Procyon 09/12/2023
A arte de viver ? comentário
?Não exija que as coisas aconteçam como você deseja; mas deseje que aconteçam como devem acontecer, e você continuará bem.? (p. 17)
Com o domínio de Roma sobre a Grécia, a filosofia helênica deixou de focar na metafísica para se voltar ao homem comum e ao mundo físico. A arte de viver, de Epicuro, estabelece a filosofia deste pensador de Samos que pregava, assim como outros estoicos antes e depois dele, a austeridade, a temperança e a moderação. Segundo o estoicismo imperial (de Roma), precisamos encontrar nosso lugar no cosmos ? suportá-lo, não alterá-lo; suportá-lo, não compreendê-lo. No estoicismo epicurista, somos lembrados que nós somos mortais, que devemos prestar atenção às coisas que mais importam na vida (diferentememte de uma ?literatura? de autoajuda, onde o principal responsável pela nossa vida e felicidade somos nós; em que o ?eu? se faz como centro da vida, definidor do sucesso e da felicidade).
?Quando alguém se mostrar vaidoso por ser capaz de compreender e interpretar as obras de Crisipo, diga a si mesmo: ?A menos que Crisipo tivesse escrito de maneira obscura, ele não teria nada do que se envaidecer. Mas o que eu desejo? Para compreender a natureza e segui-la, eu me pergunto, quem a interpreta; e ouvindo que é Crisipo quem interpreta, eu recorro a ele. Mas, eu não entendo seus escritos. Eu procuro, então, alguém para explicá-los?. Até agora não há nada por que me vangloriar. E quando encontro um intérprete, resta fazer uso de suas instruções. Isso já é valioso. Mas se admiro apenas a interpretação, me torno um gramático em vez de um filósofo, exceto pelo fato de que em vez de Homero eu interpreto Crisipo? Quando alguém, portanto, deseja que eu interprete Crisipo para ele, ficarei envergonhado se não puder exibir ações que sejam adequadas e consonantes com seu discurso.? (p. 41).
Epicuro, este filósofo escravo do estoicismo romano, busca respostas materiais num mundo aparentemente destituído de sentido, repleto de caos e de aleatoriedade. Este ?cirurgião das paixões? impregna sua filosofia determinística no seu ?A arte de viver? através dos seguintes princípios: 1) uma concepção materialista de mundo; 2) a aceitação da busca do prazer como guia; e 3) a hierarquização dos prazeres. Para Epicuro, a filosofia (?amor à sabedoria?) serve como um antídoto para a alma. A resignação frente ao curso natural dos acontecimentos encontra-se numa cosmovisão que interliga física, lógica e ética, em que a conduta humana faz parte da harmonia do cosmos. Para ele, deve-se agir conforme a natureza, praticarmos ?memento mori? (lembrar-se da morte), e, uma vez que o mundo está determinado e a realidade é uma só, devemos praticar autarquia, uma noção de domínio de si.
?Nunca diga sobre nada: ?Eu o perdi?, mas, ?Eu o restituí.? Seu filho morreu? Ele foi restituído. Sus esposa morreu? Ela foi restituída. Sua propriedade lhe foi tirada? Ela também foi restituída. ?Mas foi um homem mau que a tomou.? O que isso diz para você? Através dele, aquele que a deu a pediu de volta. Enquanto ele permitir que você o possua, mantenha-os como algo que não é seu, como fazem os viajantes em uma estalagem.? (p. 18)
Sem interpretações, sem juízos falsos. Ao contrário do que diz o senso comum, a ignorância nos leva, para Epiteto, à infelicidade ? no entanto, levarmos em conta a filosofia como norte, adquirimos aquelas austeridade, temperança e moderação destacadas no início deste comentário, a tranquilidade e a paz de espírito que nos encaminham, cada vez mais, em direção à felicidade. Epicuro nos ensina, por fim, uma vida simples, de autodomínio e aceitação do que não depende de nós.
?Procure de imediato, portanto, ser capaz de dizer a tudo o que for imagem: ?Você é apenas uma imagem e de forma alguma a coisa real.? E então examine tudo pelas regras que você já conhece; e primeiro e principalmente por isto: se se refere às coisas que estão em nosso próprio poder ou àquelas que não estão; e se se referir a algo além de nosso poder, esteja preparado para dizer que isto não é para você.? (p. 14)
?[?] A morte não é terrível, do contrário teria parecido assim a Sócrates. Mas o terror consiste em nossa noção de morte, que é terrível. Quando, portanto, somos frustrados, perturbados ou aflitos, nunca devemos imputar isso aos outros, mas a nós mesmos ? isto é, à nossa própria percepção.? (p. 16)