Vanelise.Aloraldo 23/05/2024
Memórias de um país pouco conhecido
Segundo os dados da Secretaria de Inspeção do Trabalho, em 2020 foram regatados 942 trabalhadores em condições análogas à escravidão e um total de mais de 55 mil nos últimos 25 anos. Ou seja, o direito de propriedade de uma pessoa sobre outra ainda existe no Brasil, mesmo depois da formal “abolição da escravatura”.
O perfil dos escravizados contemporâneos não mudou muito daqueles registrados durante o tráfico de escravos para o Brasil. Em sua maioria, são negros, jovens, analfabetos, que começaram a trabalhar ainda criança, ou seja, uma parcela de excluídos de qualquer política pública.
Esse livro relembra que a nossa formação sócio histórica e econômica brasileira foi construída à base do trabalho de pessoas escravizadas, sob condições degradantes, sem direitos, sem formalização de vínculo empregatício, sem salários, sem casa com material durável, sem descanso, sem liberdade.
Esta obra nacional (espetacular!) mostra nossas feridas abertas pelas marcas da violência que acompanham até a atualidade muitas trajetórias de vida. No passado pessoas foram arrancadas de seus territórios para trabalhar aqui de maneira forçada, famílias tiveram que se separar, seja na esperança de encontrar um pedaço de terra pra sobreviver, seja porque foram expulsos pela ganância de certos senhores.
Mas o livro também traz a riqueza cultural, as muitas crenças e tradições repassadas pelos ancestrais que ajudam a acalentar as semanas de exaustão e curar dores visíveis e invisíveis dos membros da comunidade de Água Negra.
As irmãs Bibiana e Belonísia nos envolvem com a história, e trazem nas suas observações e ações, muitas questões sobre desigualdade e injustiça.
Obra premiada diversas vezes, tornou-se um dos livros mais vendidos. Mas isso não ocorre sem motivo. É leitura profunda, de linguagem específica e original, baseada em pesquisas e relatos do povo nordestino, que revela nosso passado e realidade atual. O autor Itamar Vieira Jr nos brinda com essas memórias de um país pouco conhecido, de práticas religiosas que resistem através do tempo e da força que pulsa e movimenta o campo.