Andre.Pithon 25/07/2023
Bingo de Fantasia Sci-fi 2023
4.5: Mitos ou Releituras
Modo difícil: Não baseado em mitologia grega ou romana
2.5
Este Julho foi um dos meses que menos li nos tempos recentes.
Meu ritmo vinha bem consistente de um livro por semana no mínimo, e algo entrou no caminho, colapsou toda minha rotina, me lançando num excelente caos descontrolado.
Imagine o quão medíocre um livro romântico deve ser para um André apaixonado dar uma nota tão baixa para ele.
Baseado em A Ilha do Dr. Moreau, de H.G. Wells, The Daughter of Doctor Moreau foi indicado para o Hugo de 2023, seguindo a tradição de Silvia Moreno-Garcia sempre aparecer nestas listas, este sendo meu primeiro (e provavelmente último, mas estou disposto a dar uma segunda chance se encontrar algum livro com conceito forte) contato com a obra dela. Acompanhando a narrativa do livro original, Doutor Moreau tem um cantinho onde ele se diverte fazendo uns experimentos humanos para dar características animais para o povo, saudável até aí. A atual releitura adiciona a personagem da filha dele, que se torna o foco da história, e adiciona uma pesada dose de romantismo clássico. E aí está o grande problema.
A última coisa que eu esperava nas indicações do Hugo é me questionar se José de Alencar levantou do túmulo para cuspir na minha cara mais uma vez. Mesclando as preocupações coloniais com uma narrativa lenta e previsível, A Filha do Doutor Moreau não reconstrói a obra original, mas carrega aspectos de um movimento literário inteiro, deslocado temporalmente. Esta deslocação permite alguns pensamentos mais modernos, uma heroína não tão patética, mas ainda carrega o ritmo letárgico, o peso de um estilo exageradamente meloso e idílico, que talvez possa funcionar para quem respeita Alencar, mas essa pessoa jamais será eu.
A escrita é competente, e acho que isso concede a maior parte das estrelas, nunca me vi incomodado com diálogo ou com narração mal encaixada, e os personagens possuem ao menos uma voz levemente distinta. Não é nunca espetacular, mas alcança o funcional. Mas em uma narrativa lenta, que necessitava ou de emoções mais fortes ou de uma prosa realmente cativante, o competente muitas vezes não basta.
Carlota é uma protagonista romântica, toda apaixonada pela primeira pessoa que aparece na sua frente, mas a narrativa eventualmente distorce essa perspectiva para trazer novos aspectos subversivos para ela (Mesmo que o subverter de clichês românticos seja hoje mais clichê que os clichês que subverte). Montgomery é um clássico homem triste apaixonado por quem não deve, e, mesmo sendo um arquétipo que eu tenho certo afeto (Harry du Bois, olá), ele não consegue ter fortes momentos de destaque ou realmente protagonizar sua melancolia.
E o maior crime?
Eu não acho que este livro necessita carregar o legado de Wells para existir.
Ao recontextualizar uma história, espera-se que a história original seja parte integral, que a nova narrativa não funcione sem ela. Aqui, os híbridos de Moreau trazem um tom de pitoresco para um quase-convencional romance colonial, mas nunca são presentes ou explorados o bastante para justificar a conexão das obras. Até a grande revelação final, que pode ser adivinhada muito antes, não soma nada à trama, não justifica a classificação em ficção científica de algo que é muito mais Moreno-Garcia dentro de uma fantasia de Alencar gritando ser Wells. E que visão pavorosa é essa aberração estilística.
No fim, é competente, consigo imaginar um público gostando, e não consigo justificar para mim mesmo uma nota menor, é mais bem pensado e escrito que a maioria dos meus 2 estrelas recentes. Mas queria muito.