Marcos Ogre 15/05/2023
Crescer é trágico
Ler Peter Pan como um adulto foi uma experiência muito comovente. Minhas lembranças com a história (principalmente pelo filme de 2003) eram alegres, embora o final sempre me deixasse um pouco tristonho. Mas é que toda aquela aventura, toda aquela natureza tão lúdica, a beleza da felicidade daquelas crianças... Era tudo fascinante demais. Eu terminava sempre com um sentimento de esperança.
Tudo isso está no livro. Peter Pan é incrivelmente divertido, maluco, emocionante. A escrita de J. M. Barrie é hilária, irônica e até mesmo cínica. O narrador conversa muito conscientemente com o leitor, arranca boas risadas dos absurdos que descreve. Mesmo antes da Terra do Nunca, tudo é tão impossivelmente insano que, quando as crianças saem voando, parece até um fenômeno natural. Afinal, quem ousaria sair por uma porta para ir até a onírica terra que se molda através da imaginação das crianças?
Mas, aquele fiapinho de tristeza que eu sentia na infância, também está aqui. E ele é maior e mais tangível. Em todo o último capítulo, fiquei tão capturado pela mensagem, por essa ânsia do protagonista em não querer crescer, por esse empenho incorrigível dele por continuar com a inocência sórdida (sim, porque Peter mostra que isso é possível) da juventude... Mesmo que Peter tenha que abdicar de uma felicidade particular, ele sabe que crescer é muito mais do que ter seus membros esticados sem que você perceba, dia após dia. Crescer é virar adulto, e virar adulto é render-se à ausência da magia que apenas a infância pode conceber. Crescer é entender, e esse entendimento acaba limitando. Como uma criatura que não reconhece limites, Peter opta por tornar-se eterno ao renunciar ao mundo e ao seu funcionamento natural.
Mas eu não queria perceber tudo isso. Eu queria continuar só rindo do crocodilo que faz tic-tac e dos meninos perdidos que brincam de faz de conta. Eu não queria me reconhecer como um menino perdido que se encontrou ? e que percebeu que, nesse ponto de encontro, não há tesouro algum.
Peter Pan é uma fábula sobre ser criança. Divertida, profunda, cheia de significados, linda de se ler.