Helder 26/05/2023O livro perfeito que não sabíamos que precisávamosTenho que confessar que quando vi que este livro seria lançado, eu me perguntei: Para que??
Após tantos anos do lançamento de O Menino do Pijama Listrado, já está no imaginário mundial a triste história do menino Bruno, que em sua ingenuidade, acaba participando da 2ª guerra mundial da pior maneira possível. E por mais que o livro tivesse um final meio aberto, sempre esteve claro para nós tudo o que tinha acontecido.
Mesmo assim, John Boyne sempre se perguntou o que teria acontecido com a família do menino após os trágicos acontecimentos e mesmo após a Alemanha perder a guerra. E ainda bem que ele se fez esta pergunta, pois a sua inquietação gerou este livro maravilhoso, que já entrou no pódio dos melhores livros do ano para mim.
O livro é narrado por Gretel, a irmã de Bruno que tinha 12 anos no livro anterior e que em 2022 é uma idosa de 91 anos morando em um belo apartamento em Londres em frente ao Hyde Park.
O livro nos mostra os problemas que Gretel enfrenta no presente, com sua vizinha que está começando a sofrer com Alzheimer, seu filho que deseja que ela vá para uma clínica de idosos para poder vender o maravilhoso e caríssimo apartamento onde ela vive e o novo casal que mudou para o apartamento do 1º andar.
Mas como Gretel chegou até ali?
Para que a gente possa sabe isso, o livro nos leva ao passado, onde acompanhamos a trajetória de Gretel fugindo da Alemanha para Paris, Australia e Inglaterra, sempre em busca de esquecer a sua participação no evento mais cruel da história mundial e com medo de ser descoberta, pois após o fim da guerra o mundo começa a conhecer o que os nazistas fizeram naqueles campos e ser alemão passa a ser algo perigoso, já que ser alemão passa a ser sinônimo de ser nazista.
O livro fala muito de culpa e Boyne me fez sentir todas as imperfeições de Gretel.
Gretel não era simplesmente uma alemã com uma participação superficial na guerra. Ela era filha do comandante de Auschwitz, e como ela mesma cita em um ponto do livro, “já apertei a mão de Adolf Hitler e beijei o rosto de Eva Braun. Brinquei com os filhos de Goebbels e participei de uma festa de aniversário de Gudrun Himmler”. Se isso não é um “curriculum” me digam o que é!
Mas será que realmente ela se arrepende do que aconteceu? Gretel era alienada ou conivente? Podemos julgá-la por algo feito por seu pai?
E para responder estas questões o livro nos prepara muitas surpresas, e Boyne não pega leve com sua mocinha.
Durante a leitura senti medo, pena e raiva da personagem e tenho que dar os parabéns a autor, que está afiadíssimo neste livro.
Os diálogos de Gretel no presente com seu filho, o filho da vizinha, o pequeno Henry, a esquecida Heidi e principalmente com seu vizinho do 1º andar são deliciosamente cínicos e espirituosos.
Já a Gretel do passado é claustrofóbica, sempre com medo de ser descoberta e criando momentos memoráveis, como as cenas da resistência francesa, do cinema e da difícil conversa com aquele que parece ser o seu primeiro amor.
São situações tão difíceis e pesadas que fica impossível a gente não se colocar no lugar da personagem.
E se isso já não fosse tudo muito pesado, Boyne ainda consegue discutir violência doméstica de uma forma magistral.
Minha única pequena ressalva é com o final, que para mim poderia ter sido mais simplório e eu não teria ficado ofendido. Eu esperava um sacrifício de Gretel para salvar o pequeno Henry, mas nada me preparou a atitude maluca que Boyne trouxe para a personagem.
Sendo assim, não tenho como não dar 5 estrelas, favoritar este livro e bater palmas para o autor que conseguiu criar um livro tão perfeito que parece que foi lapidado.
Recomendo com louvor!