Gustavo Lima 26/06/2014
O melhor livro que já li na vida!
COMO LER LIVROS
Tomei conhecimento desse livro através de um dos blogs que existem na internet. Lembro que, nesse blog, seu dono fez uma resenha desse livro e, em suas palavras, considerava “How to read a book”(Como ler um livro) um marco em sua vida. Interessado, rapidamente procurei na internet pra ver se tinha alguma edição dele em português. Para minha grande satisfação, sim.
Meu interesse nesse livro partiu de um questionamento que fiz a mim mesmo sobre a qualidade do meu conhecimento. Desde 2005 pra cá, tenho tido o propósito de cultivar o hábito de ler vários livros por ano visando o aperfeiçoamento de minhas qualidades intelectuais. Por causa disso, cheguei a ler mais de 100 livros só nos últimos 10 anos. Geralmente, quem se aventura numa empreitada como essa, assim como eu, acaba lendo tanto livros bons como muita porcaria também devido à inexperiência de leitor de primeiras viagens para selecionar bons livros.
Pois é, apesar de ter lido bastante na vida até então, em meados de 2011, comecei a me perguntar o que realmente eu sabia. Eu percebi que não me sentia capaz o suficiente para discutir com outras pessoas aquilo que eu tinha lido. Em algumas conversas, meus comentários sobre os livros que eu tinha lido eram muito superficiais. Eu sentia que, para o tanto que eu já tinha lido, sabia muito pouco. Percebi que alguma coisa estava errada com minhas leituras. Foi a partir daí que comecei a buscar algum meio que me ajudasse a melhorar a qualidade daquilo que eu lia. Procurando na internet, encontrei esse livro fantástico.
“COMO LER LIVROS” foi escrito por Mortimer Jerome Adler (1902-2001), um professor de filosofia norte-americano que, em sua época, se notabilizou por, entre outras coisas, sua habilidade admirável de discutir temas filosóficos baseados em grandes clássicos da literatura ocidental, numa linguagem simples e acessível para o homem comum (esta é, aliás, uma das ótimas características desse livro: linguagem claríssima!). A experiência de Adler com a leitura dos clássicos o levou a escrever seu best-seller “How to read a books” (Como Ler Livros, Editora É Realizações).
A LEITURA ATIVA E OS NÍVEIS DE LEITURA
Nesse livro, é mostrado em primeiro lugar que um leitor possui basicamente três objetivos quando vai ler um livro. O primeiro deles é o entretenimento, o segundo é a informação e o terceiro é a elevação, o crescimento espiritual e intelectual. No primeiro objetivo, a leitura exige pouco do leitor, trata-se apenas de uma leitura relaxante. Já a leitura para a informação é mais exigente que a primeira, pois se trata de ler para aprender fatos importantes. Já o terceiro objetivo é mais exigente ainda, pois é o tipo de leitura onde se está em contato com grandes idéias.
O real propósito de “COMO LER LIVROS” é ensinar aos leitores fazer esse terceiro tipo de leitura para que possam ter condições de crescer intelectualmente enquanto lêem. Esse crescimento significa sair de um nível inferior de entendimento para um nível superior de entendimento. Para isso, devemos praticar o que ele chama de “leitura ativa”. Cada leitor pode ler um livro mais ou menos ativamente. No entanto, quanto mais ativa a leitura for, melhor será o entendimento do leitor.
As chaves da leitura ativa são fazer perguntas ao livro enquanto o lê e tentar respondê-las da melhor forma possível. Para isso, devemos fazer registros a lápis no livro, registros das perguntas, respostas, observações, palavras-chave, argumentos e problemas do livro. Aliás, este foi um dos preconceitos que abandonei: riscar o livro. Sempre tive pena de riscar meus livros. Achava que fazer isso era praticar uma espécie de violação. Hoje, graças a Adler, não tenho mais pena de riscar livros, desde que sejam meus, é claro.
Agora, quais são as perguntas que se deve fazer ao livro? Isso depende fundamentalmente de duas coisas: dos Níveis de Leitura e dos Tipos de Livros que se está lendo. Cada tipo e cada nível vão determinar o tipo de pergunta que se fará.
Com relação aos Níveis de Leitura, existem quatro níveis: Leitura Elementar, Leitura Inspecional, Leitura Analítica e Leitura Sintópica. Ele fala em “níveis” porque um determinado nível engloba um anterior e é pré-requisito para o posterior. Entendido dessa forma, a Leitura Elementar é aquela em que o indivíduo passou a ser alfabetizado. A Leitura Inspecional é aquela em que extraímos o máximo de informações de um livro num curto prazo de tempo. A Leitura Analítica é a leitura propriamente dia, a leitura por excelência. É por meio dela que o leitor vai crescer intelectualmente, segundo a proposta de Adler. Esse nível de leitura é mais exigente que os dois anteriores. Já a leitura Sintópica é a “leitura comparada”, nela o leitor vai fazer uma análise de um mesmo assunto usando livros distintos. Essa é a mais exigente de todas as leituras, porém, a mais recompensadora.
A LEITURA ANALÍTICA
Para todos os níveis de leitura, Adler dá dicas precisas e detalhadas de como proceder em cada um deles. Entretanto, no nível de leitura analítica ele dedica uma atenção especial. Esse nível é o mais extensamente discutido no decorrer do livro. Nele existem regras para descobrir, interpretar e criticar o conteúdo do livro. Resumidamente, podemos organizar as regras da leitura analítica da seguinte maneira:
- Descobrir que tipo de livro se está lendo.
- Descobrir quais os problemas que o autor levantou.
- Assinalar quais são as palavras-chave do autor e como ele as define.
- Aprender as proposições do autor mediante as frases-chave.
- Encontrar ou construir os argumentos do autor.
- Verificar quais problemas ele resolveu, quais ele não resolveu e quais ele pode ter criado.
- Expor para si mesmo as partes do livro, como elas estão divididas, do que trata cada uma delas e como elas estão integradas ao todo do livro.
- Saber explicar em poucas palavras do que trata o livro.
Para se criticar um livro, deve-se antes ter garantias de que você realmente o entendeu. Não adianta criticar um livro que não entendemos o conteúdo. Mas como podemos saber se realmente entendemos o livro? Basicamente, aplicando as regras acima. Segundo Adler, se executarmos corretamente essas regras, poderemos saber, com razoável certeza, que entendemos o livro. No livro, Adler ensina como executar essas regras de modo correto.
A parte mais interessante da leitura analítica, a meu ver, é como se faz a crítica. Muitos leitores acham (inclusive, eu achava) que a leitura de um livro termina depois que o entendemos. Adler afirma que isso é apenas parte do trabalho. Para ele, o leitor tem obrigação de dar a sua palavra a respeito do livro lido. Para isso, antes de explicar as regras para a crítica de um livro, ele dá e explica algumas sugestões de “etiqueta intelectual”. Essas sugestões são:
1) Não criticar o livro antes de entendê-lo realmente.
2) Não ler o livro com o objetivo predisposto de discordar do autor.
3) Reconhecer a diferença entre conhecimento e opinião, oferecendo razões, caso discorde do autor.
Depois de explicar cada um desses preceitos, ele expõe e explica as regras para uma boa crítica:
1) Mostre onde o autor está desinformado.
2) Mostre onde o autor está mal informado.
3) Mostre onde o autor foi ilógico.
4) Mostre onde a análise do autor está incompleta.
Se não pudermos mostrar, com boas razões, onde o autor está desinformado, mal informado, onde ele foi ilógico, ou onde a análise está incompleta, então teremos necessariamente que concordar com o autor. É claro que pode haver o caso onde nós não gostemos das conclusões do autor. Nesse caso, se discordarmos dele sem razões, nossa discordância será meramente emocional e não racional.
Tendo isso em mente, Adler observa bem no início do livro que o ideal é que os alunos do ensino médio já saiam da escola dominando as regras da leitura analítica para poder praticar a leitura sintópica na faculdade, mas o que é ocorre é que os alunos vão para a universidade dominando apenas o nível elementar de leitura e os alunos universitários só vão dominar a leitura sintópica numa fase bem avançada da pós-graduação, geralmente no doutorado.
TIPOS DE LIVROS
Agora quais são os tipos de livros que se deve ler para o crescimento intelectual? Primeiramente devemos saber classificá-los. Adler facilita essa tarefa mostrando que existem Livros Imaginativos e Livros Expositivos. Os livros imaginativos são aqueles comumente chamados de ficção. Já os livros expositivos são os de não-ficção, cujo propósito é ensinar alguma coisa. Isso não quer dizer que não se possa aprender com livros imaginativos, nem que não se use a imaginação ao ler um livro expositivo. Adler deixa isso bem claro. O que está em jogo aqui é apenas a questão da classificação dos livros.
Quais são os livros imaginativos? São os romances, poemas, poesias, épicos etc. Os livros expositivos por sua vez dividem-se em livros práticos e livros teóricos. Exemplos de livros práticos: livros de oratória, manuais técnicos, livros que contem preceitos éticos, em suma, todo tipo de livro que ensina como fazer algo. O próprio livro de Adler é um exemplo de livro prático, pois ele ensina como fazer algo, no caso, como ler um livro.
Já os livros teóricos têm por objetivo transmitir um saber. Esses livros estão classicamente divididos no que conhecemos como História, Ciência e Filosofia, mas existem outros também. Como Adler era professor de filosofia, ele elaborou as regras da leitura analítica para se ler livros de Filosofia. No entanto, ele faz algumas adaptações necessárias e também explica regras mais específicas para se ler obras de consulta, livros práticos, livros imaginativos, livros de história, de ciência, de matemática, ciências sociais etc. Saber o tipo de livro que está lendo vai determinar o modo como deveremos lê-lo.
Ao final do livro, Adler relaciona uma lista com mais de cem autores e suas obras essenciais; autores que são universalmente reconhecidos como grandes expoentes da filosofia, ciência, história, literatura etc. São autores como Platão, Aristóteles, Locke, Rousseau, Kant, Sartre, Euclides, Newton, Darwin, Freud, Einstein, Homero, Virgilio, Dante, Shakespeare, Dostoievski, Tucídides, Tácito, Gibbon e outros. Adler recomenda esses autores devido à enorme influência de suas obras em nossa cultura. Logo, trata-se de obras cujo conhecimento vai ampliar nosso entendimento do mundo, pois estão acima da nossa compreensão e que, portanto, suas leituras vão nos ajudar a melhorar nossa percepção da realidade; são obras que não podem faltar na biblioteca de nossos lares, obras que devem ser lidas por todo aquele que pretende ter uma formação humanística de primeira linha.
Aqui, ao sugerir essa lista, o objetivo de Adler é mostrar que não basta apenas saber as regras da leitura analítica, é necessário também ter conhecimento de onde deveremos aplicar nossa leitura, pois nem todo livro vai merecer uma leitura analítica. Apenas os bons livros merecem esse tipo de leitura. Portanto, não basta apenas saber como ler, é preciso saber o que se deve ler também. É claro que a lista oferecida por ele não é exaustiva, ela é apenas sugestiva; existem muitos bons livros que não estão nessa lista e, no fim das contas, vai caber ao leitor decidir o que vai ler. Mas, pessoalmente falando, não deixa de ser uma boa idéia seguir as sugestões de Adler tendo em vista sua vasta experiência na leitura desses livros.
CONCLUSÃO
Posso dizer com toda a convicção que esse é o melhor livro que já li na vida. É através dele que resolvi, teoricamente, meu problema de como ler eficientemente e que, o mais importante não é a quantidade que se lê, mas a qualidade aplicada na leitura e que tipo de coisa vale a pena ser lida; além disso, me senti mais confiante para ler qualquer tipo de texto. Esse é o tipo de livro que a gente lamenta por não ter conhecido antes, mas me contento com o fato de que ainda não é tarde, para mim, aprender a ler corretamente. Recomendo-o de modo veemente a todos os estudantes de filosofia ou todos aqueles que simplesmente querem saber como educar-se por meio de livros.
Quando eu gosto de um livro, sempre me vem um desejo de poder dar um exemplar dele para cada conhecido meu. Se eu tivesse condições, faria isso, mas como não tenho, recomendo a todos sua aquisição. E nem adianta vir até mim porque eu não vou emprestar o meu exemplar. rs... Só espero que com esta resenha eu tenha conseguido chamar a atenção de todos sobre a importância dessa obra para se adquirir uma educação de verdade, no seu sentido mais elevado.
Para concluir, quero ressaltar que além de saber como ler corretamente e o que se deve ler, é necessário estar sempre praticando a leitura nos termos da proposta desse livro. Para crescer-mos intelectualmente, devemos aplicar as regras da leitura analítica sempre que formos ler; e fazer isso não é uma coisa fácil. O domínio dessas regras requer tempo, paciência e se adquire apenas com a prática constante. Portanto, conhecer essas regras é apenas o começo da vida intelectual.