Memórias do cárcere

Memórias do cárcere Graciliano Ramos




Resenhas - Memórias do Cárcere


47 encontrados | exibindo 16 a 31
1 | 2 | 3 | 4


Ed Carvalho 28/11/2021

Uma das melhores leituras da minha vida
"A culpa é desses cavalos que mandam para aqui gente que sabe escrever" disse o infeliz diretor da colônia correcional ao ouvir de Graciliano Ramos que este viria escrever sua estadia na cadeia. É incrível como da desgraça e miséria de um homem surgiu uma obra tão sem igual, eloquente, bem escrita e interessante quanto esta. A forma como Ramos observava e escrevia sobre seu infortúnio e sobre esta tristes manchas da história nacional que foram os períodos autoritários é de mudar a vida das pessoas. A minha ao menos mudou.
comentários(0)comente



Ed Carvalho 07/10/2021

Que livro!!!
Eu já não sou mais a mesma pessoa após ler Memórias do Cárcere, de Graciliano Ramos. Encantei-me com o relato da confusa e injusta prisão, sem julgamentos e sem justificativas, no sistema que ele denominou de "pequeno fascismo tupiniquim". Em momento algum monótono ou maçante, o autor floreia com mesóclises e eloquência os relatos de convívio com diversas personalidades contrastantes, em porões imundos, sob condições desumanas e autoritarismo sem sentido. Abordando temáticas ora sutis ora polêmicas, como racismo, homossexualidade e politicagem, Ramos descreve de modo loquaz e magníloquo um dos muitos momentos absurdos de nossa história, desmascarando de certa forma o mito popular do governo Vargas. Achei um dos melhores livros da literatura nacional dos que já li e olha que ainda nem iniciei o volume 2.
comentários(0)comente



Karinny 18/05/2021

Já imaginava me deparar com um livro duro. Graciliano não gostava de desperdiçar palavras, e se ele escreveu estas mais de 600 páginas, é porque tinha algo importante a colocar para fora. Impossível sair desta leitura sem reflexões profundas sobre a condição humana, principalmente quando a própria humanidade é colocada à prova, na ausência das condições mais básicas à preservação da dignidade.
comentários(0)comente



Guilherme 14/10/2020

Recomendadíssimo
Muitos motivos para recomendar esse livro:
1) O modo como Graciliano enxerga e conta os acontecimentos é o diferencial.
2) Quem está estudando português (por qualquer motivo que seja) vai encontrar aqui uma aula de como escrever bem, além de aprender várias palavras pouco conhecidas do cotidiano.
3) O livro é grande mas os capítulos curtos o torna ótimo pra quem quer iniciar ou reiniciar o gosto pela leitura diária.
comentários(0)comente



Locimar 05/09/2020

Li esta edição. Depois de "Vidas Secas" fiquei marcado profundamente por Ramos.
comentários(0)comente



Fabio Shiva 20/08/2020

“O mundo se tornava fascista. Num mundo assim, que futuro nos reservariam?”
“Memórias do Cárcere” é um livro autobiográfico, que relata os dez meses que o autor passou como prisioneiro político em 1936, durante as agitações que antecederam a ditadura de Getúlio Vargas, que foi de 1937 a 1945. Quando lemos essa obra magnífica em meio ao turbilhão político e ideológico em que vivemos atualmente, o que primeiro salta aos olhos é o quanto o fascismo tem história no Brasil, a ponto de poder ser considerado uma verdadeira tradição brasileira. Muitas das pavorosas cenas descritas no livro, para meu grande espanto, poderiam estar acontecendo nos dias de hoje. Por esse motivo, boa parte da leitura foi destinada a reflexões sobre o que é o fascismo e sobre o porquê do fascismo ser tão atrativo para nós, brasileiros.

A palavra “fascismo” deriva do italiano “fascio”, que significa “feixe de varas”. A ideia básica por trás desse nome é a de que uma única vara ou graveto pode ser facilmente quebrada, mas um feixe de varas torna-se difícil de quebrar. Notem como essa ideia, em si, traduz algo não somente verdadeiro, como belo também: “a união faz a força”.

O problema só começa quando o fascismo substitui a palavra “união” pela palavra “maioria”, afirmando que a maioria é soberana e que as minorias devem se curvar à vontade da maioria. À primeira vista, essa parece ser uma ideia perfeitamente lógica e até justa. Só que o passo seguinte e imediato do fascismo é utilizar a força do feixe para quebrar os gravetos isolados. Ou seja: utilizar a força da maioria para fazer calar e até destruir as minorias. E aí é que nós percebemos o poder das palavras que expressam as ideias, e como uma sutil troca de palavras pode se tornar extremamente perigosa.

Pois o fascismo começa afirmando que a união é boa. Ninguém tem como discordar dessa afirmação. Mas daí vem o fascismo e diz que a união da maioria é boa. E antes que tenhamos tempo de decidir se essa afirmação é válida, o fascismo já está dizendo que a maioria é boa, e logo em seguida que só a maioria é boa. E assim, em um piscar de olhos, o fascismo já está usando a força da maioria para perseguir as minorias. Notem que o que começou afirmando a força da união rapidamente se torna um poder destrutivo, que provoca o ódio e, justamente, a desunião.

Sabem uma imagem que representa o fascismo melhor que a do feixe de varas? É a de um valentão truculento e autoritário, que quer resolver qualquer diferença de opinião com a força dos músculos, na porrada. Essa imagem do valentão nos ajuda a entender que o fascismo não trata de união, nem sequer de maioria, mas única e exclusivamente de força. O fascismo, em resumo, é o culto à lei do mais forte.

E aqui eu evoco a sabedoria de meu mestre de capoeira, Mestre Tyko Kamaleão, quando ele fala do “pseudo-valentão”:

“O pseudo-valentão é aquele que se coloca como um homem valente, mas que deixa ver, escondida por debaixo da casca do personagem, uma criança medrosa, pedindo proteção e carinho.” (Mestre Tyko Kamaleão)

Todo fascista é um pseudo-valentão. Não é uma pessoa forte, mas alguém que se finge de forte, porque no fundo sente muito medo. E quem tem medo, agride o outro. Mas o que é que, afinal, assusta tanto o fascista? É justamente a diferença. O fascista percebe a diferença como uma ameaça direta à sua existência. Pois ele tem medo que, no fundo, o diferente seja melhor do que ele. O ódio do fascismo à diversidade é mais facilmente explicável quando substituímos a frase “não pode haver ninguém diferente de nós” por “não deve haver ninguém melhor do que nós”. Esse é o medo por trás da violência fascista.

Como toda minoria nada mais é que um grupo de pessoas que age ou pensa de forma diferente da maioria, o fascismo acaba se tornando uma máquina inventada para perseguir as minorias, em nome de um complexo de inferioridade de uma maioria medíocre. É esse um retrato do Brasil de Graciliano Ramos que, infelizmente, ainda reflete boa parte do Brasil de hoje.

“Memórias do Cárcere”, publicado em 1953, como obra póstuma, e logo se tornou o maior sucesso de vendas do autor. Em 1984 a obra foi transformada em um filme dirigido por Nelson Pereira dos Santos (https://youtu.be/p0Gy67_6kJc).

A primeira vez que li esse livro, aos 14 anos, me marcou profundamente. E só 30 anos depois, ao reler essas “Memórias”, foi que tive a verdadeira dimensão do impacto provocado em mim pela força da personalidade e da prosa de Graciliano Ramos. Pois só então percebi o quanto o homem e o escritor que sou inconscientemente se espelharam na severa figura parental projetada pelo “velho Graça”: o que será que ele diria de meus escritos?

https://comunidaderesenhasliterarias.blogspot.com/2020/08/memorias-do-carcere-graciliano-ramos.html


“Realmente a desgraça nos ensina muito: sem ela, eu continuaria a julgar a humanidade incapaz de verdadeira nobreza.”

“Nunca eu me vira sem ocupação: enxergava na preguiça uma espécie de furto.”

“O mundo se tornava fascista. Num mundo assim, que futuro nos reservariam?”

“Por que desprezá-los ou condená-los? Existem – e é o suficiente para serem aceitos.” (sobre os homossexuais)

“Vemos um sujeito sem as unhas dos pés, sabemos que elas foram arrancadas a torquês, e a nossa curiosidade não vai além; os sofrimentos findaram, as unhas renascerão, a memória da vítima se embotou; horrível é imaginarmos a redução de uma criatura com tenazes quando pensamos nela, exatamente quando pensamos nela.”

“Não nos revolta a safadeza, revolta-nos a estupudez.”

“Todos em roda estavam assim, firmes, de braços cruzados, impassíveis. Nenhum sinal de protesto, ao menos de compaixão. Também me comportara com essa horrível indiferença, como se assistisse a uma cena comum. Éramos frangalhos; éramos fontes secas; éramos desgraçados egoísmos cheios de pavor. Tinham-nos reduzido a isso.”

“Vocês não vêm corrigir-se, estão ouvindo? Não vêm corrigir-se: vêm morrer.” (fala de um dos guardas da colônia correcional)

“Ali no canto da sala enorme, à direita, os nossos receios se limitavam: desapareceríamos daquele jeito, iguais ao Neves, a Domício Fernandes, ao negro ansioso que pedia uma injeção de morfina. Essa perspectiva de nenhum modo era desagradável; tínhamos imaginado torturas, a chama do maçarico devastando carnes, e o consumo lento, a inanição, quase nos surgia como favor.”

“José Lins é memorialista, o grande mérito dele é haver exposto, nua e bárbara, a vida nos engenhos de açúcar; é uma enorme força que se esvai fora de seu âmbito.” (sobre José Lins do Rego)

“A imaginação de Jorge os encantava, imaginação viva, tão forte que ele supõe falar a verdade ao narrar-nos existências românticas nos saveiros, nos cais, nas fazendas de cacau.” (sobre Jorge Amado)

“Era coisa prevista, imaginada sempre, mas o jeito de fazer o enterro, a mudança de uma criatura humana em pacote jogado fora sem quebra da rotina, expôs-me com horrível clareza à insignificância das nossas vidas.”

“O Governo se corrompera em demasia; para aguentar-se, precisava simular conjuras, grandes perigos, salvar o país enchendo as cadeias.”

“O temor às vezes nos leva a temeridades, empresta às nossas ações aparência falsa de coragem.”

“Impossível conceber o sofrimento alheio se não sofremos.”

“A perspectiva de liberdade assustava-me. Em que iria ocupar-me? Era absurdo confessar o desejo de permanecer ali, ocioso, inútil, com receio de andar nas ruas, tentar viver, responsabilizar-me por qualquer serviço.”

“Apareciam-me de longe divergências em esboço, e éramos forçados a reconhecer que ninguém tinha culpa. Estávamos feitos daquele jeito, cada um de nós estava feito de certo modo – e em vão tentávamos explicar uns aos outros que a leitura de um artigo não nos transformava.”



site: https://www.facebook.com/sincronicidio
Elyene 21/08/2020minha estante
Uma aula em forma de resenha ?? Colocar na lista pra ler!


Fabio Shiva 21/08/2020minha estante
Oi, Elyene! Gratidão por seu comentário e por essa energia boa! Leia sim, que é uma obra-prima de nossa Literatura!


Wallace 16/11/2021minha estante
Bastante interessante o seu comentário. O mais interessante nesse tema do fascismo brasileiro é como um presidente ditatorial é visto como modelo de presidencialismo pelo ex-presidente da república Lula e tantos outros políticos da esquerda brasileira, como Ciro Gomes, por exemplo. A esquerda, em geral, ama o Getúlio. É algo para ser estudado com cuidado.

Termino esse post com um trecho do do Diário Completo do grande escrito Lúcio Cardoso:

"Leitura: Memórias do Cárcere de Graciliano Ramos. Não posso, não tenho forças para gostar de livros assim -a modéstia do autor é falsa e o que ele viu e aprendeu durante o período de sua prisão, restrito e superficial. Não há uma visão inteira do homem, mas de seu lado mais imediato- é uma projeção física e não interna. Espanta-me que se possa comparar este livro com A Casa dos Mortos de Dostoiévski. A diferença é fundamental: um é o ponto de partida em que um escritor acha o Cristo e descobre o homem em sua profundidade - o outro é o ponto de chegada de um autor visceralmente materialista."


Cristiane ð 21/06/2022minha estante
A ilha grande me fez querer ler é essa resenha me convenceu! ???


moraes_psi 30/01/2024minha estante
Achei boa a colocação do Fábio, mas também excelente o complemento da colocação do colega Wallace (aqui dos comentários).
Eu gosto do Graciliano e respeito muito as dores em que passou descritas e mesmo seu posicionamento. Mas ele, ainda em vida, assistiu os horrores da esquerda em países do Leste Europeu e teve tempo suficiente pra encontrar lá também o totalitarismo extremamente violento do qual narrou. Vindo de grupos que depois foram base pra criação do Partido dos Trabalhadores e do comunismo de Cuba. É preciso separar o artista de seu posicionamento, mas pra mim é mais difícil quando há uma clara hipocrisia. É diferente de quem não viu onde sua ideologia chegou, como os autores do socialismo frances do século XIX.

E isso tudo é diferente de posição e polarização, são fatos e sensatez, principalmente se vier de nós, uma geração que viu os Muros de Berlim cairem e mesmo assim vão lá e colocam no poder partidos cúmplices. Graciliano Ramos era um excelente escritor da nossa literatura, pena que faltou sensibilidade em sua posição política. Mas não tiro seu sifromento, já que Getúlio se aproveitou da Guerra Fria para promover sua sede de poder.
Que Deus tenha piedade de nós.




Margô 16/07/2020

Graciliano escreve com perfeição invejável. É o primeiro ponto favorável. A obra remete a sua vida pública, como prefeito de uma pequena cidade , no estado de Alagoas, à prisão do escritor no período da Ditadura do Estado Novo, onde ele relata o cotidiano na prisão, ( na ilha de Fernando de Noronha) e o encontro com outras pessoas notórias da época. É bem curioso o dia a dia dos presos políticos, além de se conhecer a conjuntura política do país. É uma obra pra quem gosta de História.
comentários(0)comente



Nélio 26/04/2020

“O mundo se tornava fascista. Num mundo assim, que futuro nos reservariam? Provavelmente não havia lugar para nós, éramos fantasmas, rolaríamos de cárcere em cárcere, findaríamos num campo de concentração. Nenhuma utilidade representávamos na ordem nova. Se nos largassem, vagaríamos tristes, inofensivos e desocupados, farrapos vivos, fantasmas prematuros; desejaríamos enlouquecer, recolhermo-nos ao hospício ou ter coragem de amarrar uma corda ao pescoço e dar o mergulho decisivo. Essas ideias, repetidas, vexavam-me; tanto me embrenhara nelas que me sentia inteiramente perdido.”

“Memórias do Cárcere”, de Graciliano Ramos, não foi um livro de leitura fácil, mas agradou, além de ser uma etapa cumprida dos meus planos, claro! Há passagens que nos levam a dúvidas se faltaram revisões ou se eram para ficar assim... Até poderia ser feita uma outra leitura em grupo, quem sabe... Como o autor foi-se antes de terminar a escrita dele – e, provavelmente, uma última revisão -, só nos resta aproveitar o que está aí.
Enquanto relato da sua vida nas prisões durante o Estado Novo, a obra nos deixa impressões terríveis de como é viver algo desse tipo em “ásperos tempos”, para parafrasear com um título de uma trilogia de livros de Jorge Amado sobre a mesma época histórica. Fome, doenças, condições insalubres e tantos outros tipos de sofrimentos sobram ao longo do longo livro.
“Quem dormiu no chão deve lembra-se disto, impor-se disciplina, sentar-se em cadeiras duras, escrever em tábuas estreitas. Escreverá talvez asperezas, mas é delas que a vida é feita: inútil negá-las, contorná-las, envolvê-las em gaze.“

Se tomamos o livro pela sua estética literária, notamos um narrador em crises – inclusive sobre sua capacidade de escritor. O livro vai além de narrar como foi a vida de quem foi preso e ficou vagando pelas cadeias sem nem mesmo merecer uma acusação ou um julgamento. Ele viveu uma condenação, e pronto. Entretanto, Graciliano se revela, se mostra em suas durezas de viver, em suas dificuldades no relacionamento com a mulher, suas incertezas e em seus temores. Nem seus filhos lhe são motivos para se pensar coisas boas... Sua literatura nascente ainda lhe causa desconfiança. E ele vai espezinhando isso até depois que seu livro “Angústia” sai pulicado e começa a fazer sucesso com ele ainda na cadeia. Nada o demove de seu pessimismo pessoal. Angústia foi escrito antes da prisão, mas o título dele é o tom que ele escolhe para seu relato escrito bem depois de sua saída da cadeia (“Resolvo-me a contar, de pois de muita hesitação, casos passados há dez anos) e só publicado depois de sua morte, em 1953.
“Era disparate desejar permanecer nela, mas assaltava-me uma grande covardia, o receio de voltar a assumir responsabilidades, a certeza de que o meu trabalho de indivíduo solitário, na ditadura mal disfarçada por um congresso de sabujos, seria pouco mais ou menos inútil. Preferível o cativeiro manifesto ao outro, simulado, que nos ofereciam lá fora. “

Um fato que foge ao tom do livro, mas que é rico, é a percepção dele das diferentes formas de falar. Ele ficava muito incomodado quando ouvia um uso de pronomes fora da norma culta. Os diferentes portugueses que falamos no nosso grande país chamava sua atenção a ponto de ele não perder esses “detalhes” de vista.
Realmente, não foi uma leitura agradável, prazerosa como a leitura de sua obra prima - para mim, pelo menos – “Vidas Secas”; mas é um livro forte que todos que reconhecem o valor da literatura na nossa formação pessoal devem ler, em algum momento da vida.
comentários(0)comente



ELIZ 09/01/2020

Muito denso e que te faz sentir náuseas.
As memórias nem sempre são felizes, mas saber contá-las é um talento para poucos. Você sente cada linha escrita dentro de vc, mistura de angústia, revolta, o ser humano esvair de sua dignidade, ter vergonha de si. Impossível não entrar na história.
comentários(0)comente



spoiler visualizar
Ninguem 25/11/2019minha estante
Tem algumas personagens e casos que serviram de fonte para os contos da coletânea "Insônia". É interessante pra ver o processo que o Graça faz na captura do real na ficção.




Túlio Demian 21/10/2019

Nota de leitura de Memória do Cárcere
Nessas memórias de Graciliano Ramos podemos observar além de seu distanciamento plausível para a confecção menos apaixonada e mais racional, uma despreocupação com os modelos literários em voga na época. Auge do modernismo brasileiro, Graciliano está mais preocupado com o conteúdo de sua obra e com a sua identificação com os registros propostos do que necessariamente agradar aos interesses de uma estética comprometida com os movimentos artísticos de um período histórico.
Memórias do Cárcere é também, dentro dos preceitos defendidos por Lukács, um romance histórico de natureza documental, que imprime ao protagonista, a obrigação de observar e transformar o seu espaço. O herói, que por um longo período se mostra desconhecer as causas pelas quais fora preso, por diversos momentos, observando outros companheiros de confinamento, analisa sua própria capacidade revolucionária e passa a auto-avaliar suas atitudes que sequer são dignas de um prisioneiro político, no sentido de que, ele jamais tivera, verdadeiramente, uma atitude revolucionária. Estes questionamentos nos encaminham para os valores do narrador que jamais foram externados na prática.
A força da introspecção de Memórias do Cárcere está em criar um universo de conflito para as discussões que o universo exterior não poderia saber. Tanto pelo poder opositor do Estado Novo, do qual era acusado de subversão, e pelos próprios princípios do grupo de comunistas (Primeiras manifestações) o qual era acusado de pertencer. Aqui, nesses espaços de conflito e criação é que se estabelecem as diretrizes para o que viria a ser a mais brilhante obra memorialística que temos registro em nossa língua.
Na introspecção registrada nos manuscritos do cárcere e/ou ainda aquela que fora produzida anos depois, quando de seu preparo para o projeto do livro, o autor nos presentei com uma ficção baseada em registros memorialísticos de forte impacto catártico que não nos permite questionar o teor jornalístico de suas observações.
Essas marcas ficcionais podem ser observadas na onisciência do narrador quando mergulhado nas preocupações de personagens alheios, como se uma percepção das expressões desses personagens fosse o suficiente para determinar as profundas angústias que estes sentiam, ou que, numa leitura mais atenta, denotam apenas o reflexo de sua própria angústia diante da incerteza de seu destino, que lhe acompanharia em quase todo o seu percurso como prisioneiro. No entanto, o que há de mais evidente nessa estrutura narrativa, que busca alinhar os fatos reais com o uso dos fatos criados, é a própria percepção do narrador com o ato da criação na edição das memórias ora como positiva e ora com repulsa pelo próprio narrador:

O diabo é que, se me decidisse a narrar por miúdo a conversa do capitão, tanchar-me-iam de fantasista. Ou dar-me–iam crédito indivíduos que andassem no mundo da lua, idiotas ou românticos (Ramos, p89).

A observar de atos de seus próximos, aliados ou não, serve de um prato cheio para uma análise de sua postura com “revolucionário” (termo pelo qual poderia ser acusado) e para uma observação mais detalhista acerca da atitude do próprio movimento revolucionário que se propunha como resistência. Ações que a atitude de um militar, que se nenhum motivo aparente decidia por ajudá-lo, e que, para qualquer um seria apenas um alimento da causa em que se injetava a confiança e a própria liberdade, para o narrador era motivo de questionamento sobre o seu fazer revolucionário.

Capitão Lôbo, portanto, fugia ao preceito. De certo modo havia no caso uma espécie de deserção. Impossível explica-la. Se ele condenava s minhas ideias, sem conhecê-las, direito, porque me trazia aquele apoio incoerente? Insolência e brutalidade com certeza me atiçariam ódio, mas seriam compreensíveis, e nada pior que nos encontrarmos diante de uma situação inexplicável. Admitimos certo número de princípios, julgamo-los firmes, notamos de repente uma falha neles – e as coisas não se passam como havíamos previsto: passam-se de modo contrário. A exceção nos atrapalha, temos de reformular julgamentos. (RAMOS, p. 87-88)

E fora a busca por essa renovação rápida dos valores que fizeram desse prisioneiro peculiar fugir às atitudes de reflexão comuns a esse tipo de situação: A da adesão e da repulsa.
Ou seja, a atitude de um condecorado, um inimigo declarado, que discordava de seus preceitos e ainda assim, contra a força que o emergia e o condicionava, agia. Isso, a atitude de resistência é o que aquela intelectualidade não conseguia compreender e, portanto o grande gatilho para os questionamentos desse cárcere que vivera até então o espírito de resistência que pode ser observada no enxerto abaixo:

A nossa vida não tem muito valor, às vezes se encrenca e desejamos a morte; faltando-nos coragem para o suicídio, exibimos outra forma de coragem; queremos desaparecer; é uma perda individual. Mas ninguém, de senso perfeito, joga fora os seus bens, pois nisso repousa o organismo social – e o sacrifício constitui prejuízo coletivo. Afinal capitão Lobo devia ser muito mais revolucionário do que eu. Tinha-me alargado em conversas no café, dissera cobras e lagartos do fascismo, escrevera algumas histórias. Apenas. Conservara-me na superfície, nunca fizera à ordem ataque sério, realmente era um diletante (RAMOS, P 88).

Memórias do Cárcere é mais que um documento de resistência, é sim, um importante registro dos preceitos reflexivos sobre a práxis indispensável no dia-dia de quem almeja uma transformação, independente de sua dimensão. Já que as mazelas e friezas do cárcere ultrapassam as muralhas os alçapões de qualquer instituição, e encarceram os projetos e sonhos revolucionários inertes no peito dos oprimidos e militantes.
Ari Mascarenhas - O texto original se encontra em meu blog


site: https://contempoemidade.blogspot.com/2019/10/memorias-do-carcere-graciliano-ramos.html
comentários(0)comente



Laura Regina - @IndicaLaura 14/10/2019

um Livro sobre as crueldades da vida real:

A época na qual Graciliano foi preso pela Ditadura de Getúlio Vargas é relatada, com todas as nuances da vida real cruel.

Escrita crua de um dos maiores escritores brasileiros (eu nunca me recuperei de “Vidas Secas” 🌵🐶👨‍👩‍👦‍👦). Aqui, Graciliano relata suas memórias e impressões da época que ficou preso - em cárceres do exército, num navio, numa cadeia de presos políticos. Nesses locais, reconhecemos diversos nomes importantes da política brasileira, como Olga Prestes e Nise da Silveira - pessoas que buscavam melhorias para o país.

Também reconhecemos toda a barbaridade destes locais: os abusos, as mentiras, os desmandos, os pequenos poderes que mostram a mesquinharia dos policiais, do Governo e do Exército.

O que mais gostei do livro foi as reflexões de Graciliano em pequenos eventos de seu cárcere - as mudanças de atitudes, as mudanças de visões, as intrigas, a formação de um coletivo, a ingenuidade de crer que vai ser solto em breve... O livro é recheado de filosofia, da visão de Graciliano sobre aquela barbaridade toda.

Mais indicações no Instagram @indicalaura

site: https://www.instagram.com/indicalaura/?hl=pt-br
comentários(0)comente



Volnei 05/09/2019

Memórias do Cárcere
Neste volume o autor conta como foi sua vida durante o período revolucionário da década de 1930

site: http://toninhofotografopedagogo.blogspot.com.br
comentários(0)comente



Fernando Lafaiete 27/01/2018

Memórias do Cárcere: Relatos cruéis do autor que sentiu na pele a força da crueldade humana!

O que dizer de Memórias do Cárcere? Como avaliar as experiências repugnantes de vida as quais o autor passou ao ser preso? - Graciliano Ramos é o autor do aclamado Vidas Secas, o romance vencedor do prêmio William Faulkner como livro representativo da literatura contemporânea brasileira em 1962. O autor foi preso em meados de 1936 após a intentona comunista (também conhecida como Revolta de 35) que foi uma tentativa contra o governo de Getúlio Vargas.

Nos relatos aqui apresentados, o autor afirma ter sido preso sem saber exatamente a razão. Ao questionar seus algozes, a resposta que recebia era: Você é comunista. - O problema? O autor não se considerava comunista e nunca tinha feito nada contra o governo. Ramos nunca foi acusado formalmente e nunca teve direito a defesa. Foi preso e chegou a ser tratado de maneira desumana. As situações expostas pelo autor em questão, são difíceis de serem digeridas. É tudo muito bem escrito, muitas vezes poético e com muitos simbolismos. Não se dá para esperar menos do que isso de um dos mestres da nossa literatura. Mas o livro também cansa, se torna arrastado em vários momentos e chega a ficar maçante em um nível que foi complicado passar pelas páginas.

Memórias do Cárcere tem alguns aspectos bastantes semelhantes com a obra-prima O Processo do gênio Fraz Kafka. Ambos os clássicos retratam e criticam um sistema burocrático corrupto onde pessoas são presas sem nenhuma justificativa palpável. Ambos os protagonistas questionam e recebem respostas vazias e sem sentido que só aumentam ainda mais a revolta tantos dos personagens centrais quanto de nós leitores. O autor vai desenvolvendo um ódio pelo capitalismo não por ser comunista, mas sim por ser este o sistema econômico que o julga e o condena sem lhe dar a chance de provar sua inocência.

"...Se o capitalismo fosse um bruto, eu o toleraria. Aflige-me é perceber nele uma inteligência. Uma inteligência safada que aluga outras inteligências canalhas. [...] Não é o fato de ser oprimido (que me atormenta). É saber que a opressão erigiu em sistema."

Graciliano Ramos vai narrando passo a passo todas as situações as quais o atormentaram. Passou fome, comeu comida estragada, viu colegas serem estuprados, foi ameaçado por outros presos e em nenhum momento teve a chance de se defender ou de defender outrem. Ele reforça a todo momento que sentia o cheiro podre da comida e que em uma ocasião chegou a detectar fezes de ratos misturados aos alimentos que lhes eram servidos. Como agir em uma situação como essa? - A resposta? Comer ou morrer de fome. E se comer, rezar para não passar mal e morrer.

"Em redor de mim tudo se consumira, e obstinava-me a chupar o cigarro, olhando a infame ração. Na farinha escura havia excrementos de rato. Apesar da náusea, parecia-me necessário comer..."

Muitos sofreram, muitos morreram e Graciliano lutou pela sobrevivência. O autor também relata o momento em que percebeu que na falta de mulheres, homens se relacionavam com outro homens na intenção de se saciarem sexualmente. O autor apresenta opiniões muitas vezes homofóbicas que me desagradaram em um nível que me fizeram pegar um pouco de implicância do autor nesses raros momentos. Tais relatos mostram a dúvida do autor em relação a tudo aquilo que ele estava presenciando.

"Penso assim, tento compreendê-los - e não consigo reprimir o nojo que me inspiram, forte demais. Isso me deixa apreensivo. Seria um nojo natural ou imposto? Quem sabe se ele não foi criado artificialmente, com o fim de preservar o homem social, obrigá-lo a fugir de si mesmo."

Não me foi uma leitura fácil. Foi uma experiência penosa, gratificante, reflexiva e maçante. Tudo isso ao mesmo tempo. Esse livro foi o responsável por me deixar de ressaca e confesso que me forcei a lê-lo em alguns (vários) momentos. Mas ainda assim, afirmo que é uma obra de valor inestimável. Não digo isso apenas por ser um clássico, mas principalmente por ser uma obra que retrata uma história real e necessária. Além das situações que citei, o autor apresenta muitas outras que são revoltantes.

Terminei a leitura exausto mentalmente e a jornada que percorri foi mais do que penosa, mas que valeu a pena. Ainda acho Vidas Secas muito superior, mas Memórias do Cárcere é um livro que deve ser lido e deve ser lido principalmente por quem tem empatia. Se você é uma pessoa quase nula desse sentimento ou é uma daquelas que acha que a solução para os problemas do nosso país é a volta de um sistema como a Ditadura Militar, acredito que este livro não te apresentará algo de muito valor.

É um livro rico em sentimentos, cheio de reflexões sobre a psicologia humana e que prova que o passado deve continuar sendo estudado para que não repitamos os absurdos que tanto propagaram em um época onde me parece que tudo era permitido (no quesito injustiças). Como disse o autor em uma das passagens que citei: O mais revoltante é saber que a crueldade humana retratada era respaldada por um sistema que deveria protegê-los. Um sistema falho que ainda é governado por incompetentes que mais prezam seus status políticos do que o bem maior que deveria ser a prioridade governamental. Só rezo para que as situações expostas por Graciliano Ramos nunca voltem a acontecer. Não dá para mudar o passado, mas podemos moldar o futuro que nos espera. Que assim seja, assim será... só depende de nós e de mais ninguém!
Pedro 27/01/2018minha estante
Maravilhosa sua resenha Fernando. Confesso que sempre me surpreendo com as qualidades de suas resenhas. Se eu já estava interessado em ler esse livro agora fiquei ainda mais. O que você descreveu me fez lembrar muitas das leituras que fiz durante o mestrado, principalmente no que concerne ao forte anticomunismo que se solidificou no Brasil. Não sei se você leu a biografia de Luiz Carlos Prestes escrita pelo historiador Daniel Aarão Reis, mas é de uma qualidade excelente. É espantoso quando se pensa que mesmo o STF tenha negado asilo político a Olga, mesmo ela sendo judia e comunista e estado grávida o que infligida a própria legislação da época, pois brasileiros não poderiam ser extraditados... acabou morrendo num campo de concentração nazista. Depois disso tudo é tantas outras coisas, inclusive prisão em termos semelhantes aos que você descreveu na resenha, Prestes ainda fez alianças com Getúlio Vargas...


Pedro 27/01/2018minha estante
Em Pernambuco mesmo inúmeros trabalhadores rurais foram presos, perseguidos e assassinados, quando estavam somente lutado por direitos trabalhistas básicos. Por esses motivos eram rotulados de comunista...


Fernando Lafaiete 27/01/2018minha estante
Muito obrigado pelo comentário Pedro e fico feliz de saber que minhas resenhas te agradam.

Ainda não li o livro que citou, mas já o coloquei na lista. Obrigado pela indicação. Sobre Memórias do Cárcere, preciso reforçar que não foi uma leitura fácil e muitas vezes foi maçante e chata. Mas ainda assim, não tem como não dizer que é um livro incrível. O que mais me choca (mais até do que o conteúdo que li) é saber que em pleno século XXI ainda existem pessoas que defendem esses absurdos. É assustador pensar que muitos tem ou terão filhos e os criarão à base de todo tipo de preconceito e intolerância. Essas crianças crescerão achando que é normal as coisas relatadas pelo autor. Sendo assim eu pergunto: Que futuro nos espera?
Eu espero que nada disso volte a acontecer e que daqui alguns anos possamos olhar pra trás e respirarmos aliviados de saber que o passado ficou no passado.


Pedro 31/01/2018minha estante
Eu compartinho da sua forma de pensar Fernando, inclusive os medos e choques. Particularmente, por tudo que li e vivi, acredito que esse quadro somente de modificará (algum dia) através de uma educação de qualidade, porém a má qualidade (que em alguns casos não é somente culpa dos docentes, embora algumas vezes seja) da educação é estruturalmente pensada e posta em prática. Não precisamos ir muito longe, basta observamos as manifestações que se inciaram em junho de 2013 no Brasil e o silêncio sepulcral que hoje com Michel Temer vemos. Isso prova, na minha compreensão, que as pessoas mais habilitadas para organizar-se/mobilizar-se não estão ligando para questões sociais (falo em sentido lato). Porém fico muito feliz quando vejo pessoas extremamente inteligentes e competentes como você, que tem essa forma de pensamento. Isso gera o sentimento de amparo frente a tantos absurdos.


Fernando Lafaiete 02/02/2018minha estante
Pois é Pedro, a questão educacional no Brasil é precária em todos os sentidos. A situação social juntamente com a educacional funcionam como armas que amortece os indíviduos de maneira que todos deixam de tentar agir por simplesmente acharem que o Brasil chegou em um ponto que não tem mais solução. Os que poderiam tomar atitudes significativas e um pouco mais imediatas, como os políticos, acabam investindo suas ações em corrupção e em tentar lubridiar a população com a intenção de fortalecer suas posições financeiras e sociais. Os jornalistas (os grandes influenciares de opiniões), passam dias tentando desmentir uns aos outros em uma guerra que não beneficia ninguém de maneira realmente positiva. A educação é de fato a solução, mas enquanto a população não abrir os olhos e perceber que ficar reclamando no facebook e/ou agredindo as pessoas em uma guerra idiota de partidos, não levará a nada. É vergonhoso constatar através de pesquisas que um país tão rico como o Brasil ocupa o 53° lugar no ranking educacional onde 65 países são avaliados. Uma posição que deveria no minímo servir para a população perceber de uma vez que sendo do PT, do PSDB ou do PQP, os políticos estão muito confortáveis em suas posições e não estão dando a mínima para as questões sociais. É tanta gente alienada e sem informação, que no meio desse caos chamado Brasil, nos deparamos com gente dizendo que a solução para tudo é a volta da ditadura e o exterminio de seres humanos como negros, drogados, homossexuais. O mundo não precisa de ódio e de intolerâncias, precisa de paz e de amor. Isso só vamos encontrar através de uma educação de qualidade. Espero que um dia o Brasil passe a ocupar uma posição melhor e as pessoas passem a ser mais conscientes, para que desta maneira possamos viver em um país que não seja uma selva dominada por animais. É triste, mas é extamente assim que me sinto ultimamente... vivendo em uma selva chamada Brasil!




João Luiz 10/12/2017

Excelente livro, narra os momentos difíceis vividos por Graciliano na prisão, os acontecimentos trágicos de um dos mais tristes momentos da nossa história. Uma leitura indispensável!
comentários(0)comente



47 encontrados | exibindo 16 a 31
1 | 2 | 3 | 4


Utilizamos cookies e tecnologia para aprimorar sua experiência de navegação de acordo com a Política de Privacidade. ACEITAR