Paulla Pereira 28/06/2017
Sangue, suor e bovinos
Eu já havia entrado em contato com Edgar Wilson e sua forma peculiar de ver e tratar o mundo no ótimo "Entre rinhas de cachorros e porcos abatidos". De gados e homens é um "prequel" da história que eu havia lido - parece que eu tenho o condão (ou a mania, não sei!) de ler sequências fora da ordem.
Antes de trabalhar com os porcos, que era a vontade de Edgar, ele passou pela lida com gado de corte - bois, vacas, touros. Ele é um atordoador, a pessoa que "apaga" os bichinhos antes da retirada do couro e do esquartejamento. Tenta evitar o sofrimento desses animais, proporcionando um rápido desmaio mediante uma certeira marretada. Sabe que não há mais nada que possa fazer, que o trabalho deve ser feito para que outros comam a carne - e sabe também que não será fácil arrumar qualquer outro emprego.
"Alguém precisa fazer o trabalho sujo. O trabalho sujo dos outros. Ninguém quer fazer esse tipo de coisa. Pra isso Deus coloca no mundo tipos que nem eu e você."
Certo dia o gado começa a se comportar de forma estranha. Homem de poucas palavras e observador, Edgar repara rapidamente que há uma perturbação entre as vacas - que leva aos episódios centrais da narrativa. São apresentados outros personagens, tão simplórios quanto Edgar, cada um com suas manias e comportamentos; mas todos com as características necessárias para um serviço em um matadouro: a maneira peculiar de pensar na humanidade, nas necessidades, e na própria barbárie - que os aproxima dos animais, em certos aspectos. Quem é a besta? Quem é o verdadeiro animal?
Recomendo a leitura. A cena em que o matadouro recebe um grupo de alunos de uma instituição universitária é ótima, especialmente para os que nunca leram sobre maus tratos a animais de corte (eu não como carne, já li e vi suficiente sobre).
Ainda há um livro nessa trilogia, que descreve o primeiro emprego de Edgar, na carvoaria - ou seja, eu realmente li os títulos em ordem inversa: primeiro o 3, agora o 2... vai vendo, né?
Ps. Li críticas muito negativas a esse livro - depois de tê-lo lido - massacrantes, mesmo (eu, se fosse crítica, ficaria envergonhada de escrever de forma tão feia, chegou a parecer despeito). Não concordei com elas. Então lembre disso ao ver/ler opiniões sobre literatura: são OPINIÕES. Leia, com a sua bagagem, seus conhecimentos e seu contexto, e chegue a sua conclusão. Às vezes você até se surpreende.
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