Júlia 26/08/2016
" - Ora, meu amigo... Eu sou o falecido Mattia Pascal."
Numa visita a um sebo em Curitiba, encontrei Mattia Pascal. Entre tantos títulos que poderia escolher, senti que poderia ser uma boa companhia. Confesso que tinha outras leituras em mente quando voltei para São Paulo, mas o título me pareceu tão atrativo que não consegui resistir.
Mattia, ao dar início à sua história, pareceu-me tanto Brás Cubas (aquele das memórias póstumas!) que não pude deixar de simpatizar com o sujeito. Logo no primeiro capítulo, diz que irá nos contar como foi que morreu não uma, mas duas e como continua vivo.
Nascido numa família cheia de posses e (que, como ele nos conta, foram roubadas pelo seu administrador após a morte do pai) e vivido uma adolescência resumida em vadiagem, Mattia se tornou um infeliz quando adulto. Sem condições de sustentar a sua família, atormentado por um casamento fracassado e por uma sogra megera, ele encontra sustento trabalhando na biblioteca abandonada da sua pequena cidade. Porém, como desgraça pouca é bobagem, Mattia então perde as duas pessoas mais importantes de sua vida no mesmo dia: sua mãe e sua pequena filha.
Desconsolado, ele pega as poucas liras que seu irmão lhe enviara para o enterro da mãe e pega um trem. Decide ir para Monte Carlo onde, num cassino, a sorte pela primeira vez lhe estende a mão. Enriquecendo após as suas apostas, ele resolve voltar para Miragno e resolver sua vida, mas no meio do caminho ele descobre por uma matéria num jornal que seu corpo foi encontrado no moinho de uma de suas antigas propriedades e reconhecido pela sua mulher. A princípio ele fica indignado, mas logo percebe que essa é a sua chance de se livrar de toda aquela vida que ele não desejava mais. Da mulher que o desprezava, da sogra que tanto o atormentava, das dívidas e do emprego medíocre de bibliotecário.
Sua narrativa, apesar de trágica, muitas vezes nos soa cômica e nos confidencia todas as suas reflexões sobre a sua nova vida ̶ sobre o sentimento de solidão e exclusão. Por sua condição de morto, ele acaba vivendo como um observador da vida e, ao resolver alugar um quarto de uma família em Roma, Mattia se encontra encurralado pela vida passada, pois ela não lhe permite viver a vida que escolheu: a vida como Adriano Meis.
O tema central, "a tirania da máscara", também presente nas outras obras do autor siciliano Luigi Pirandello, trata das convenções sociais que obrigam o homem a ter apenas uma identidade, enquanto há uma "multidão de vidas" que poderiam ser vividas. Uma vida repleta de limites.
Mesmo que a leitura tenha sido cansativa para mim em alguns momentos, ela flui muito bem grande parte do tempo. A minha primeira experiência com Pirandello, sem dúvida alguma, não poderia ter sido melhor.