Taverneiro 23/05/2017Um Livro Incrivelmente Divertido! A história desse livro é sobre Charlie Nancy, popularmente conhecido como Fat Charlie. Embora não fosse mais gordinho, ele havia sido na infância e acabou ganhando esse apelido do próprio pai, Sr. Nancy. Por algum motivo, toda vez que o pai dava nome a alguma coisa aquilo grudava e aí não tinha mais jeito, era só aceitar e conviver com esse nome para sempre.
Fat Charlie tinha uma noiva e um emprego seguro em uma agência de contabilidade, ou seja, a vida que todo mundo sonha (pelo menos no que Fat Charlie pensava). Ao convidar o pai para o seu casamento, muito contragosto, diga-se de passagem, ele acaba tendo uma notícia que iria bagunçar sua vida dali para frente: O seu pai, o velho senhor Nancy, havia falecido.
Já falei pra vocês sobre o velho Nancy? Ele era um homem animado, simpático e festeiro. Parecia sempre carregar uma aura de alegria e todos gostavam de sua jovialidade. Todos, exceto Fat Charlie.
A personalidade extrovertida de seu pai nunca bateu muito bem com a do pobre garoto gorducho, sabe?! Fat Charlie gostava de ficar na sua e, literalmente, passava mal se tivesse que falar em público. Além disso, o Sr. Nancy era um homem muito brincalhão e gostava de pregar peças, que as vezes tinham o jovem rechonchudo como alvo (eu já falei que uma vez o pai dele o fez acreditar que todo mundo ia vestido de algum presidente antigo para a escola no dia dos presidentes, e Fat Charlie foi fantasiado, de peruca e tudo, e obviamente foi muito zoado por isso?! =/ Essa é só uma das muitas pegadinhas…). Isso não ajudava nem um pouco a personalidade reprimida de Fat Charlie, e muito menos a relação pai e filho.
Após o enterro do seu pai acabam lhe revelando uma pequena informação sobre o seu passado, uma bobeira que alguém deve ter esquecido de falar para ele antes: O senhor Nancy era um deus. Mais especificamente ele era Anansi, o deus-aranha, que possuía todas as histórias. E, além disso, (como se não fosse o bastante!) ele também tinha um irmão que ficou com toda a parte “divina” do pai e, caso quisesse encontrá-lo, bastaria apenas falar com uma aranha.
Obviamente isso não passava de uma loucura de uma velha caduca, pensou Fat Charlie, mas mesmo assim, em uma noite (depois algum consumo excessivo de vinho, devo acrescentar) ele acabou falando com uma aranha as notícias da morte de seu pai e pediu para seu irmão passar para dar um alô.
E ele veio. E fez muito mais com a vida de Fat Charlie do que só dar um “alô”.
Esse livro é basicamente a história de dois irmãos, Fat Charlie acomodado em sua vida (um cara meio chato, pra falar a verdade) e Spider, um semideus festeiro (até demais!). Quando a vida parada de um encontra a vida extremamente agitada do outro, nenhuma das duas consegue voltar ao normal. E tudo isso com muito do bom humor britânico. 😄
Para um leitor mais incauto, esse livro pode ser associado a Deuses Americanos, já que ambos os livros compartilham o personagem Anansi, mas a semelhança não vai muito além disso. Ele não explora mais nenhum ponto do mundo de divindades personificadas, em vez disso cria uma mitologia própria baseada em mitos com animais no estilo fábula. Até mesmo a escrita é diferente, sendo muito mais fluida e bem-humorada aqui. E o principal desse livro mesmo é uma história entre irmãos.
Os protagonistas são muito bem acertados. Fat Charlie em um primeiro momento parecia ser um homem satisfeito com sua vida, mas que vamos aos poucos vendo que ele era uma pessoa que reprimia todas as suas vontades reais por medo. E temos Spider, festeiro e alegre, também parecia estar muito satisfeito com sua vida, mas que na verdade era uma pessoa muito superficial e solitária. Os dois irmãos chegam nas suas catarses quando tem contato com o “mundo” do outro, tanto no nível humano quanto no nível divino. Eles chegam a conclusão que não estão realmente completos tendo contato com o mundo do outro. É nessa relação que podemos ver a escrita em várias camadas tão característica do Gaiman.
Eu falei na resenha de Deuses Americanos da pegada contador de história do Neil Gaiman, aonde o narrador parece ser um homem contando uma lenda antiga sentado em volta de uma fogueira sobre um céu estrelado, e nesse livro ele usa esse narrador de maneira excelente. Creio que pelo uso do bom humor, eu achei essa história do Gaiman a mais gostosa e divertida de se ler.
“Histórias são como aranhas, com aquelas pernas compridas. E histórias também são como teias, coisas em que os homens acabam se embolando, mas que parecem lindas quando as vemos sobre uma folha cobertas pelo orvalho da manhã, além de terem a mesma forma elegante de se conectarem umas com as outras, todas juntas. ”
Mas esse não é um livro perfeito, e o principal problema nele foi o excesso de subdivisões na Trama. O livro começa com um problema e em algum ponto esse problema é resolvido e começa outro. Obviamente todos interligados e em uma crescente complicação, mas ainda assim a sensação é de que exageraram no número de pontas a serem amarradas, e acabou ficando longo demais por causa disso. Um exemplo disso é que o vilão do clímax aparece só depois da metade do livro dificultando o impacto da resolução do problema. Isso não tira o brilho do livro, mas creio que umas páginas a menos fariam um bem a trama dos dois irmãos Nancy.
Enfim, esse livro é divertido pra caramba (me fez gargalhar várias vezes no ônibus cheio), é muito gostoso de se ler e tem uma trama família muito “aconchegante”. É um livro despretensioso em suas ambições e eficiente na sua execução, e um dos que eu mais senti prazer em ler do autor. Para os fãs e não fãs do Gaiman, eu recomendo muito esse livro. Vocês vão ter muitas horas de diversão. ^^
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