Danielle 08/12/2011
Monsieur Pain
Então li Monsieur Pain [Cia. das Letras, 2011], um dos primeiros romances de Bolaño que só se dedicou a eles para começar a ganhar dinheiro, já que, até então, escrevia apenas poesias (Roberto tem alma de poeta) (poesias não dão dinheiro).
Pain é um francês que vive na Europa entre-guerras e se dedica às ciências ocultas, principalmente, o mesmerismo. Na história que Roberto desenvolve, o leitor encontra um universo fantástico onde não se sabe onde começa a realidade e termina o onírico (Pain sem rumo pelas ruas de Paris, os espanhóis nas escadas, o mulçumano no caberet). Além disso, Bolaño mistura figuras reais no meio desse louco ambiente que constrói, como por exemplo, Cesar Vallejo, o poeta espanhol.
Enquanto lia Monsieur Pain me lembrei, em algumas passagens, do sufocamento que senti com O Processo, de Kafka. Da espiral sem fim de Crime e Castigo, que é o mesmo que dizer que não é um livro fácil (tô começando a achar que nenhum livro de Bolaño é).
É um livro cheio de referências também, como no caso do já citado poeta espanhol e de um conto de Edgar Allan Poe (Revelação Mesmérica) que abre o romance. E vai além: porque assim como vi Kafka e Dostoiévski, outros enxergam Borges e Cortázar nas ruas estreiras, becos escuros e corredores labirínticos pelos quais o autor coloca seu personagem.
Monsieur Pain, portanto, é o típico livro que funciona sozinho, mas funciona bem melhor se você souber as fontes das quais Roberto bebeu. Mesmo assim é um livro que recomendo, não para começar a conhecer os textos desse excelente escritor, mas sim, se você quiser se aprofundar em suas obras.
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" Embora não o visse, sabia que estava ali. Ouvia seu soluço. Com toda clareza. Espasmódico, incômodo.
- Vallejo? – Meu balbucio morreu quase sem sair dos lábios.
Não houve resposta.
A sombra voltou a soluçar e compreendi, como se enfiasse a cabeça num redemoinho, que aquele som não era natural, mas simulado, que ali havia alguém finjindo o soluço de Vallejo. Mas por quê? Para me assustar? Para me avisar? Para zombar de mim? Só por um insondável senso de humor e de ignomínia?
Ele avança, pensei, avança em minha direção.
Ignoro quanto tempo esperei. "
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Resenha originalmente publicada em: seusuperego.wordpress.com