fernandaugusta 02/11/2022Carrie, a estranha - @sabe.aquele.livroEu ainda não conhecia o primogênito de Stephen King, lá de 1974. Gostei muito do que li, apesar de algumas miudezas estarem um pouco datadas, a história de Carrie White tem um contexto super atual: o do bullying extremo.
Carrie é uma adolescente finalista do Ensino Médio na cidadezinha de Chamberlain, Maine. O pai faleceu antes de Carrie nascer e a mãe é simplesmente a maior fanática religiosa que já vi na literatura. Não bastasse este contexto familiar único, Carrie tem o dom da telecinesia - pode movimentar objetos com o poder da mente. Rejeitada dentro de casa e atormentada fora dela, a vida de Carrie é um pesadelo. Na escola, é o alvo das piadas e das zombarias dos colegas desde que consegue se lembrar.
Até que, um dia no chuveiro da escola, Carrie fica menstruada pela primeira vez - aos 16 anos o fato incomum a levou a mais um episódio traumático com as colegas. Estando o baile de formatura próximo, várias foram punidas pela escola. As consequências destas punições foram: Carrie ser convidada a ir ao baile por sugestão de uma das meninas arrependidas, e o ódio vingativo de outra, que junto com o namorado arquiteta uma vingança. Esta vingança talvez seja uma das cenas de cinema mais conhecidas da cultura pop, e simplesmente desperta a fúria descontrolada de Carrie, que tem o poder destruidor de uma hecatombe em Chamberlain.
Eu tive dó de Carrie em toda a leitura. Já imaginou você ser aquela pessoa diferentona que ninguém quer por perto e todo mundo ri e se acha no direito de provocar e ridicularizar o tempo todo? Em nenhum lugar Carrie teve paz: em casa e na escola a coitada passava provações inomináveis. É triste demais ver o quanto uma família desestruturada, uma mãe louca e pessoas crueis podem destruir uma pessoa. Carrie não tinha saída, e fiquei reamente tocada com o único respiro de normalidade que ela teve na vida - o início do baile descrito por ela, o nervosismo e a novidade de tudo, mesclados com o medo de ser motivo de chacota mais uma vez. E não deu outra.
Gostei imensamente do ritmo que SK deu para este livro, é perfeito para ler em um dia. Ágil, com vários pontos de vista e até explicações "científicas", como se fosse uma análise documental dos eventos de Chamberlain. Achei a costura da trama muito bem feita, e apesar de ter conhecimento do enredo, a leitura foi bem surpreendente em vários pontos.
Não vejo este livro como um livro de terror assustador, com sustos e medo. Tem a tensão de saber que algo muito ruim vai acontecer, mas pra mim, o terror mesmo vem da crueldade do que fizeram com Carrie. Se pensarmos por este ponto, tem cenas aterrorizantes acontecendo em várias escolas deste mundo atualmente, não? O próprio autor, na introdução, relata que Carrie foi inspirada na história de duas colegas suas, vítimas de bullying.
Então, se somos capazes de ver o noticiário, não vamos nos assustar com "Carrie, a estranha". Curiosamente, é uma leitura muito reflexiva para um livro de terror. O primeiro de muitos acertos do mestre King.