_biel 01/04/2020
O que é Sherlock?
Poderia começar esta resenha de diversas formas, mas opto por fazê-lo dando ao leitor um resumo de sua essência e atalho ao final dela: Sir Arthur Conan Doyle é um dos maiores escritores de todos os tempos. Ao leitor mais apressado, que se encerre aqui esse monólogo, ao mais curioso, que leia com o coração e mente abertos a explicação da afirmação que acabara de fazer.
Antes, porém, gostaria de explicar o que é Memórias de Sherlock Holmes. Sendo o quarto título da série do detetive mais famoso de todos os tempos, o livro é em si tão bom quanto os outros três, carregando consigo a mesma premissa do seu antecessor: apresentar, a partir da visão de John Watson, os casos mais importantes, até o momento, desse grande agente da lei. Apesar dos contos serem mais curtos do que os do título anterior, As Aventuras de Sherlock Holmes, a obra conserva o mesmo tom arguto e dramático que tão bem elevaram o nome de Conan Doyle aos mais altos escalões da crítica. É necessário, contudo, destacar dois pontos. O primeiro, e mais trivial, é a grande presença de casos em que o bandido não fora agarrado. Isso não se mostra um defeito, visto que, em tais casos, Sherlock Holmes consegue utilizar de seus fascinantes métodos para escrutinar tudo o que envolve o problema e trazer à luz todos os passos do criminoso. Em minha opinião, Conan Doyle permitiu que, em alguns casos, Holmes não prendesse a quem perturbava a ordem para que pudesse provar ao grande público que, apesar de não parecer, o detetive conserva em si humanidade, e com isso, a limitação a qual todo homem é fadado a carregar. O segundo ponto que gostaria de ressaltar é a presença de dois contos os quais são narrados por Holmes. Mas não se anime tanto, caro leitor; ao passar a diante os detalhes de tais histórias, é a Watson a quem Holmes se dirige, e não diretamente ao leitor. Se julgou a minha última afirmação banal, não o culpo. Mas, para mim, seria extremamente prazeroso ler algo o qual Holmes se dispusesse a escrever diretamente ao público, pois tenho certeza de que o relato poderia carregar algo de novo em seu conteúdo, e certamente teríamos algumas pinceladas da opinião de Holmes quanto a grande massa de pessoas que com tamanho ardor o acompanhava.
Agora que já apresentei a minha análise do livro, gostaria de explicar a minha primeira afirmação. É de se notar que Conan Doyle foi extremamente eficaz ao construir um personagem maior que o seu escritor, algo que acredito ser excepcional. Vá, não serei injusto com outros grandes escritores; é igualmente belo ver um autor do mesmo tamanho de sua obra, pois nos mostra que este deu à luz a uma série de trabalhos magníficos, que juntos constroem o seu nome e legado. Mas quando encontramos um trabalho que tomou voos mais altos que os do seu autor, encontramos ali um tesouro inescrutável, e é esta a relação de Sherlock Holmes e Conan Doyle. Para mim, Sherlock Holmes carrega consigo o título de maior e mais inteligente personagem da ficção. A sua forma metódica de agir, o seu apreço pela arte, as suas opiniões objetivas e invariáveis, a forma apaziguadora de sua figura e a placidez com que encara situações extremas dão a ele um caráter magnífico, digno dos mais detalhados estudos. A forma como os problemas deixam o leitor sem chão e a maneira como Holmes, com espetacular polidez, mostra que toda a solução estava bem debaixo do seu nariz, sem antes de maneira nenhuma ter suspeitado – e sem ele jamais o teria feito – extasia e maravilha a todo que o contempla.
É difícil não se apaixonar pela figura desse detetive após quatro livros já lidos. Conan Doyle ficará marcado por toda a história pela sua obra, e jamais morrerá, pois um homem só morre quando a sua memória cai no esquecimento, e, se depender desse modesto resenhista, a sua memória terá ainda alguns anos de subsistência, até que, assim como Arthur, venha deitar-me pela última vez, e dormir o sono da eternidade.