Craotchky 31/07/2018Eu, Verissimo e o zoon politikon🎵
"Toda forma de poder
É uma forma de morrer por nada
Toda forma de conduta
Se transforma numa luta armada
A história se repete
Mas a força deixa a estória mal contada..."
Trecho de Toda forma de poder - Engenheiros do Hawaii
Publicado em 1965, O senhor Embaixador é um livro no qual Erico Verissimo, já contando 60 outonos, explora questões sociopolíticas, envolvendo sua discussão nos véus suavizantes do romance. Talvez aqui esteja a maturidade do debate sociopolítico (tratado também em Incidente em Antares e O Prisioneiro) do escritor gaúcho.
O autor formula um país fictício chamado Sacramento, localizado no Caribe. Este país é o ponto central ao redor do qual irá girar a história. Erico constrói para Sacramento todo um passado de sucessivos governos corruptos que invariavelmente praticam gestões repressivas, autoritárias, totalitárias, controladoras, tirânicas, ditatoriais. O resultado é que
"As massas, essas vivem intimidadas, embrutecidas pela miséria e pela ignorância, na mais pavorosa das alienações imagináveis."
Constantes revoluções marcam a história do fictício país caribenho. Revolução após revolução (todas ao custo de muito derramamento de sangue e incontáveis perdas de vidas humanas) regimes governamentais se sucedem, mas a história se repete. Um governo ditador é deposto e os revolucionários assumem assegurando a instauração dum governo democrático que promete justiça social, fim das desigualdades socioeconômicas, liberdade de expressão... em suma, prometem governar para o povo.
Erico, porém, mostra ao leitor como o Poder é capaz de corromper o homem, desumanizar as causas mais nobres e deturpar as intenções revolucionárias, visto que o novo governo acaba repetindo, replicando os erros do governo anterior. Qualquer semelhança com exemplos históricos não é mera coincidência. Claro está que Sacramento é a "caricaturização" de qualquer país do mundo (sobretudo alguns países latino-americanos do período) e, porque não, países atuais, onde um governo sucede outro com promessas discursivas de melhorias que jamais se concretizam.
Os personagens são muitos e neles Erico dedica suas habilidades antropológicas ao retratar a natureza humana e suas imperfeições em meio as diversas complexidades da vida. Além disso, a personalidade de cada um é detalhada e possui profundidade. A narração é excelente e, como de praxe em livros do autor, não faltam diálogos inteligentes escritos com extrema perícia.
O livro é bem mais do que deixei transparecer, eu apenas trouxe o que achei mais interessante; há muitas outras dimensões nesta história. Erico tece suas fortes críticas e traz muitas reflexões profundas ao leitor. O livro é excelente, muito melhor do que eu imaginava.