Jaqueline 11/06/2011Meu primeiro pensamento ao começar a leitura de “A Fúria dos Reis” foi “Como vou conseguir resenhar i-s-s-o?”. Avaliar este livro sem entregar grandes spoilers é uma tarefa superior a minha capacidade, admito, então aviso de antemão que se você NÃO leu o primeiro livro da saga, poderá se deparar com algumas informações sobressalentes aqui.
Segundo volume da série “As Crônicas de Gelo e Fogo”, esta obra de George R. R. Martin foi lançada no Brasil pela editora LeYa em uma edição que primeiramente deve ser elogiada por sua parte gráfica, com uma belíssima capa, e sua revisão. O trabalho muitíssimo bem feito neste sentido garante a qualidade geral do livro, que não desaponta o leitor apesar de todas as questões relacionadas a tradução do texto.
“A Fúria dos Reis” dá continuidade à história de “A Guerra dos Tronos”. Após a morte do rei Robert Baratheon, uma série de reis emerge na tentativa de dominar o Trono de Ferro, colocando Westeros sob um único domínio legítimo. O clima de instabilidade está no ar, tornando antigas rivalidades e alianças ainda mais profundas. Entre maquinações políticas, estratégias de combate e temperamentos exaltados, percebemos pela ótica de diversos narradores o que existe de mais humano em cada personagem graças à escrita envolvente e crua de George R. R. Martin. Dentre estes narradores, destaco Tyrion Lannister, o anão que agora ocupa o cargo de Mão do Rei no domínio de seu sobrinho Joffrey em Porto Real e rouba a cena com suas observações perspicazes e comentários sarcásticos.
Cada capítulo funciona exatamente como uma crônica, nos trazendo o um relato subjetivo sobre a situação de diversas regiões dos Sete Reinos. A relação política entre estas regiões e seus líderes é o que move o livro, apesar de questões como lealdade, sobrevivência e honra também pautarem a obra. Alguns tentam se impor, como a jovem Daenerys Targaryen, agora uma verdadeira Mãe de Dragões. Outros tentam se afirmar, como Robb Stark, atual Rei do Norte. Alguns tentam sobreviver em um mundo abalado por mudanças, como Arya Stark, enquanto outros deslizam por densas redes de poder e influência, como Tyrion Lannister.
Uma coisa que fica clara neste volume da série é o aumento da intensidade e da influência da magia no cotidiano das pessoas. O que parecia extinguido retorna com força total, revelando o poder das tradições. Falo aqui em “magia” não apenas em seu sentido mais sobrenatural, mas também em seu formato institucionalizado - o caso da religião. A trama que envolve Stannis Baratheon, a sacerdotisa Melisandre e o ex-contrabandista Davos é calcada nessa relação de emergência e queda, afirmação e negação de novos e antigos deuses e nas conseqüências marcantes que isso gera. Afora isso, muitos outros elementos fantásticos estão presentes no livro, gerando sentimentos que oscilam entre a ansiedade, o temor e a segurança.
“A Fúria dos Reis”, assim como seu livro predecessor, é leitura mais do que recomendada – deveria ser obrigatória! Sem delongas, destaco alguns pontos marcantes do livro:
1 - a rivalidade entre Renly Baratheon, que se autoproclama rei de Westeros, e seu irmão mais velho, Stannis Baratheon;
2 - Melisandre, a Sacerdotisa Vermelha do Senhor da Luz;
3 - o sentido da predestinação, noção que mexe com o ego dos personagens e pauta todas as ações políticas e estratégicas do livro;
4 – a questão da honra, que é ironicamente mais visível naqueles personagens de menor tamanho (Tyrion), menor influência (Jon Snow) ou donos de um caráter maculado (Davos).
George R. R. Martin não poupa descrições sangrentas de combates, assim como não tenta velar a brutalidade que as relações humanas podem atingir. O autor não poupa a vida de personagens queridos ao leitor, faz prosperar os núcleos mais corrompidos dos governos e não livra mocinhos da dor, da traição e da humilhação. Essa aparente “inversão de valores” na série funciona como um grande chamariz: diferentemente da pasmaceira que vemos (e lemos) por aí, “As Crônicas de Gelo e Fogo” se conecta com a vida real mostrando que quando grandes metas estão no alvo, a moral se prova algo totalmente maleável. Não existem bons ou maus, mas apenas jogadores tentando conquistar o que desejam. Que vença o melhor!
>> Resenha publicada em www.up-brasil.com