cada dia, ele não crê em nenhuma ligação, e tudo possui o valor que tem apenas até o próximo ato da criação, como um rosto com quem se fala e se vai modificando com nossas palavras."
(Robert Musil, p. 170)
comentários(0)comente



Lua 20/02/2022

Um loop infinito
Tudo é permitido a um homem sem qualidades? O livro basicamente afirma que sim. Apesar de ser inacabado não deixa de ser um grande livro! A obra parece acontecer numa estagnação total, ou melhor, nada acontece. A tal ação paralela nada desenvolve, os personagens não mudam e alguns chegam a dar nos nervos. Ulrich, o personagem principal, considerado o homem sem qualidades, é o mais "parado" que já vi. Mas mesmo uma história em que pouco acontece de verdade, tem um conteúdo bastante filosófico e histórico, pois se passa um pouco antes da primeira grande guerra. Não recomendo para quem espera mudanças ou finais para o enredo ou para algum personagem. O livro inteiro é uma história frustrada, onde nada ou quase nada muda e tudo permanece na mesma. E mesmo assim o livro é bom do jeito que é.
comentários(0)comente



Aline.Rodrigues 17/01/2022

O livro da indefinição
O homem sem qualidades é um ensaio redundante sobre a indefinição. A impressão que se tem, que a história, os personagens, são meras desculpas para Musil expor os seus questionamentos quanto à existência, o sentido do ser humano no mundo e a relação deste com a realidade (homem de ação X homem de pensamento).

O personagem principal Ulrich se tornou um dos meus preferidos. Ele é aquele denominado sem qualidades, indefinido, sarcástico e pertubador. Ulrich questiona a moral da sociedade do início do século 20, expondo o absurdo da falta de sentido da existência, focando na contradição do homem do "sentimento" X homem "real".

Interessante também a crítica trazida através da "Ação paralela", grupo criado com o intuito de "fazer história", mas que se enreda na angustiante busca de uma causa superior.

Apesar do livro não ter sido terminado, consegue atingir o seu intento: termino a leitura muito tocada e reflexiva.

Um livro fantástico.
comentários(0)comente



Lista de Livros 25/12/2021

Lista de Livros: O homem sem qualidades, de Robert Musil
Parte I:

“Uma hora por dia é um doze avos da vida consciente, e basta para manter um corpo treinado como o de uma pantera, capaz de enfrentar qualquer aventura; mas é desperdiçada numa expectativa insensata, pois nunca chegam aventuras dignas de tal preparativo. O mesmo acontece com o amor, para o qual o ser humano é preparado da maneira mais monstruosa.”
*
“Todas as pessoas ocupadas em destruir os êxitos de um período positivo precedente pensam que os estão corrigindo.”
*
Mais do blog Lista de Livros em:
https://listadelivros-doney.blogspot.com/2021/11/o-homem-sem-qualidades-parte-i-de.html

XXXXXXXXX

Parte II:

“Nem eu mesmo sei se estou mentindo.”
*
“Uma águia bateria poucas vezes as asas para ir de um telhado a outro; mas para a alma moderna, que atravessa brincando oceanos e continentes, nada é tão impossível quanto encontrar a ligação com as almas que moram na outra esquina.”
*
“Quem é imparcial tem de poder suportar uma palavra dura de vez em quando.”
*
Mais em:
https://listadelivros-doney.blogspot.com/2021/11/o-homem-sem-qualidades-parte-ii-de.html


XXXXXXXXX

Parte III:

“Quando uma vida é intensa não se pode também exigir que seja boa.”
*
“Arnheim partilhava dos desígnios de sua época. Esta adora o dinheiro, a ordem, o saber, o cálculo, a medida, portanto, no fim das contas, o espírito do dinheiro e seus parentes; ao mesmo tempo se lamenta por isso.”
*
Mais em:
https://listadelivros-doney.blogspot.com/2021/11/o-homem-sem-qualidades-parte-iii-de.html


XXXXXXXXXX

Parte IV:

“Nada é comido tão quente quanto se cozinhou; com o tempo, os mais intensos exageros, entregues a si mesmos, produzem um novo comedimento; não poderíamos nos sentar em nenhum trem, e na rua deveríamos ter sempre na mão uma pistola carregada, se não pudéssemos confiar na lei mediana que torna improváveis as possibilidades exageradas.”
*
“A exigência ideal de amar ao próximo é seguida pelas pessoas reais em duas partes, a primeira dizendo que não suportamos os outros, a segunda querendo que se mantenham relações sexuais com uma metade deles.”
*
“É sabidamente um grande alívio, quando nos aborrecemos, aliviarmos nossa raiva em alguém, ainda que essa pessoa não tenha nenhuma culpa; só que de hábito se esquece isso quando se trata do amor. Porém é a mesma coisa, e o amor muitas vezes tem de ser aliviado em alguém que não tem culpa nenhuma, caso não encontre outra oportunidade de se expandir.”
*
Mais do blog Lista de Livros em:

site: https://listadelivros-doney.blogspot.com/2021/11/o-homem-sem-qualidades-parte-iv-de.html
comentários(0)comente



LP_Chaun 03/06/2021

Prolixo
O livro em si é uma obra prima e um monumento ao exercício filosófico, a história é apenas um pretexto para o desenvolvimento de idéias o que fica claro pela erudição exagerada dos personagens.
Não me entendam mal, adorei a obra, mas sinto que ela não é acessível a todos, o que é uma pena.
Eu recomendo principalmente para aqueles que não se cansam com extrapolações metafísicas.
Musil quase entrou no meu panteão que destino a nomes como Victor Hugo, mas pecou com a falta de objetividade, não sou ninguém para julgar esse monstro literário, porém a sua obra longe de ser acessível é uma bela torre de marfim destinada aos pares.
comentários(0)comente



Marcos.Alexandre 17/05/2021

Um livro denso. Bem filosófico. Alguns debates com idéias bem interessantes. Por ser um livro inacabado tem corte abrupto de alguns pontos de vista e situação de alguns personagens. Mas talvez aí está o pulo do gato. O leitor tira as suas conclusões. Recomendo ir lendo devagar, aos poucos para desfrutar melhor a leitura.
comentários(0)comente



Tiago600 22/04/2021

Espelho do Espelho
Século XXI, assolados por uma esterilidade financeira e por uma peste que lentamente se espalha pela terra como um glaucoma gelado, observamos a morte que tenciona roubar nossos olhos, selar nossas bocas com terra, fazendo com que vários nomes sigam seu débil fluxo como borboletas noturnas batendo continuamente contra um tubo de vidro da lamparina.

Dia a dia (assim que tomamos a corajosa atitude de levantarmos de nossas camas), nos recordamos de como eram nossos sonhos e projeções, do dia anterior, na noite anterior, eles eram tão remotos quanto a infância. E, misturados ao medo, essa dor por uma vida feliz; que quase nunca desfrutamos e provisoriamente perdermos.
Diante desse hostil e infértil terreno de incertezas, através do esgotamento perpétuo de palavras e ideias, o "Homem sem Qualidades" segue sendo assombrosamente ... moderno! Obra híbrida, singular, de difícil rotulação. Enquanto em Proust, são as Madeleines, pedras de Veneza e etc que trazem à tona reminiscências e pontuam momentos, aqui, é o homem e o embate entre carne versus alma que assumem por consequência o objetivo de ditar o tom da história.
Musil, dotado da sutileza de um senciente sábio mago, desembainhou seu sabre e com maestria arte da esgrima, duelou com o esvaziamento das palavras, legando com isso para a posterioridade não um livro, mas sim uma tapeçaria do tempo, e só o fez desse modo, pois sabia que filósofos e escritores são déspotas que não dispõe de nenhum exército, por isso submetem o mundo todo encerrando-o em um sistema. O homem não é um ser que ensina, é um ser que vive, age e atua! É como um ator que perde a consciência dos bastidores e da maquilagem, e pensa estar atuando de verdade, que o ser humano de hoje pode, quando muito, esquecer o incerto pano de fundo de doutrina, do qual dependem todos seus atos!

A obra é monumental, transforma, deixa o corpo febril e inflama os olhos tal qual o coração de uma papoula, alçando o leitor por regiões utópicas que ficam em algum lugar e em lugar nenhum entre uma ternura infinita e uma infinita solidão. Atravessar a estrada dessas páginas (apesar de intenso) é imensamente gratificante, pois em certo ponto, me foi fácil imaginar seres de uma outra época caminhando por essa mesma estrada antes que o mundo escurecesse.
Por fim, entre vários pensamentos, me peguei divagando sobre o que posso fazer, pois, pela minha alma, que reside em mim como um enigma irresolvido? Que deixa ao "homem" visível o maior arbítrio, porque não o consegue dominar de maneira alguma.

Janaina.Vidal 23/04/2021minha estante
Está sendo uma leitura desafiadora para mim... Por vezes me vi na vontade de abandonar.


Tiago600 28/04/2021minha estante
Totalmente compreensível seu sentimento, o livro realmente exige muito do leitor. Ao término da leitura, o sentimento que mais se destaca é de como valeu a pena toda trajetória. Ainda assim, se tiver muito, muito penoso, ou pesado, deixe de lado por um tempo e retome algum dia. Falo por experiência própria. Há dois anos atrás tentei ler e abandonei na página 200. Esse ano coloquei como meta e rolou.




Ebenézer 09/01/2021

SE HÁ DESENCANTO O CULPADO SOU EU
Tenho pouca dificuldade para reconhecer minhas limitações como leitor sobretudo de obras densas, longas e complexas. Mesmo assim, resiliente diante de desafios literários, me recuso abandonar autor e obra no meio do caminho.
O Homem sem Qualidades não é um romance igual a tantos de domínio público cuja leitura flui não importando se o vento sopra a sotavento ou barlavento. O livro de Robert Musil muitas vezes nem venta para o leitor. O Homem sem Qualidades traz um vetor filosófico que percorre a obra tornando-a complexa, hermética e, até, indevassável. Penso, pois, que seria muita pretensão minha querer desvendar numa leitura única a extensa obra construída diligentemente durante anos a fio.
Se pudesse fazer uma comparação em termos de compreensão e profundidade, a leitura de O Homem sem Qualidades está para a literatura como para o turista a visita de grandes monumentos históricos: viu tudo, fotografou muito e, findo o exaustivo passeio, tem a certeza de ter se encantado muito, e todavia, com a igual convicção de ter compreendido muito pouco de tudo que viu e, mesmo assim, confessa ter valido a pena o investimento dispendido.
A obra é eminentente cerebral cujos capítulos trazem pouca conexão entre si que estimulem no leitor a expectativa de uma trama eletrizante, empolgante ou emocionante (a bem da verdade parece ser essa a busca do leitor mediano). Muito ao contrário, o leitor está certo que cada parágrafo é um desafio que se lhe impõe.
O Homem sem Qualidades não é, por tudo isso, uma leitura fácil; a escrita exige muito do leitor de modo contínuo e permanente.
O livro de Musil é para poucos pela extensão, pela complexidade, pelo estilo, pela temática.
Por tais qualificativos não é por acaso que o autor é considerado no nível intelectual de outros gênios da literatura como Proust e Joyce.
O turista foi longe visitou o Louvre, a Sacre Coeur, a Catedral Notre Dame, a Torre Eiffel, entre outros, e guarda de tudo (apenas) fortes e boas lembranças "en passant"...
Guardarei igualmente as boas memórias compreendidas e entendidas dO Homem sem Qualidades: Kakânia, Ulrich, Diotima, Tuzzi, Bonadeia, Walter, Clarice, Ágata, Hagauer, Moosbrugger...seus dilemas, suas histórias, seus conflitos e suas filosofias que me fizeram nelas refletir e que enriqueceram a minha vida.
Ulrich, por seu inusitado "caráter", sintetiza bem a essência da natureza humana ambígua e cinzenta: "...os crimes estão no ar e apenas procuram um caminho de mínima resistência que os leve a determinadas pessoas."
Não serei ingrato deixando de homenagear inúmeros instantes de puro encantamento na obra de cujos trechos, por sua sensibilidade, não me aprazia avançar na leitura.
É assim, para mim, O Homem sem Qualidades: um livro que apreciei com sentimentos contraditórios e intensidades desiguais, gostando e odiando.
Robson Barros 06/08/2023minha estante
Ótima a sua resenha. Identifiquei muito, inclusive com os muitos instantes de puro encantamento ...


Ebenézer 09/08/2023minha estante
Grato por seu comentário. Abs




Wagner47 20/09/2020

Alma e Loucura
Definitivamente é o livro mais difícil que li na minha vida. Adoro conhecer o íntimo dos personagens, mas aqui foi no interior do interior do interior de cada um
Pela obra ser incompleta, muitos personagens ficaram sem um destino encaminhado e algumas relações vão ficar na imaginação do leitor. Porém a edição traz uma nota de tradução a respeito de outros capítulos modificados pelo autor, mas que não foram liberados para impressão (diferente dos 20 últimos do livro). E a julgar pela o obra, faz muito sentido (o que é deveras preocupante)

Ao mesmo tempo que a obra se beneficia por ser longa e portanto destrinchar os personagens, por muitos e muitos momentos me questionei se era realmente necessário, como acontecia de quando mudavam de assunto para só no final do capítulo retomarem os pontos importantes.

Ulo é um dos personagens mais complexos e ao mesmo tempo simples que já tive o prazer de conhecer.
comentários(0)comente



@cinthia.lereplanejar 11/07/2020

Reflexões sobre a vida
O livro trata sobre a história de Ulrich, matemático de 32 anos. Que sob influência da prima Diomita, ingressa na Ação Paralela, onde se reunem vários intelectuais.
Ulrich faz importantes reflexões e que nos faz questionar sobre ela na nossa vida tbm. Confesso! Me peguei várias vezes dando uma de Ulrich kkkk
Além de reflexões filosóficas, o romance trata sobre adultério e incesto.
Uma pena não ter sua continuação. Mas a leitura vale muito a pena.
comentários(0)comente



Júlio 19/02/2019

O Homem sem Qualidades relata o declínio intelectual, moral e filosófico da sociedade austríaca às vésperas da Primeira Guerra Mundial. É uma obra que além dos temas sociais e individuais –como o existencialismo- contém uma infinidade de temas filosóficos mais abrangentes e metafísicos, como a própria formação de uma ideia. Por toda a obra paira ao sentimento de grandeza. Não é à toa que nome mais citado por Musil durante toda obra é o de Goethe, autor em que Musil parece ter uma dívida a saudar.

Logo no início somos introduzidos a Ulrich, o próprio homem sem qualidades, que obtém tal apelido dos amigos por não estar apegado as virtudes e normas sociais que regem a vida de seus pares. Ele é descrito como sendo indiferente à todos ao seu redor, vivendo a vida em um limbo analítico. É nas interações de Ulrich com os demais personagens que encontramos a medula da obra.

Os eventos ao redor dos personagens –cerca de 3 dúzias- parecem ser apenas o veículo, o destino se encontra nos diálogos que os personagens tem sobre tais eventos e sobre si mesmos. Para mim a genialidade da obra está no desenvolvimento psicológico e filosófico de cada personagem, feita de maneira singular e criando indivíduos que são intelectualmente complexos. São nas interações, nesses diálogos socráticos que Musil mostra sua habilidade como criador.

Um dos grandes veículos na trama é a Ação Paralela, uma organização feita para mostrar a superioridade moral e intelectual do povo Austríaco sobre o resto da Europa. Nesse meio transitam diplomatas, escritores, militares, condes e todo tipo de personagem da aristocracia austríaca, com o objetivo de se unirem para criar um grande evento –ou uma grande ideia- que irá honrar os 70 anos de reinado do imperador Franz Joseph. Mas obviamente a motivação é sobrepujar as demais nações, principalmente a Alemanha. A ironia fica pelo conhecimento que temos dos eventos que irão se seguir (mas que na obra nunca chegam a acontecer) na Europa. Um dos personagens, o diplomata Tuzzi, chega a confessar em particular a Ulrich sobre a situação da Áustria perante as demais nações, dizendo que o país era intimidado pela Alemanha, limitado pela Itália e subordinado à França. Um dos poucos momentos de lucidez e sinceridade em meio dos diálogos e ideias supérfluos.

O segundo grande veículo –que na realidade é o primeiro a ser apresentado, mas recebe menos atenção que a Ação Paralela- é a introdução do personagem Moosbrugger, assassino e estuprador que causa fascínio e curiosidade aos amigos de Ulrich. Através de diversos pontos de vistas sobre o assassino e seus feitos os personagens aprofundam seus pontos de vista sobre moral e justiça. Mas não só nas reflexões e diálogos é que se encontra a beleza da obra, as descrições de eventos são sempre coloridas e cheias de vida, dando fôlego para a narrativa. Inclusive um dos episódios mais marcantes do livro para mim foi a visita da trupe ao manicômio, realizada de forma sóbria e viva, mostrando os diversos níveis de reação dos personagens perante a degradação humana na sua forma mais extrema.

Na literatura poucos mestres foram capazes de criar personagens com tamanha vivacidade, Flaubert, Proust, Tosltoy e Shakespeare, por exemplo, conseguiram tal feito, e Musil merece constar entre eles. Porém ao invés de descrever a psique através de gestos singelos, nuances de personalidade, Musil cria uma linha de pensamento própria para cada um de seus personagens, indo ao ponto de mostrar a metodologia rigorosa de Ulrich em seus ensaios filosóficos. Seria possível gastar páginas descrevendo um só personagem do livro devido à riqueza que encontramos em cada indivíduo. Um desses grandes exemplos, além do próprio Ulrich, é Ágata.

Ágata é irmã do personagem principal, só introduzida na trama após a segunda metade do livro. A relação quase incestuosa entre os irmãos se mostra como o terceiro grande veículo do livro e ofusca todos os pontos antigos que pareciam ser importantes. O assassino e a Ação Paralela somem de cena e Ágata aparece, ofuscante, como novo centro. É talvez uma das criações mais complexas do autor, e ele dedica à ela um dos capítulos mais belos da obra, onde ao descrever a sensação de tédio em uma tarde solitária ao observar sua imagem no espelho temos uma evolução narrativa que acaba em uma descrição profunda, e belíssima, da psique de Ágata. É incrível como o autor consegue criar uma personagem que compartilha do mesmo alheamento de Ulrich, porém de natureza totalmente diversa. Aliás, é necessário comentar que as quatro personagens femininas principais -Clarissa, Diótima, Ágata e Bonadeia- são todas incríveis, mais ricas e complexas que boa parte do elenco masculino. Dá para sentir que Musil dedicou muito mais tempo para pintar suas personagens femininas do que os masculinos.

É triste que a obra não tenha uma conclusão. Para muitos será uma tarefa ingrata encarar as 1200 páginas do texto e saber que ao fim nenhuma ideia, nenhum personagem, vai chegar a algum semblante de conclusão. Mas O Homem sem Qualidades é o maior exemplo possível de que a jornada tem mais importância que o destino. Vemos que o autor aparentava estar longe de concluir a obra pois perto do final somos introduzidos à outra de suas criações maravilhosas, o professor Lindner que prometia acrescentar ainda mais complexidade na relação entre Ulrich e Ágata. Além disso somos introduzidos aos manuscritos de Ulrich, que tentam desvendar e achar uma razão, ou ao menos uma descrição plausível, através de solilóquios complicados, para o amor, para o sentimento e sobre a própria natureza da realidade. É uma escrita complexa, como todas as partes filosóficas da obra, que requer atenção redobrada por parte do leitor.

Existe muito que merece ser mencionado, mas não é possível fazer jus ao massivo elenco em uma simples resenha. Arnheim, Walter, Stum, Gerda, Hans, Solimão, Rachel, todos e muitos mais mereciam ao menos alguns parágrafos de atenção. Além disso temas como infidelidade, racismo, antissemitismo, religião, pátria e cultura podem ser amplamente explorados. Porém Musil criou uma obra monumental que não pode ser abreviada em poucas linhas. Aliás, monumental é o melhor adjetivo para descrever o livro e sua inalcançável ambição.
comentários(0)comente



23 encontrados | exibindo 1 a 16
1 | 2


Utilizamos cookies e tecnologia para aprimorar sua experiência de navegação de acordo com a Política de Privacidade. ACEITAR