O frio aqui fora

O frio aqui fora Flavio Cafiero




Resenhas - O frio aqui fora


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Leituras do Sam 14/12/2016

O FRIO AQUI FORA
Em cada parte da sua vida o protagonista deste livro tem um nome, uma designação que lhe possibilita saber quem ele é.
Luna, Gunga, Guga, Gustavo, Gustavo Luna, um cara que tem a vida toda bem organizada, centrada, planejada e segura, até o momento que a promoção de cargo na empresa que trabalha à treze anos não acontece e ao mesmo tempo o relacionamento sólido de 5 anos termina. Começam as dúvidas, ataques de pânico, momentos de depressão, os questionamentos sobre o que fez e o que fazer da vida agora que o calor das coisas certas, os planos acalentados sofreram o ataque do acaso, do não planejado.
Acompanhamos o sofrimento a adaptação, evolução, e o refazer-se de um homo sapiens na selva da vida consciente, racional ou nem tanto.
Neste romance de estreia, Cafiero aproveita da sua experiência pessoal para construir uma história com linguagem elegante, mas acessível, com o mundo corporativo como pano de fundo e também com doses de "ensaios" sobre a evolução, seleção natural".
Muito me identifiquei com Luna e acredito que todo trabalhador se identificaria também.
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Pedro Daldegan 23/01/2015

O frio aqui fora
[ A mãe levanta, troca de roupa e ajeita o cabelo em frente ao espelho para encontrar a vó na cozinha e dizer: hoje acordei. Diz assim, como se tivesse ganhado uma medalha. Na origem, era hábito do vô. ]

O trecho acima é do livro "O frio aqui fora" [ 2013, Cosac Naify ], de Flavio Cafiero. O livro nos presenteia a história de Luna, um homem que trabalha em uma empresa há treze anos e não recebe a tão esperada promoção. Para piorar, Luna é abandonado pela namorada. A partir daí o simples ato de acordar é difícil, e as palavras soam estranhas quando pronunciadas. Enquanto isto, uma vontade se torna imperativa, Luna quer se tornar escritor. Em meio à desordem que se instaura, Luna passa a experimentar as coisas, e sente estranheza, e sente insegurança, e tudo soa primitivo. Afinal, somos animais, não somos? Este é o primeiro livro de Cafiero, e ele transcreve os pensamentos de Luna com a confusão e honestidade inerente às ideias, e o simples ato de descobrir um nome é revelador, e delicioso.
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Flavio 15/01/2014

Autoficção e sobrevivência (por Renato Tardivo)
Flavio Cafiero, publicitário de formação e ex-gerente de produto, abandonou a vida de executivo para se dedicar à criação literária, e em O frio aqui fora, seu romance de estreia, ele mostra a que veio. Sua escrita é sólida e madura: o leitor não parece estar diante de uma estreia.

A narrativa não é linear. As sequências, que se estendem por algumas páginas, são separadas por um recuo de linha e reticências entre colchetes: [...]. Fica sugerido, portanto, que 1) as palavras do livro irrompem das entrelinhas, armadura invisível, talvez o avesso do título do romance, o “ali dentro”, e 2) ainda que descontínuas (ou porque descontínuas) as sequências estabelecem alguma conexão, uma vez que partem de uma mesma origem.

O romance pode ser classificado em um gênero que anda em voga: a autoficção. Nela, autor e narrador, se não coincidem (como na autobiografia), aproximam-se – às vezes mais, às vezes menos. O exemplo recente mais célebre aqui no Brasil provavelmente seja O filho eterno, de Cristovão Tezza. Mas autores já estabelecidos da nova safra também têm tomado esse caminho: Michel Laub, Ricardo Lísias, Paloma Vidal, entre outros.

Como Cafiero, Luna, o narrador-protagonista de O frio aqui fora, é um gerente de produto bem sucedido que resolve se aventurar nas letras. A redescoberta da identidade profissional, contudo, extrapola para os demais aspectos de sua existência. Temas como casamento, paternidade e sexualidade são abordados. Mas, até aqui, talvez não houvesse nada de muito novo. A própria metalinguagem relacionada à autoficção (o protagonista é/quer ser escritor) por si só não garantiria o êxito do livro.

O frio aqui fora funciona muito bem pela habilidade com a qual o autor trabalha a – e pela – linguagem. O estranhamento que algumas palavras provocam no narrador – e por extensão no leitor –, a explicitação demorada dos nomes próprios (o de Luna inclusive), o fato de as poucas falas das outras personagens virem entre parênteses (não se descolando do fluxo de consciência do narrador, mas diferenciando-se em alguma medida dele) fazem com que o livro suba de escala.

Chama a atenção, também, a presença de aspectos do mundo animal, que facilmente soariam em desarmonia com a trama principal, mas que, bem costurados pelo autor, situam a existência humana à evolução das espécies, perspectiva na qual o que conta mesmo é sobreviver. (Parêntese: nesse sentido, o romance dialoga com A árvore da vida, filme de Terrence Malick, vencedor em 2011 da Palma de Ouro em Cannes.)

A luta de Luna com a palavra, “luta mais vã”, diria Drummond, se dá a fim de sobreviver, de continuar. E aqui voltamos à forma mesma do romance: os signos que irrompem das entrelinhas, do invisível, e que enfrentam, corajosos, o frio aqui fora, lutam eles mesmo para continuar. No fim, o livro sobrevive: “E então? O que viria depois?”.
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