Uma História Real de Crime & Poesia

Uma História Real de Crime & Poesia David L. Carlson




Resenhas - Uma História Real de Crime & Poesia


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Paulo 25/06/2023

Belas histórias de pais e filhos sempre nos passam coisas valiosas sobre a vida. Mas, a história de Matt e Charlie envolve mais do que simples amor paterno. Tem também a incompreensão, a travessia por lugares sombrios, a redenção. Assim como Dante Alighieri, tantas vezes mencionado na história, iremos atravessar o inferno ao lado desses personagens e descobrir se existe salvação do outro lado. Durante a trajetória seremos presenteados com belos momentos de música e outros tantos de poesia em uma narrativa gráfica lindíssima de Landis Blair. Mais uma HQ que vai disputar fortemente os lugares entre as minhas melhores do ano.


Charlie Rizzo acaba precisando ir morar com o pai, Matt e se muda para uma Chicago em fase de transformação no final da década de 1960 e 1970. Uma cidade que oferecia poucas oportunidades para as pessoas, onde as ruas eram cruéis e repletas de perigos. Para Charlie, em especial, era uma mudança ainda maior, já que ele pouco conhecia seu pai. Seria uma vida difícil principalmente pelo fato de seu pai ser um homem cego e precisar de ajuda com várias coisas. Cegueira essa que Matt afirma ter acontecido após um infeliz acidente de caça junto de seus amigos quando ele era mais jovem. Tentando construir uma relação, Charlie tenta tocar a vida. Os anos se passam e a relação dos dois não muda tanto. Matt é um homem introspectivo, encerrado em seus livros e na escrita de um livro que Charlie não consegue compreender. Um dia, Charlie se envolve com as pessoas erradas e acaba participando de um crime. Charlie não pode revelar os detalhes do ocorrido devido à Omerta, um código de silêncio exigido pela máfia. Só que seus companheiros não são pegos enquanto ele precisa pagar pelo ocorrido. Sua pena pode ser menor se ele entregar seus companheiros, algo que ele não faz. Matt pede que ele revele os detalhes, caso contrário pode acabar indo parar como ele, sentenciado a anos na cadeia por algo que não fez. É aí que Matt irá contar a longa história de como ele passou por um inferno antes de encontrar a redenção.


Mencionando a edição da Darkside, ele está em uma edição belíssima de capa dura, com papel offset de alta gramatura. Adorei que a capa vem limpa, sem o nome do livro ou do autor, que se encontram na lombada. Dá um destaque na arte que é impactante. É saído de um dos trechos da Divina Comédia que é desenhada por Landis Blair ao longo da HQ. A tradução é de Bruno Dorigatti e Paulo Raviere e é preciso elogiar muito o trabalho dos dois. Não deve ter sido nem um pouco fácil porque envolvem trechos inteiros da parte Inferno da Divina Comédia. Então há uma transição entre o texto da narrativa e a poesia de Dante. Sem falar nos trechos mais musicais do quadrinho. Recomendo muito lerem o posfácio de David L. Carlson onde ele conta um pouco sobre as origens da escrita do quadrinho. Ver como ele conheceu Charlie e como a história foi repassada para ele é de arrepiar.


Essa é uma HQ belíssima de se acompanhar. Não só pelo roteiro, ao qual irei comentar um pouco mais abaixo, que é triste, porém apaixonante, mas possuidor de uma arte magnífica. Landis Blair usa uma arte baseada no emprego de hachuras e em um jogo de preto e branco que é maravilhoso. A HQ é um pouco menor do que o padrão, possuindo um formato quase quadrado, mas é para transformar as páginas em grandes quadros por onde Blair vai colocando sua arte. Seus personagens não são exatamente detalhados, mas são bem expressivos. Boa parte da HQ se passa dentro da prisão, fazendo com que os cenários puxem mais para o sombrio e o melancólico. Talvez a própria ambientação da HQ tenha dado mais gravitas para a arte de Blair. O hachurado esconde uma opressão àqueles que se encontram na prisão e nos raros momentos de luz, parece que é um raio de esperança furando o inferno do enclausuramento. A quadrinização varia muito ao longo da HQ, mas é até melhor para o leitor não esperar nada de exatamente tradicional. Narrativa e arte se combinam para formar um todo que é explorado nos quadros, fora deles, na conjunção de quadros ou até no uso do letreiramento para construir um quadro.



A arte de Blair é bastante influenciada pela maneira de pensar a página de Will Eisner. Claro, todos os quadrinistas hoje pensam ou foram influenciados por Eisner, mas uma coisa é estudá-lo e outra é incorporá-lo ao seu fazer quadrinho. Várias das páginas de Blair usam elementos da arte para unir balões e cenário produzindo um aspecto visual maravilhoso. Como se trata de uma narrativa bastante melancólica e sombria, há uma espécie de materialização das sombras, como se fossem miasmas que se espalham. Essas sombras funcionam como elementos de degradação para os personagens, ou alguma coisa que os prende ao status que eles se encontram. Também achei interessante como Blair representa a visão de mundo de uma pessoa cega: a partir de tentáculos, tateando o ambiente ao redor para obter uma "visão sensorial" mais ampla. Mas, existe ainda a musicalidade nas páginas e como ela toca nossos corações. As notas musicais se integram às páginas produzindo quase que uma sonoridade à leitura. Sei que é contraditório falar em sons na leitura, mas é algo que somente visualizando nas páginas como na vitrine no começo desta matéria é que é possível de se entender. Isso porque nem vou citar a maneira como o braille é incorporado à escrita, que é outro detalhe genial da arte de Blair.


Só que o roteiro de Carlson não fica atrás. É óbvio que precisamos pensar nele como uma história real que lhe foi transmitida por ninguém menos que Charlie, sim, o personagem do livro. O mérito de Carlson foi ter conseguido adaptar essa linda história em uma narrativa em quadrinhos, dando a ela mais camadas do que ela já possuía. Essa poderia ter sido só mais uma história, entre tantas outras que vemos todos os meses nas livrarias. Mas, existe uma verdade profunda revelada pelo autor. Verdade essa que tem muito de material e que podemos vivenciar diariamente nas relações entre pais e filhos. Nos medos e nos não-ditos que existem entremeada nelas. Não consigo deixar de pensar em histórias fascinantes com personagens presos que passaram por um processo de redenção como Um Sonho de Liberdade. E não há personagens inocentes aqui, apenas pessoas reais, de carne e osso. Do começo ao fim, é uma narrativa cativante, porém preciso rapidamente mencionar os últimos capítulos que são devastadores. O mais curioso deles é que são aqueles com o menor número de caixas de diálogo. A nós, leitores, é dada toda uma liberdade para imaginarmos aqueles momentos finais em nossas cabeças, construindo o cenário e a trilha sonora no qual ele se passou.


Precisamos falar de Leopold e Loeb, a dupla de criminosos que faz parte da narrativa quase como um todo. São criminosos famosos dos EUA por terem cometido um crime hediondo, ao sequestrarem um vizinho de 14 anos e o terem mutilado. Eram dois meninos ricos e educados que acabaram indo parar na prisão. A dupla se tornou basicamente os bichos-papões dessa época, aterrorizando a vida de muitas crianças. Quando Matt é preso, ele acaba indo parar na mesma cela que Leopold que tinha acabado de perder seu companheiro Loeb, vítima de um assassinato dentro da prisão. Uma amizade improvável que acaba se tornando algo bem especial entre eles, que desenvolvem um respeito mútuo. Ah, sim, dá para pensarmos tranquilamente em Leopold e Loeb como duas pessoas em um relacionamento homossexual, mas Leopold nunca admite isso. Era uma outra época em que ser gay era profundamente reprimido por uma sociedade conservadora e cruel com o diferente. Eram os anos 1930 nos EUA, pós crise de 29. Toda a década de 1920 nos EUA foi marcada pelo conservadorismo e xenofobia que transbordavam do norte-americano comum. Leopold é um personagem que ganha muitas camadas ao longo da história. De um simples garoto rico e sem remorsos pelo que fez até se transformar em um professor que precisa descobrir como ensinar a pessoas comuns aquilo que sabe.



A vida de Matt é uma colcha de retalhos que ele precisa descobrir como transmitir a seu filho antes que ele cometa os mesmos erros que ele no passado. Quando Charlie descobre que Matt mentiu para ele por toda a vida, ele não gosta nem um pouco disso. Ele se revolta e chama o pai de hipócrita. Sendo uma pessoa mais velha, entendo de certa forma por que Matt escolheu mentir para o filho. Posso não concordar e não sei se teria feito diferente se estivesse no seu lugar. Mas, o que foi feito, foi feito e agora Matt tem a oportunidade de contar a sua verdade. Pode não ser uma verdade que Charlie deseja ouvir, mas é uma verdade que precisa ser revelada. As dificuldades de Matt estão principalmente no fato de que ele não teve uma figura paterna e precisou sobreviver nas ruas, aprendendo, às duras penas, o que fazer para se manter em pé. É com essa visão de não ter tido essa figura paterna que ele tenta ser uma e consigo acreditar depois de ter ouvido sua história que ele consegue ser, mesmo que de um jeito pouco convencional.


Música e poesia estão intrinsecamente ligadas à história. Vamos ver muito de Dante Alighieri presente na narrativa. As referências não são apenas as diretas, aquelas mais visíveis, nas quais o texto é incorporado e mencionado. Mas existem as indiretas em que as vidas dos personagens acabam espelhando a travessia do protagonista de A Divina Comédia pelos nove círculos do inferno. Ao conhecer cada um destes círculos, ele vai aprendendo mais sobre si mesmo. Questionando suas escolhas na vida, refletindo sobre os limites da liberdade, a responsabilidade daqueles que raciocinam, e a luz que consegue penetrar mesmo nos lugares mais escuros do mundo. Nesse processo de conhecer A Divina Comédia, Matt também está em busca de uma razão para viver. Ele concorda em ler o livro com a condição de que Leopold o ajude a cometer suicídio. Leopold reconhece o talento e a sensibilidade de Matt e sabe que deve fazer o que puder para evitar isso. É nesse jogo de vai e volta que somos colocados na narrativa.


Quero destacar dois momentos fabulosos em que narrativa e arte funcionaram como uma só. Primeiro é do Matt chegando na prisão e somos apresentados a como o encarceramento funciona como uma completa retirada de liberdade. A prisão como o Panóptico criado por Jeremy Bentham com as celas formando andares e uma imensa torre de vigia fiscalizando a existência de todos. Esse momento inicial é impactante e causa no leitor aquela sensação de choque e estranhamento que acho que era aonde Carlson queria chegar. A arte está toda em perspectiva e cria um ambiente claustrofóbico terrível. É como se as paredes se fechassem em uma redoma da qual não podemos sair. É mais impactante ainda porque o personagem não pode enxergar, apenas sentir e a percepção de opressão vem do instante em que ele entra no recinto. A segunda cena fabulosa é a encenação da caverna de Platão feita com sombras. Matt fala em alguns momentos que o problema que Leopold tem é o de não ser capaz de explicar didaticamente os seus altos conceitos. Por isso que Leopold e Matt funcionam tão bem juntos. Matt é o mediador, a ponte. É incrível como o teatro de sombras ajuda perfeitamente aos prisioneiros entender que ideia é essa que eles queriam transmitir. A partir desse momento, cada um deles vai incorporar essa nova ideia ao seu arcabouço de vivências.


Contudo, é preciso pontuar alguns problemas de roteiro que acabam atrapalhando parte da experiência do leitor. A história é focada demais no Matt e em certos momentos a gente tem problemas em entender os acontecimentos que cercam a história. É curioso porque o autor insere uma série de informações que acabam sendo desnecessárias para a história, mas carece de outras que ajudariam a contextualizar melhor. É aquela linha tênue do que pode ser considerado informação inútil ou não. Para tal, o autor se vê na necessidade de pensar qual é o objetivo daquilo que está sendo escrito. Vai haver uma consequência futura? O que uma informação X ou Y tem que pode acrescentar na experiência de leitura? Ser uma história que abraça tantos temas pode ser uma espada de dois gumes. Ao mesmo tempo em que nos fornece uma rica imersão junto ao personagem de Matt e à sua relação com seu filho, ele deixa de lado outras narrativas que seriam tão interessantes quanto como a relação homoafetiva nunca assumida por Leopold, todo o terror da prisão diante das vidas de outros detentos que são meros bonecos de fundo do que personagens propriamente ditos. Havia tanto a ser dito. De duas, uma: ou o autor poderia ter realmente se concentrado na narrativa de Matt e não dar indicativos de que apresentaria a vida de outras pessoas ou abordar alguns destes personagens, oferecendo novas camadas à história.



Existem também alguns problemas de continuidade que o autor não se ligou. Como Carlson escolheu reduzir a história para que ela coubesse em um quadrinho (que já é bem extenso), partes significativas da história são suprimidas. As escolhas que Carlson fez nem sempre foram felizes. Por exemplo, como a sentença de Matt deixou de ser um ano para ser mais? Dessa forma a compreensão do que está acontecendo na vida dos personagens fica prejudicada, embora não comprometida por essas pequenas coisas. Não deixa de ser uma HQ maravilhosa, mas a inexperiência de Carlson como autor é nítida. O que a arte consegue elevar a outro patamar, o roteiro nem sempre entrega.


A HQ é tão cheia de histórias que poderíamos passar muito tempo discutindo sobre a vivência destes personagens. Me senti como alguém que estava junto de Charlie escutando essa história e ouvindo a sinfonia de Bach como parte do processo. É uma daquelas narrativas de vida que te deixam reflexivo, que te impactam a um nível profundo da alma. Como disse antes, entendo o que Matt fez para proteger seu filho, de não contar uma verdade dura demais, cruel demais, mas ao mesmo tempo entendo a raiva de Charlie em se sentir traído. Colocamos nossos pais e mães em um certo pedestal de santidade e existência imaculada que quando destruída, abala nossa confiança e auto-estima. A arte é simplesmente maravilhosa e não consigo imaginar essa HQ de outro jeito. Sem falar que é um daqueles quadrinhos impossíveis de serem adaptados para outra mídia. Ele funciona desse jeito porque foi pensado para esse jeito. Essa é a mágica da nona arte.

site: www.ficcoeshumanas.com.br
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Cristiano.Cruz 02/06/2023

Histórias que se Entrelaçam
A história de um pai que, ao contar sua verdade, salva o filho de um destino que parecia estar traçado.

Foucault - com seu panóptico - e Dante - com sua alegoria do inferno -, são ao mesmo tempo a base de sustentação e o pináculo dos autores na condução do leitor.
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Elidia 11/06/2022

Uma das melhores leituras do semestre!
Engana-se achar que o ponto forte desse quadrinho é a arte - que esta incrível diga-se de pssagem... Só um belo roteiro pode intrigar os leitores com O inferno de Dante e o Crime do século, família e as nuances da vida mediados por todos tipos de arte!
Favoritado!
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_lendogibi 06/05/2023

EMOCIONANTE!
Uma história impactante e emocionante, com uma linda relação de pai e filho, cheia de altos e baixos.

Parece até mentira, parece que tudo saiu da cabeça do autor, mas não, é real, aconteceu de verdade.

Leiam!
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Emille.pravereler 23/03/2023

Pravereler
Esse é o segundo livro em quadrinhos que eu li, e óbvio, a darkside sabe fazer isso como ninguém! Confesso que ainda não estou muito adaptada ao estilo, mas aos poucos to pegando o jeito!
Crime e Poesia conta a história de um pai, que para não ver o filho seguindo o mesmo caminho, resolve contar a sua história na vida do crime e seu envolvimento com o crime do século!
O livro fala sobre poesia, sobre vida, sobre como o conhecimento pode te libertar de todas as formas.
Eu sempre quis ler A Divina Comédia de Dante Alighieri e esse livro trouxe uma visão tão bonita e interessante da obra, que despertou ainda mais o meu interesse pela leitura!!
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Bruno Henrique 05/03/2023

Acho que o correto seria começar falando sobre o apuro artistico da arte desse livro. Não só pela estética dos desenhos hachurados mas também pela incrivel narrativa e metaforas visuais que tornam a leitura uma experiência sensorial.
Soma se o fato de ser uma biografia sobre a história de um homem que precisa atravessar seu inferno particular no momento que descobre a iluminação das artes enquanto aprende a conviver com a escuridão de sua cegueira
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Ghi 19/02/2023

A literatura salva
Esse quadrinho me pegou por diversos motivos. A questão da leitura, da literatura, meu medo de não mais enxergar e consequentemente ler, minha maior paixão da vida, a relação com m o pai, a perda da mãe...
A narrativa é muito bem construída e intercalada com trechos da literatura clássica europeia, que fazem parte das diversas camadas da história.
Eu sempre disse que a literatura salva, e aqui é possível ver isso.
O quadrinho é perfeito pela narrativa, pela literatura e a arte é maravilhosa!!!
Recomendo ndo muito.
Quadrinho que vai ficar no ??
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monilycavaleiro0 25/01/2023

O melhor quadrinho que já li!!!!
Crime & Poesia me tocou de saborosas formas, me arrancou sorrisos e suspiros, além dos pensamentos após tanta poesia e reflexão. Vai ficar pra sempre na memória!
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Aline Araujo 20/01/2023

Obra de arte
Minha primeira definição para esse quadrinho seria: obra de arte. Desde a capa, o traço e, por fim, a história em si.

Chega a ser uma piada de mal gosto o quão cruel pessoas extremamente inteligentes e providas de conhecimento podem ser.

Matt Rizzo é um homem comum, com uma história real, alguém cego que viu a melhor face de um criminoso cruel. Seu legado não foi só a educação formal e seus escritos baseados em grandes autores. Seu legado nos convida a enxergar mais de perto as camadas (ou círculos) dos seres humanos.
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Natalia.psico.literatura 28/12/2022

Que trabalho gráfico ??
A resenha é longa? eu sei, mas completamente necessária ?

A inspiração para a graphic novel de David Carlson e Landis Blair, ?Crime e Poesia? veio durante uma conversa. Quando o verdadeiro Charlie contou a história de seu pai a David Carlson, acho que ele não imaginou quão grandiosa essa obra ficaria.

Charlie Rizzo é apenas um menino quando sua mãe e sua avó o levam de Chicago para a Califórnia. Após a morte de sua mãe, Charlie, ainda jovem, volta para Chicago e seu pai.

Ali ele precisa se ajustar a uma vida totalmente nova, dentre elas a cegueira de seu pai, que foi resultado de um acidente de caça na juventude. A maneira como essa deficiência faz de Charlie o cuidador de seu pai faz com que o mesmo se ressinta à medida que cresce. Com o passar do tempo, Charlie acaba se envolvendo com um grupo de adolescentes não confiáveis e passa a seguir um caminho que não tem um bom final e muito provavelmente só termina na prisão ou pior.

E é para esse filho desafiador, mas ainda flexível, à beira da idade adulta que Matt Rizzo finalmente conta a verdadeira história de sua cegueira, o que o transformou no homem que se tornou e continuou a impactar e mudar sua vida.

?Crime e Poesia? é, acima de tudo, uma história sobre se perder nas histórias de outras pessoas. Charlie se perde na história vívida do tempo de seu pai Matt atrás das grades, da maneira como Matt se perde em grandes obras da literatura, como ?A Divina Comédia? de Dante e a metáfora da caverna de Platão, ou a maneira como o companheiro de cela de Matt se perde nas histórias dele. Isso é particularmente apropriado porque o romance gráfico em si é fascinante, com suas ilustrações lindamente imaginativas, alusões literárias delicadas e insights íntimos sobre relacionamentos pai-filho.

Blair apresenta uma leitura complexa e maravilhosamente criativa da história de Carlson. As ilustrações vão muito além dos painéis retangulares padrão populares em histórias em quadrinhos e novelas gráficas.

Carlson graciosamente incorpora literatura e um pouco de história em sua narrativa. Ele entrelaça as histórias de Dante, Platão e Nietzsche com as de Matt, proporcionando uma visão maior de sua ?história de crime e poesia?, mas também das próprias obras literárias.

Se você me dissesse que havia um livro que mesclasse a Divina Comédia com o Panóptico, eu ficaria feliz com isso; mas esta Graphic vai muito mais fundo na forma como a verdade, a mentira e a redenção são equilibradas. O aspecto mais surpreendente desta história é que você sente o peso da culpa que pesou sobre todos aqui; culpa não só de ações, mas de lições não aprendidas, ou (ainda mais importante) não ensinadas. O aspecto poético é em si brilhante, e você não pode deixar de conferir!
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Rauecker 07/12/2022

Crime e Poesia
Uma Graphic Novel sensacional, falando sobre a arte, é simples pois a desenhista utilizou apenas canetas a tinta, então não temos nada colorido, só preto e branco, porém os detalhes são perfeitos e a profundidade de cada desenho fez jus a história e com certeza encaixou, não teria como ser melhor.

Da história acompanhamos Charlie, filho de Matt, sua mãe morreu e agora ele irá viver com o pai, e nesse cenário temos o desenrolar do drama da vida do pai dele, e a verdade sobre algumas mentiras que o mesmo contou.

No mais, o foco da história são os momentos em que Matt se encontrou na cadeia, e como perdeu a visão. É nítido o desespero do personagem pois além de não ter sua liberdade na sociedade, também considerou perdida sua liberdade "física" quando perdeu a visão.

Vemos como a arte pode ser importante para purificar uma alma e também uma filosofia de impressionar, isso me agradou muito pois as citações de Dante em a Divina Comédia foram perfeitas.

É surreal imaginar que isso aconteceu com uma pessoa.

Citação preferida:

" A habilidade do poeta é nos ajudar a transcender o meramente humano.
Indicar além das nossas preocupações temporárias e revelar o âmago da questão.
Aos que tem olhos para ver e ouvidos para ouvir."
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Djeison.Hoerlle 06/12/2022

Quem conhece minhas resenhas sabe que, no geral, elas são muito mais úteis para pessoas que já conhecem o material do que para aquelas que estão simplesmente tentando decidir o que comprar em seguida, tanto que raramente gasto algum tempo relatando o desenrolar da história, e sim trazendo minhas impressões sobre, ou um pouco de contexto histórico, mas Uma História de Crime e Poesia é um quadrinho tão especial que achei que seria válido fazer algo um pouco fora do meu habitual. Vamos à resenha.


Há na nossa sociedade, um conjunto de fatores determinantes cruciais para o exercício da liberdade, e que, na sua ausência, funcionam como prisões, mesmo que não oficialmente. Dinheiro, por exemplo, é um deles, afinal, sem grana não conseguimos fazer muita coisa.

Partindo dessa necessidade (que provavelmente nós todos conhecemos bem), é que o protagonista de Uma História Real de Crime e Poesia, Matt Rizzo, envolve-se em uma tentativa de assalto que, sendo frustrada, tira-lhe a liberdade literal de ir e vir, mandando-o à prisão, e também a visão, a qual sela essa sucessão de privações que compõem o declínio deste personagem.

É nesse ponto, precisamente, que a história mostra a que veio, pois é na prisão que Matt, por meio de uma amizade improvável com um sujeito chamado Nathan Leopold Loeb, descobre uma nova forma de se relacionar com o mundo e o contexto em que vive: os livros.


Antes de entrar nos méritos dessa virada narrativa, cabe dizer que o personagem de Leopold é fantástico, para dizer o mínimo. A começar pelo fato de que? ele não é um personagem! O verdadeiro Nathan Leopold Loeb de fato foi à prisão pelo assassinato de um garoto de 14 anos, que ficou conhecido como o "Crime do Século". As motivações dele e seu comparsa foram mostrar sua superioridade intelectual, cometendo um crime horrendo sem deixar provas e nunca sendo presos. Não preciso dizer que o plano foi frustrado. Sobre esse ponto, cabe dizer que não existe nada mais intelectualóide de início de Século XX do que homens que se acham superiores a outros homens a ponto de desprezar até mesmo suas vidas. O ponto de partida deste momento nebuloso talvez tenha sido a soma de interpretações errôneas da obra de Nietzsche (mais precisamente Assim Falou Zaratustra com o conceito de Superman) somada com alguns contorcionismos mentais para enquadrar também a obra de Darwin como argumento. O resultado dessa brincadeira, além do assassinato de um menino em Chicago, nós vemos refletidos até hoje. Nazismo, fascismo, genocídios e guerras.


Mas ok, acho que já me estendi suficientemente nesse parágrafo sobre o zeitgeist da primeira metade do Século XX. Prossigamos para a história.


Na medida que os livros, mais precisamente, Inferno de Dante Alighieri, vão crescendo em significado e importância para Matt Rizzo, nós vemos a sua vida sendo ressignificada. Isso porque, por mais que nosso protagonista passe a associar a prisão em que se encontra ao inferno e todos os círculos apresentados na obra de Dante, esta faz questão de lembrá-lo que o Inferno não dura para sempre. Há mais a ser vivido lá fora.

E ok, esse fascínio lúdico por livros é, talvez, um tema já um tanto piegas. Já foi abordado em diversas obras, de diversas formas. Inclusive, é precisamente o que estou fazendo na história que venho escrevendo. Os méritos do autor, David L. Carlson, nesse caso, são amarrar a história do Inferno de Dante à prisão que Matt é submetido. Um dos temas não funciona sem o outro, indo muito além daquele tipo de referência gratuita que costumamos ver em séries como The Big Bang Theory ou filmes do Tarantino. Compreendendo Uma História Real de Crime e Poesia, compreendemos melhor Dante e sua importância, e vice-versa.


Falando por mim, com toda essa pompa intelectualóide que eu (gosto de pensar que) tenho, digo que é impossível não se apaixonar pela história. A companhia de livros é, por vezes, solitária, mas é nela que encontramos refúgio para os dias mais escuros e também a inspiração para lidar com eles, e acho que poucos autores até hoje souberam comunicar isso de forma tão objetiva sem perder originalidade, estilo e profundidade quanto David Carlson e Landis Blair.

Leiam essa maravilha!
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Henry 27/10/2022

A cultura é capaz de salvar uma alma?
Tive muitas referências e opiniões positivas que me fizeram optar por essa leitura. "Um dos melhores do ano", eles disseram. Será?

"Crime e Poesia" narra a história de um homem cego que recebe a vinda de seu filho, após a morte da mãe. Há um certa estranheza por parte do menino, pois o mundo de seu pai é peculiar: luzes sempre apagadas, cômodos sem qualquer decoração, paredes sem quadros... Uma casa sem vida.

O motivo verdadeiro da cegueira de seu pai foi mantida em segredo. Mas ele é revelado quando seu pai percebe que seu filho está ingressando no mundo do crime.

Tendo passado uma parte de sua vida na cadeia, dividindo cela com um dos mais perigosos assassinos, Matt revela que a cultura o salvou da desgraça. O mesmo assassino o ensinou a ler em braile e sobre o poder da cultura, do saber.

A HQ busca nos apresentar a importância e influência de grandes pensadores e escritores da história do mundo, sendo o principal: Dante Alighieri, autor de "A Divina Comédia".

Uma história rica em conhecimento e puramente educativa. Claro, há situações pesadas, mas se conecta com o clima da narrativa. Além disso, os desenhos são muito interessantes, todo feito por meio de hachuras e sombreamentos.

Uma grande HQ, sem dúvida, entrou para meu ranking de melhores do ano. Recomendo demais.
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Mr.Sandman 13/10/2022

A verdade da imaginação...
Uma História Real de Crime e Poesia é um quadrinho denso e tocante, que retrata a vida de Matt Rizzo, um homem que realmente existiu e que possui uma história inimaginável. É o primeiro livro de David L. Carlson, mas seu talento com as palavras e com a ordem da narrativa é impressionante. A arte, de Landis Blair é cativante e te deixa hipnotizado, com layouts inventivos e de uma criatividade impressionante. As inspiradas splash pages já reservaram espaço na minha mente. A edição da Darkseid é impecável e traduz todo o peso da obra.
É uma leitura densa, filosoficamente desafiadora e repleta de referências, principalmente a textos clássicos, como a obra de Dante Alighieri. Porém, não são meras referências, são parte essencial do entendimento desses personagens, de suas dinâmicas e de suas questões existenciais. A cegueira de Matt, o personagem central, reflete-se inúmeras vezes dentro dos textos do Inferno, da jornada de Scorto e da poesia inglesa citada ao longo da história. Essa conexão é feita de forma brilhante.
É um livro que fala de Prisões. Prisões que são ora feitas de barras de ferro, ora feitas de ideias. Que fala de pais e filhos e da essência da vivência, da busca incessante por sentido e do poder da arte nesse processo. É uma odisseia poética, que passa pelos infernos, pelo purgatório e nos dá um gostinho do paraíso... ou do que ele pode ser e representar. Um livro que mesmo baseando-se em fatos reais, nos permite ver a verdade da imaginação, da poesia, e dos crimes que cometemos. Não é um quadrinho que apenas me encantou por sua arte e seu texto, por suas alusões e referências, mas que me encantou pelos quadros que pintou em minha mente.
"Na noite interminável só há nós, e nada mais, além da noite, brilha."
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jessiviesser 05/10/2022

RESENHA | Uma História Real de Crime & Poesia
Uma HQ com uma belíssima história sobre pais e filhos, meias verdades, redescobertas, a arte como uma parte essencial da vida, "más" companhias e maneiras diferentes de se enxergar o mundo. A arte é um deslumbre. Uma das minhas melhores leituras em 2022.

Recomendo! ??
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