Kamila 23/03/2017
A trama começa numa festa de aniversário que está rolando num bairro rico de Reykjavík, capital da Islândia (que me faz lembrar da Björk, rs). Até aí tudo bem, mas algumas das crianças encontram uns ossos, que depois descobriu-se que fazia parte de uma ossada humana. Esses ossos foram encontrados no "Bairro do Milênio", um canteiro de obras de uma região da cidade que está se expandindo rapidamente, graças à especulação imobiliária.
As investigações preliminares revelaram que a ossada estava lá há pouco mais (ou menos) de 70 anos, ou seja, desde o tempo da Segunda Guerra. E é aí que entra nosso protagonista, o detetive Erlendur (pra quem não gosta de nomes nórdicos, tá liberado reclamar). O policial está às voltas com um grave problema pessoal: sua filha, Eva Lind, viciada e grávida, está em coma, por causa de uma overdose. Ele e a filha não se dão bem, por causa da maldita alienação parental.
Erlendur briga com a filha, não fala com o filho e volta e meia toma uns gritos de Hálldora, sua ex-mulher. Paralelo a vida desse pobre policial, temos uma mulher. Ela vive no tempo da Segunda Guerra. É mãe solteira, com uma filha que sobreviveu a meningite infantil e ficou com uns traumas. Essa mulher - cujo nome não é revelado em grande parte da história - conheceu um cara e acabou casando com ele, assim, do nada. E passou a bater nela, dia sim e dia também. A mulher, que já era mãe da Mikelina, teve mais dois filhos desse homem, cujo nome também não é citado, mas ganhou o apelido de Grímur de um de seus filhos.
Com a ajuda de seus colegas inspetores Sigurdur Óli (que tem uma namorada que beira a ninfomania e ele não quer casar com ela) e Elínborg (que é formada em Geologia e ama romances, além de ser uma das poucas policiais na Islândia, à época que o livro foi escrito). Além de toda a merda envolvendo a filha e o caso policial, uma situação do passado está atormentando nosso Erlendur. E agora, ele precisa desvendar o que aconteceu há 70 anos, com grande probabilidade de não resultar em nada porque muitos já morreram, vai saber.
Bem, apesar de ter enjoado momentaneamente de romances policiais, eles sempre terão um cantinho no meu coração. Eu o encontrei na biblioteca que frequento, perdido na seção de... romances policiais (ah vá). Preciso dizer que comecei a ler o gênero com James Patterson e sua maravilhosa série do Alex Cross e passei a gostar de vez por causa do mito/gênio/deus/fora de série/homão da porra Stieg Larsson. Então, não tenho como não dizer que me surpreendi com a escrita do Arnaldur.
Intrinsecado e bem escrito, ao longo da trama, vários personagens entrarão ao longo da mesma, e eles nos surpreendem, pois não sabemos se têm a ver ou não com o crime. A escrita dele te prende mesmo, a ponto de você não querer parar pra nada. E ainda dá tempo de conhecer mais sobre a Islândia, que é um país minúsculo na Escandinávia, onde, no verão, não existe noite e sua população total é de cerca 300 mil pessoas - e o presidente gostaria de poder proibir por lei o abacaxi na pizza.
Com uma premissa original e autêntica, Indridason colocou a Islândia no topo, pois, com este livro, ele ganhou diversos prêmios, merecidos, graças a sua habilidade em fazer com que um investigador tenha que driblar sentimentos pessoais, ao mesmo tempo que tem uma dívida pendente com sua família e saber de quem diabos é a bendita ossada, além de sofrer com a mulher vítima da violência doméstica - uma triste realidade. É narrado em terceira pessoa, sob os pontos de vista de Erlendur e da mulher.
No começo do livro, tem um mapa que mostra a Islândia e outro que mostra a parte da cidade em que a ossada foi encontrada. E eu esqueci de tirar foto, mas garanto a vocês que o mapa do país cabe em uma folha. Sério. Pior que os nomes dos personagens são os nomes dos locais. Perceberam que só escrevi Reykjavík e Bairro do Milênio? Pois é, mesmo com o esforço hercúleo da editora em acentuar as palavras e facilitar a pronúncia, não dá, tentar pronunciar todos esses nomes dá um nó no cérebro.
Uma excelente edição da Companhia, sem erros de nenhuma ordem e o único ponto negativo é que não há travessões nas falas, e sim aspas, no modo americano (ou francês?). Não o façam, por favor, é chato de acompanhar a leitura. Mas isso não é motivo pra desistir da obra, até porque o final te deixa com uma cara de "como assim, Brasil?". Aliás, pesquisando aqui, descobri que O Silêncio do Túmulo é o quarto livro da série do detetive Erlendur (o primeiro é o A Cidade dos Vidros, publicado pela Record), que já fazia sucesso fora da Escandinávia no fim dos anos 90 (muito antes de Millennium).
O que é surpreendente vindo de Arnaldur é que a Islândia é um país com baixíssima taxa de homicídios, então, haja criatividade pra inventar crimes! Aproveitem que esse simpático autor passou a morar no meu coração e confere essa entrevista aqui que ele deu pro site d'O Globo, em 2011, mas que é bem legal. Só tomem cuidado com os spoilers, rs.
site: http://resenhaeoutrascoisas.blogspot.com.br/2017/03/resenha-o-silencio-do-tumulo.html#comment-form