Luan 30/06/2017
Maior metáfora da sociedade atual, A coisa terrível que aconteceu com Barnaby Brocket tem muito a nos ensinar.
Na maioria das vezes, as histórias contadas em livros são criadas a partir de uma situação vivenciada ou de uma mensagem a ser passada e que pode ser narrada para chegar ao máximo de pessoas ao redor do mundo. Cada livro traz um significado nas entrelinhas como forma de disseminar uma boa ideia. Em A coisa terrível que aconteceu com Barnaby Brocket, isso está escancarado – de forma muito positiva – logo nas primeiras linhas. É um livro que passa uma lição sobre as diferenças, retratando exatamente como vive a nossa sociedade intolerante nos dias de hoje. É o melhor retrato dela – puro e doentio.
Barnaby Brocket é o protagonista improvável do livro, que se passa em Sidney, na Autrália. Ele é filho de Alistair e Eleanor Brocket, um casal que prima por viver da forma mais normal possível. Não gosta de chamar a atenção. Não gosta de se sobressair aos demais. Um casal que não quer a narrativa da vida saia das linhas retas de um papel. E foi assim quando nasceram os dois primeiros filhos. Eles se orgulhavam de ter uma família tradicional e normal. Mas tudo isso mudou até que nasceu Barnaby, um menino que flutuava em vez de caminhar. Normais que eram, os pais dele não achavam isso uma coisa certa e passaram a viver retraídos, temerosos pelo que esse fato poderia acontecer.
Recheado de aventuras e lições, o livro vai narrar um pouco da trajetória difícil de Barnaby e a dificuldade que é em ser diferente daquilo que os outros esperam das pessoas. Ou seja, é o retrato da nossa sociedade diante de uma pluralidade tão grande de gostos e tipos. Os pais são pessoas ruins que tentam ser normais diante de situações diferentes. O ponto alto do livro é quando a tal coisa terrível acontece com o pequeno, exatamente quando está com oito anos. Mas é também quando a vida dele se transforma radicalmente e ele passa a entender um pouco mais que ser diferente é normal, é o normal dele e o importante é ele aceitar isso. E é nesse momento que a mensagem que o autor quis passar se torna ainda mais clara, com vários novos personagens provando que a diferença existe e precisa ser respeitada.
Por mais incrível que eu tenha achado o livro, ele tem vários problemas facilmente observados. Mas em função da história tão poderosa, eu consegui relevar em vários momentos. Mas, principalmente por se tratar de um livro infantil. Sim. O público direto a que se destina "A coisa terrível" é o formado por crianças e adolescentes. Mas isso não quer dizer que os demais não possam ler. Muito pelo contrário. Não só podem, como se torna uma obrigação para todo jovem e adulto lê-lo. Além disso, ainda temos uma forte influência do Brasil na história.
Alguns acontecimentos narrados, fatos vividos especialmente pelo protagonistas, são bizarros e totalmente irreais. Mas estamos diante de um livro. Um dos poucos lugares onde nossa imaginação de fato pode ganhar asas. E, no fim, o importante é que a mensagem é passada. E isso ele consegue. Outro problema que observei é que, talvez por ser um livro infantil, o autor não teve tanto cuidado em se aprofundar na história. Às vezes parecia um pouco superficial. Isso se aplica também ao detalhamento dos diálogos. Em alguns momentos, eles eram frios e mecânicos. Faltou um pouco de sentimento e profundidade na hora de descrevê-los.
No entanto, assim mesmo, a história é muito prazerosa de se ler. A escrita do John Boyne é muito fácil e a leitura flui muito rapidamente. Ele não esconde a mensagem que quer passar e isso é o grande "barato" da história. Ele ainda conseguiu construiu um protagonista incrível. Barnaby é inocente, sincero e inteligente na medida certa. É carismático. Se torna quase impossível não torcer por ele na improvável aventura em que ele acaba se metendo. A capa do livro também é linda. Não tinha parado para observar, mas, de fato, é muito bonita a combinação de cores. A diagramação e revisão estão bem cuidadas. Aliás, o livro é escrito ATÉ POR UMA COR DE FONTE DIFERENTE E EU ACHEI ISSO INCRÍVEL - afinal, quem disse que a cor preta é a correta em livros?
Um livro em constante movimento, "A coisa terrível" caminhou muito bem para o seu fim. Inicialmente fiquei um pouco temeroso com o que o John poderia ter preparado. Mas fiquei muito satisfeito, embora esperasse uma mensagem mais forte sobre ACEITAÇÃO. Apesar dos vários probleminhas, que podem e devem ser relevados, a história é tocante, pontual, atual, uma verdadeira lição de vida para todos nós. Poucas vezes vi um livro querer passar uma lição tão forte sem ser tão chato ou piegas. Esse conseguiu ser incrível. Achei a ideia sensacional e me pergunto como não pensaram antes. Sem dúvida, é uma das maiores e melhores metáforas da sociedade atual, uma sociedade intolerante. Uma lição que todo mundo deveria ler. Mesmo com várias ressalvas, que me fariam diminuir a nota em outros livros, acho que não consigo dar menos do que cinco pra esta obra tão importante.