paloma 03/01/2023
Somos ensinados a querer o amor, mas não a nutri-lo e mantê-lo
"Tudo sobre o amor" foi meu primeiro contato com livros da bell hooks, anteriormente já havia lido artigos, capítulos sob a autoria desta, mas nunca um livro. Na minha visão, um dos pontos altos da escrita de hooks é a maneira como ela consegue sintetizar ideias complexas em uma linguagem acessível. Nessa obra em específico, a professora repensa a noção de amor no mundo moderno e revisita conceitos criados há décadas e que ainda hoje perduram.
hooks trabalha o amor sob a perspectiva da escolha, para a autora, o amor não é um sentimento e sim uma decisão. Essa ótica, responsabiliza o indivíduo pelo amor e as relações provenientes deste, diferente da ideia amplamente difundida de que o amor é algo paralisante ou impulsivo, que faz com que o sujeito não tenha controle sobre suas ações. Nesse sentido, a professora defende que essa ideia clichê de amor como algo arrebatador e incontrolável é muito pertinente ao capitalismo e encontra sua concretização na estrutura de uma família tradicional.
Outro ponto abordado por bell é a máxima de que o amor e o abuso não coexistem. Carinho e afeto coexistem com o abuso, já o amor nunca. Dessa forma, para a autora, poucos indivíduos já tiveram de fato uma experiência de amar verdadeiramente outrem, pois o amor está intrinsecamente ligado à ideia de crescimento e para isso é necessário que ambos os participantes estejam empenhados numa evolução mútua. Nesse sentido, a professora vai contra a maré das produções midiáticas que pregam a ideia de que "ao encontrar sua alma gêmea todos os problemas serão pequenos, as coisas magicamente fluirão sem grande esforço e problemas".
Ademais, é importante destacar que ao ler o título do livro muitos são levados a acreditar tratar-se de uma obra de autoajuda ou até mesmo que somente o amor romântico é abordado no decorrer da análise. Ao contrário disso, hooks trata da ideia de amor em diferente âmbitos e relações, seja com a família, dentro da religião, com os amigos, ou seja, dentro da vida em sociedade no geral, mostrando como inevitavelmente o exercício do amor em uma área específica pode ser moldado a partir da experiência em outra área totalmente diferente.
A obra está organizada em 13 temas, são eles: clareza, justiça, honestidade, compromisso, espiritualidade, valores, ganância, comunidade, reciprocidade, romance, perda, cura e destino. Os capítulos são desenvolvidos a partir desses termos e nos levam, em sua maioria, até a ideia de que o capitalismo impede que os indivíduos construam e vivam verdadeiros laços de amor. É a partir dessa ideia que bell enfatiza a premissa de que homens e mulheres não pensam e cultivam sentimentos de maneira diferente naturalmente, e sim, a partir de estruturas e culturas socialmente construídas para estabelecer papéis distintos e reforçar estereótipos do patriarcado.
Por fim, é importante pontuar que a visão da autora, ao que parece, está fundamentada em valores cristãos em torno do amor e do princípio de caridade, isso, ao meu ver, não tira o mérito das análises realizadas, mas precisa ser esclarecido, pois em determinados momentos, hooks vai defender que o amor é responsável por tornar alguns "fardos" mais leves, ideia abordada principalmente no que diz respeito ao trabalho.
Ainda assim esse, com certeza, é um daqueles livros escritos para se debruçar sobre. Ler e reler novamente até admitir que sabemos pouco, muito pouco, sobre o amor e sobre como amar. Recomendo muito a leitura!