Luiz Otávio 04/08/2017A "Cidade Assobrada" de H.P. LovecraftEm minha recente empreitada pelo universo de Lovecraft me deparei com obras bastante diferentes de seu horror gótico. Dentre novelas e contos, existem complexas aventuras oníricas, horrores psicológicos ou pura ficção científica. Mas todos seguem um padrão: partem de um conceito simples e acabam por derrocar em uma trama grandiosa de horror e loucura. Vejam bem, isso não é um problema. Pessoas comuns sendo levadas ao reino da insanidade, o maior bastião do autor, de fato é algo interessante e muitas vezes assustador. Mas as vezes tudo que queremos é uma simples história sombria e horrenda (algo que ele faz mais nos contos, ótimos em sua maioria). Alguns eu vibrei a cada página, alguns, confesso, me deixou desgostoso e questionando o porquê do autor ser tão aclamado por aí. Então abri “A Sombra de Innsmouth”, e era tudo que eu procurava nas histórias Lovecraftianas.
Nos dias de hoje é muito comum a trama do inocente personagem que acaba por se deparar com uma cidade estranha, com seus habitantes misteriosos, cheios de superstição e tudo envolto a um grande e (muitas vezes) sobrenatural mistério, que acaba por envolver esse protagonista inocente em algo maior, um perigo terrível e se vendo no limiar da vida. Sejam filmes, livros, games… Até mesmo eu já me arrisquei a escrever uma trama nesse conceito (e pretendo revisitar logo :P). Mas quando Lovecraft deu vida a esta obra, certamente não era uma ideia tão difundida. Mas ainda assim, mesmo comparado a N coisas contemporâneas por aí, a história não se torna genérica, mantém-se o suspense e consegue surpreender o leitor.
A boa utilização de um plot-twist é um destes méritos. Ao ler a sinopse (ou mesmo esta breve análise) talvez seja fácil prever que virada seria essa. Bem, não é. O autor planta pequenas sementes ao longo de toda a trama e, onde muitas dessas histórias tendem a terminar, Lovecraft vai além, continua sua narrativa. Só então aquelas sementes brotam, mas aí o leitor já está completamente preso nas vinhas da trama do autor.
A trama simples, com poucos e pontuais personagens constantes, mas a sensação de perigo constante, é outro belo ponto a favor. Uma história concisa e sem muita enrolação somada a uma boa ambientação (que prefere locações mais palpáveis e familiares a maioria dos leitores) também são elementos importantes para essa receita tão bem sucedida.
Infelizmente nem tudo é perfeito. E o mesmo ponto caracterizado como “a cereja do bolo” também é a maçã podre: O tal plot-twist.
Estudando cinema eu aprendi muito sobre narrativa (seja literária ou cinematográfica). E, claro, muito é questão pessoal e não existe uma máxima que diz o que é considerado uma narrativa perfeita, principalmente quanto a utilização dos pontos de virada da trama. Mas tenho pra mim que o excesso de explicações tiram muito do brilho deste recurso narrativo. E infelizmente o autor abusa de explicações.
O terço final da novela é repleto de citações de sequências já ocorridas, apenas para ligar a trama de forma mais linear. Claro, para alguns leitores mais desatentos (ou simplesmente menos chatos) isso é bem vindo, mas torna-se meio “pobre” quando você precisa revisitar todas as sementes plantadas e jogar na cara do seu leitor só para que ele entenda. Em poucas palavras, é como se o autor fizesse um breve guia de trechos importantes pra entender a virada da trama.
De qualquer forma, A Sombra de Innsmouth continua sendo uma leitura sensacional. E, se for do seu gosto este recurso citado acima, então se torna ainda melhor. Cidades Assombradas é um conceito que possibilita sempre muitas tramas e bons sustos, principalmente quando estão nas mãos de bons autores. E, certamente, Lovecraft pode ser enquadrado neste caso.