larissa1963 13/06/2020Notre-Dame: breve história do significado das catedrais
Desolado ao assistir pela televisão as imagens da Catedral de Notre-Dame de Paris consumida pelas chamas em 15 de abril de 2019, Ken Follett, autor da também monumental obra Os Pilares da Terra e conhecedor da arquitetura das catedrais góticas, aceitou o convite de sua editora francesa para escrever um texto sobre seu amor pela obra, a fim de que os direitos autorais provenientes de sua venda fossem revertidos para as obras de restauração de Notre-Dame.
Sua narrativa envolve os primórdios da história da bela catedral, 5ª. igreja erguida no local, assim como algumas passagens importantes da história da humanidade em que ela imponentemente esteve presente como um dos monumentos mundiais mais significativos, trazendo dados sobre os períodos de sua construção e a sociedade da Idade Média.
Ele questiona:
“Como foi possível? Como uma beleza tão majestosa emergiu em meio à brutalidade e a imundície da Idade Média?”.
É o ponto de partida para breves reflexões sobre as dificuldades da construção das catedrais, os fatores nela envolvidos, os interesses de cada grupo de poder da sociedade medieval a que serviam, as reformas realizadas e alguns poucos aspectos de sua detalhada decoração, envolvendo gárgulas e quimeras que se lançam sobre o exterior e inspiram o imaginário.
Apresentou a catedral por alguns relatos literários que inspiraram vários artistas, dentre eles, Victor Hugo, autor de “O Corcunda de Notre-Dame”, que analisa um pouco mais detidamente em um capítulo, além de citar William Golding, T.S. Eliot, Anthony Trollope, Raymond Carver e Nelson de Mille, escritores que, como ele, ficaram extasiados com algum aspecto do esplendor das catedrais e se debruçaram sobre elas.
Apesar de se tratar de um escritor habilidoso, ao percorrer os caminhos da não-ficção deixou sem resposta adequada à pergunta acima, limitando-se a retratar a catedral como algo que o encanta e traz paz e beleza, sem abordar vários aspectos históricos, sequer as causas e fatos relacionados ao incêndio que a consumiu em abril de 2019 e nem detalhar os aspectos de sua arquitetura gótica que a todos encantam.
Por entre lágrimas de pesar e labaredas, o autor traz um brevíssimo e superficial relato da história da catedral de Notre-Dame de Paris, permeado de suas impressões e de aspectos de sua pesquisa para escrever “Os Pilares da Terra”.
Confesso que, como leitora apaixonada por suas obras e conhecedora de seu talento e do intrincado mundo que criou para descrever a fictícia catedral de “Os Pilares da Terra”, esperava muito mais dessa leitura, que ficou muito aquém de lhe fazer a homenagem que merecia e de nos trazer sua história, tanto que foi preciso incluir um trecho do próximo livro do autor nessa edição para aguçar os leitores porque talvez a obra não se sustentasse sem outros atrativos.
Muito dessa decepção, todavia, pode ser creditada à tradução do sub-título da obra para o Português. No Brasil, o livro foi publicado de forma enganosa como “Notre-Dame: a história de uma catedral”. Na edição em Inglês o subtítulo alerta o leitor que esta é “a short history of the meaning of cathedrals”, ou seja, verifica-se que a história da catedral em toda a sua extensão e profundidade não foi algo que o autor pretendeu abordar com esse breve texto.
Na tradução da obra portuguesa, também o sub-título diverge daquilo que o autor se propôs a nos trazer: “uma das maiores obras da civilização europeia”.
Enfim, a leitura valeu pela curiosidade de ler algo de Ken Follett e por ter ajudado, com o valor da compra do livro, para a realização das obras de restauração da fabulosa catedral, todavia, terminei-a e fiquei com a mesma impressão dele ao citar a emoção que se vivencia ao observar os uma obra de Picasso:
“Compreender os agrupamentos de estátuas sobre um portal é como decifrar uma imagem de Picasso. Dizemos: “Ah, claro, deve ser Santo Estevão”, assim como, depois de estudar um Picasso por um tempo, podemos dizer: “Claro, ali está o cotovelo dela, despontando da cabeça”. Mas ficamos com ainda mais perguntas”
Notre-Dame de Paris em recortes e fragmentos, que não deixam de ser interessantes, apesar de superficiais.