Djeison.Hoerlle 19/08/2023
Foi mais ou menos em 2019 que assisti Noivo Neurótico e Noiva Nervosa. Na época eu estava admitindo para mim mesmo que, muito mais do que um conquistador culto, eu era um artista, razão pela qual decidi conhecer o trabalho de outro sujeito que - segundo o senso comum - parecia estar posicionado em algum ponto de interseção destes dois arquétipos. Logo após aquela sessão eu concluí que Woody Allen é sem sombra de dúvidas um grande autor.
E não, isso não endossa nenhuma atitude dele, assim como suas atitudes não desvirtuam os méritos de seus longas.
O apreço por seu estilo foi o que me trouxe até esta biografia- muito mais do que a busca por sua versão quanto às acusações de Mia e Dylan Farrow. Porque, para falar a verdade, a cada dia que passa, percebendo a forma como esta epidemia dicotômica se alastra pelo mundo, em que todo mundo é obrigado a se posicionar ou tomar parte em algo, poucas coisas podem ser tão prazerosas quanto o simples ato de admitir não ter nada para dizer sobre um tema. Não ter opinião, ponto de vista. Se aceitar como alheio a algo que também é alheio a nós. Exige um certo cinismo, de fato, mas é revigorante.
Sobre o livro em si, a experiência foi bem razoável. Penso que por ser já um senhor jogando suas últimas fichas, como o próprio Allen pontua nas páginas finais do livro, ele tenha se desprendido de qualquer eventual meticulosidade ou pretensão ao compor estas memórias. Na prática, isto resultou em um livro que soa um pouco cru, e que não parece muito preocupado em entregar algo que o leitor possa querer ler, mas apenas o que Woody gostaria de escrever.
É por isso que as relatos de suas viagens, seus apartamentos e jantares, além de descrições um pouco desconfortáveis sobre mulheres com as quais trabalhou, recheiam o livro muito mais do que pormenores técnicos de seus filmes. Esse último ponto foi um pouco frustrante para o jovem aspirante a narrador que sou, pois esperava descobrir certos macetes, certas lições que me ajudassem em minha própria jornada. Na prática, tudo que recebi foram comentários de um sujeito misantrópico que, mesmo tendo chegado no auge do reconhecimento que lhe era cabível, ainda assim esperava ansioso a hora de ir embora do estúdio para jantar e assistir um jogo. Frustrante, mas quintessencial, se tratando da persona de Allen.
No fim das contas, é um livro escrito por um sujeito que de certa forma, já perdeu tudo. E por tê-lo feito, não tem mais muito a que se prender na hora de ponderar sobre seu próprio texto.
Uma experiência razoável de leitura.