Mari Doroteu 13/01/2022
Minha primeira experiência lendo um livro da terceira irmã Brönte, Anne. É inegável que essa família tinha muito talento, porém algumas coisas nesse livro me incomodaram.
O livro é considerado por muitos como o primeiro romance feminista da história e, de fato, se levarmos em consideração que foi escrito no século XIX, há muitas discussões e situações abordadas que são muito à frente de seu tempo, como por exemplo a situação das mulheres em relacionamentos abusivos, os debates sobre a forma de educar filhos (e as diferenças quando eram meninos ou meninas), o fato de as mulheres não terem direitos aos seus próprios bens e propriedades após casadas, de ficarem presas à casamentos infelizes e sem sentido por não poderem se divorciar, a preocupação constante com a imagem na sociedade e as fofocas e escândalos, etc.
Basicamente o livro narra a história de Helen Graham, a nova inquilina de Wildfell Hall, uma mulher que vive sozinha com o filho e que ninguém sabe de sua história ou de onde veio, até que Gilbert Markham se aproxima dela e acaba tendo acesso ao seu diário. Por meio dele, descobrimos o que aconteceu no passado e como ela veio parar ali em Wildfell Hall.
O enredo é muito bem escrito e realmente me prendeu, pois fiquei curiosa para descobrir tudo o que tinha se passado com Helen. Ela, como muitas mulheres na era vitoriana, casou-se muito jovem com Arthur Huntington, um homem bonito e encantador que acabou a conquistando.
Apesar de todos os avisos de sua tia, que vivia lhe dizendo que ele não era uma boa escolha, que tinha fama de ser um libertino, festeiro, mulherengo, beberrão, etc, Helen ignora tudo, confiando que sua superioridade moral fará com que ela possa mudá-lo e torná-lo um homem melhor e direito.
E é aí que eu já comecei a ficar incomodada. Detesto plots em que a mulher acredita que pode magicamente transformar o homem, como se fosse uma reabilitação ou a psicóloga dele. Todos sabemos que isso não vai acontecer, porque o desejo de mudança tem que partir da própria pessoa. Então já comecei a ficar revirando um pouco os olhos nesse momento.
Daí em diante, passamos a conhecer melhor Arthur, que é completamente detestável e babaca, e Helen, que acaba se mostrando como um perfeito exemplo de mulher da época, moralista ao extremo, e muito religiosa.
Sei que era característica da época, mas esse moralismo exacerbado o tempo todo e os discursos religiosos da Helen faziam com que muitas vezes eu sentisse que estava lendo um livro religioso, que tentava me converter e impor aquelas crenças de qualquer jeito. Acabei ficando bastante irritada e entediada com as lições de moral e visão de mundo de Helen.
Ela é uma pessoa muito radical, convencida de que está sempre certa em tudo, e está constantemente tentando melhorar e corrigir os outros, o que acaba ficando um pouco maçante.
(Pode conter leves spoilers abaixo)
Após tudo que ela passou com Arthur, que era um homem desprezível e nojento, que a tratava feito lixo, a Helen ainda tem a pachorra de voltar pra ele no final, quando ele estava doente e morrendo, para cuidar dele e servir como a perfeita esposa e beata santíssima. Nossa, nessa hora eu fiquei com vontade de sacudir essa mulher e gritar. Era inacreditável que ela iria fazer esse papel de palhaça e ainda tendo que ouvir o homem debochando dela o tempo todo.
Por fim, o final do livro também foi um pouco tosco, pois todos os personagens maus/incorretos/pecadores terminaram com finais horríveis e tristes, enquanto que os bonzinhos/ moralmente certos terminaram com um felizes para sempre, tudo muito conveniente.
Enfim, o livro no geral não é ruim, pois a escrita realmente é muito boa e prende o leitor. Além disso, o enredo todo é um grande novelão, com muitas fofocas e situações que ora te deixam indignado e ora exultante de alegria. Mas os personagens em si não me agradaram tanto, e várias vezes tinha vontade de xingar essa bondade e paciência infinita da Helen.