Jaqueline 16/02/2014Quando fiquei sabendo da disponibilidade do livro “Meu Amigo Jesus Cristo”, relutei em aceitar a obra por causa de seu título. Sim, eu pensei que se tratava de um livro religioso, mas logo percebi que a história nada tinha a ver com fé quando, logo na primeira página, o protagonista começa a se masturbar em sala de aula. Nikolaj é um garoto amargurado, raivoso e depressivo que não consegue lidar com a morte dos pais em um acidente de carro. Aos 13 anos de idade, começa a ser criado pela irmã sete anos mais velha, Sis. Com mais dinheiro do que poderia imaginar, Nikolaj passa por uma adolescência turbulenta e vazia, regada a porres e brigas.
Sua mãe, Grith Okholm, era a cantora mais famosa e querida da Dinamarca, mas sua própria família havia virado as costas para ela e seus filhos. Já adulto, Nikolaj encontra-se em um estado deplorável: vive sentindo lancinantes dores estomacais, tenta se matar algumas vezes, comete crimes e passa os dias com más companhias para monopolizar a atenção (e a preocupação) de Sis. Tudo muda, porém, quando um estranho barbudo e grandalhão, no maior estilo motoqueiro, invade seu apartamento dizendo que tinha vindo para ajudá-lo a se tornar uma pessoa melhor. O nome desse estranho? Jesus Cristo.
Seguindo as ordens de Jesus, Nikolaj se muda de Copenhague para Tarm, a cidade natal de sua mãe. Lá, ele faz novos amigos e tenta mudar de vida, sempre contando com o apoio dos colegas e as misteriosas “instruções” de Jesus. Neste processo de se “tornar um homem melhor”, ele reabre antigas feridas, machuca novas pessoas e descobre as diferentes facetas das pessoas ao seu redor, tudo isso dependendo profundamente de sua rede de segurança: seu novo grupo de amigos, denominada OTAN. Marianne, uma jovem Testemunha de Jeová com um passado complicado e lindos seios, logo se torna a nova obsessão de Nikolaj e é um dos destaques desse grupo, que também conta com a bondosa e sincera Karen, uma senhorinha que é vizinha de Nikolaj e logo se prontifica a ajudá-lo (a melhor personagem do livro, simples assim).
Eu nunca havia lido nenhuma obra escandinava até “Meu Amigo Jesus Cristo” e não conheço a cena literária contemporânea do país. Por isso, avalio esta obra de acordo com minhas impressões isoladas sobre o texto. Lars Husum escreve de forma descontinuada, alternando a narração em primeira pessoa com a percepção de um narrador onisciente. Em um fluxo de consciência que extrapola tempo e espaço, ele narra memórias e ações de outros personagens, além de alternar estilos de escrita (ora literário, ora jornalístico). O autor do livro trabalhou como roteirista na produtora do polêmico cineasta Lars Von Trier e seu background cinematográfico fica bastante evidente no livro, que está atualmente sendo adaptado para o cinema.
A banalidade com que certos assuntos são tratados cria um abismo de empatia entre o narrador e o leitor. Não consegui compreender a motivação autodestrutiva e excessivamente dramática de Nikolaj para além de birras de uma criança mimada e idiota (“quero que minha irmã ame somente a mim, mimimi”). Entre vários momentos problemáticos e incômodos da história, destaca-se o incidente envolvendo sua namorada, Silje, vocalista de uma banda cover da mãe de Nikolaj, algo simplesmente imperdoável para mim. Por mais que eu não tenha gostado da história do livro, achei a escrita de Lars fluida e interessante. O destaque, porém, fica para a editora Gutenberg, que fez um belo trabalho com a capa e a diagramação do livro, que conta com trechos de matérias de jornais e imagens no meio da história.
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