jota 06/07/2014Centenário mirabolanteA vida - ou as aventuras - do protagonista de O Ancião que Saiu pela Janela e Desapareceu, Allan Karlsson, é uma sucessão de acontecimentos incríveis e improváveis, desses que são possíveis apenas na ficção mesmo.
Muitas vezes durante a leitura do livro do sueco Jonas Jonasson fiquei pensando que Allan bem poderia ser encarado, guardadas certas medidas, como uma espécie de Forrest Gump nórdico, um ser humano incomum, capaz de influenciar, durante décadas, acontecimentos em várias partes do mundo.
Durante algum tempo – especialmente nos capítulos iniciais - você se diverte com as peripécias do velhinho centenário e os amigos singulares que ele vai colecionando. São todos chegados em maior ou menor grau a algum tipo de patifaria ou predispostos ao crime. Isso faz com a história contada por Jonasson seja quase sempre bem-humorada e interessante. Quase sempre...
Até mesmo algumas pitadas de humor negro são distribuídas aqui e ali como, por exemplo, no caso de um “elefanticídio” ocorrido a certa altura da trama. Sim, um dos personagens do livro é uma elefanta (ou aliá, para os eruditos), Sonya. Mas outras mortes bastante incomuns vão ocorrendo ao longo do livro, até que tudo termine na paz de Bali.
Viajamos com Allan pela Suécia, América, Espanha, União Soviética, Coreia, França, Tailândia e outros lugares mais e nos encontramos com gente do calibre de Franco, Stalin, Truman, Mao, de Gaulle e outros conhecidos personagens históricos.
De quebra, nos é dado conhecer até mesmo um (fictício) meio-irmão de Albert Einstein, um certo Herbert Einstein. Que, ao contrário do irmão, não era muito inteligente e acaba se casando com uma tailandesa ao mesmo tempo burrinha e esperta, coisa bastante conveniente para uma história que se pretende engraçada como esta.
Vamos encontrar durante a narrativa algumas coincidências por demais coincidentes, sem as quais a história não poderia prosseguir ou, digamos, perderia a graça, como por exemplo na providencial entrada em cena de Mao Tsé-Tung quando Allan, desmascarado pelo presidente norte-coreano, se encontra a poucos minutos de desaparecer nalguma prisão do ditador – ou coisa pior.
Enquanto a história se passa no presente – na verdade, em 2005 -, ela é quase sempre curiosa e apresenta alguma graça. Quando somos remetidos para o fabuloso passado de Allan, as situações inusitadas que ele vive consomem muitas e muitas páginas cheias de episódios e detalhes mirabolantes para que nosso riso seja alcançado. O que nem sempre ocorre, é verdade, pois a coisa se torna enfadonha ou cansativa com tanta imaginação autoral posta em ação de uma só vez.
Ao contrário do que diz The Telegraph, na capa deste volume da editora Record, penso que ninguém vai morrer de rir lendo O Ancião que Saiu pela Janela e Desapareceu. Se morrer, certamente será por descuido...
Lido entre 23/06 e 05/07/2014.