Jonas Migotto 21/06/2022
Walter Benjamin alertou que nem os mortos estarão seguros diante do inimigo, se ele for vitorioso. E o inimigo não tem cessado de vencer. Cabe a nós a tarefa de não esquecer. De lembrar. Rememorar. Bernardo Kucinski batalha pela memória da irmã, que 'foi desaparecida' pela ditadura civil-militar. Não deixa que a apaguem. Mais do que isso, batalha pela memória de seu pai, incansável, esgotado, marcado por traumas. Um pai desesperado, lutando com uma brutal assimetria de forças contra um sistema, contra uma muralha gigante de segredos, uma muralha intransponível, em busca da verdade. Não há para quem pedir socorro. É vítima da tortura psicológica, da incerteza, da esperança que morre todos os dias. Kucinski escancara a violência sistemática, a perversidade dos agentes da ditadura, com cenas vívidas, com uma pluralidade de estilos ao longo do romance, e grita aos saudosistas do período que as vítimas jamais serão esquecidas. No país que insiste em idolatrar torturadores e homenagear ditadores, que insiste em esquecer, K. tem a incômoda missão de lembrar, para que não se repita.