Paulo.Sakumoto 14/11/2022
O processo criativo aflora quando corremos. Crescemos assim como pessoas.
Sou corredor, maratonista e ciclista e quando vi pela primeira vez o título do romance senti-me atraído. Que surpresa, Haruki Murakami é um corredor também, mas seria mais um livro enfadonho sobre técnicas ou glórias pessoais no esporte? Não, não, ele jamais se rebaixaria a esse lugar-comum. E de fato, trata-se de uma espécie de autobiografia, na qual ele descreve seu início como escritor e como a corrida coincidentemente foi a forma propícia por mantê-lo são para os desafios e incertezas do porvir.
O processo de produção literária, seus pontos de vista sobre escritores, todas as dificuldades que envolvem a profissão, a qual ele considera bastante insalubre, mostram um Haruki de carne e osso, mas consciente de seus talentos e limitações. Eis que o esporte, especificamente as corridas de longas distâncias, transformam seu jeito, seu olhar, seu método, sua produção, pois dão o equilíbrio para viver e continuar a escrever com sua ótica tão peculiar e talentosa.
Quando perguntam-no sobre o que ele pensa enquanto corre, ele diz algo do tipo: "Quando está frio penso que está frio, quando está quente penso no calor que está fazendo, quando estou feliz penso na alegria, outras vezes não há nada a se pensar..." Não foram as palavras literais do livro, mas foi mais ou menos isso, e sei perfeitamente o que ele quis dizer. As corridas de longa distância são formas de tempo/espaço que nos permitem evoluir seja física, psicologicamente, criativamente, etc. As corridas passaram a ser parte do que ele é como pessoa, forjando seu caráter, trazendo paz e silêncio para reflexões superficiais e profundas, bem como equilíbrio, maturidade e conformidade com a finitude.
Sem dúvida é uma leitura que extrapola o simples ato esportivo de correr ou competir no triathlon. Porém, quem escolheu esses tipos de esporte para a vida, mais do que se identificará com tudo o que Murakami escreve e se deliciará com sua forma peculiar de viver, trabalhar e enxergar o mundo.