Cesario 08/07/2014
Distopia fora do tom
Me esforcei bastante para gostar de Rio: Zona de Guerra, mas não consegui. Depois de caçar livros de literatura nacional com ambientação cyberpunk, acabei achando o livro na loja da Amazon e, apesar de ver algumas ideias bem legais, confesso que vi a história derrapar demais para levá-la a sério. Vamos às minhas impressões.
- Trama
Achei todo o desenvolvimento da trama muito pouco orgânico. O que mais me fascina em livros policiais, vide Dragão Vermelho ou até os clássicos de Simenon, é a maneira encadeada como a trama se desenvolve. As revelações das investigações devem ser orgânicas dentro de enredo, fruto de um raciocínio que o leitor deve conseguir acompanhar. Não é iss que vemos aqui.
Na história de Zona de Guerra, tudo parece muito artificial ou abrupto. A maneira como o detetive Freitas conduz o caso e seu desenrolar parecem completamente desconexos. A grande reviravolta do final, a traição que ele vai enfrentar ao longo do livro - tudo parece meio sem sentido. É como se alguém tivesse várias ideiais e tentasse forçá-las juntas dentro da mesma história.
O final, então, nem se fala. A maneira como várias revolução começam a eclodir pelo mundo deveria parecer empolgante de alguma forma, mas soa apenas extremamente artificial e insossa. Ao invés de optar por um final mais digno de um noir policial, o autor, que já não domina muito bem o gênero, decidiu se enveredar no meio de uma revolução que não faz sentido algum - e que fica muito pouco clara. Acho que faltou bastante maturidade à escrita.
- Desenvolvimento
Boa parte do que falei acima é bastante influenciado pelo desenvolvimento ralo da trama. Por ser um livro muito curto, Zona de Guerra tenta criar vínculos fortes com os personagens rápido demais, o que não dá exatamente certo. Em determinada cena do livro, o personagem principal é admirado como um herói por sua vizinhança, que se prontifica a salvá-lo. Mas essa devoção soa extremamente mal colocada na obra. Ela não é construída. Um detetive que trabalha apenas e exclusivamente por dinheiro se torna um herói da vizinhança sem que nós, leitores, vejamos qualquer gesto de heroísmo ali.
Outra coisa que não entendo bem é como funciona esse mundo de Zona de Guerra. O autor teve pouca atenção para explicá-lo e a revelação de que há várias "zonas de guerra" espalhadas pelo mundo soa muito simplista. Como elas se formaram? Por que todo o mundo segue o mesmo padrão? Será que não vimos que, no capitalismo de hoje, o que mais agrada às grandes empresas é incluir os pobres no seu rol de consumidores, e não isolá-los atrás de uma muralha? Se fosse uma ou duas cidades assim, é aceitável. Mas o mundo inteiro? Muito ruim.
- Os personagens
Se o personagem principal consegue ser um pouco melhor construído, os outros não extremamente bidimensionais. Você não vê muitas sombras entre bem e mal em Zona de Guerra, elemento até bem comum nos romances noir. Sem contar que são extremamente estereotipados.
A prostituta ruiva gostosa a procura de respostas para um assassinato. O hacker excêntrico que invadiu os sistemas de uma grande empresa e acabou contratado por ela. A (parca e extremamente estúpida) inteligência artificial que se auto-procalma o próximo passo da evolução.
Sem contar o machismo exacerbado da trama, que só tem duas personagens femininas - e ambas gravitam invariavelmente em torno do personagem principal. Uma é uma prostituta gostosa e a outra é uma mulher irracional e completamente fora de controle que decide fazer maldades por se sentir traída. Sério? Acho que o autor merece umas aulinhas sobre como balancear personagens femininos em seu próximo livro.
- Conclusão
Rio: Zona de Guerra vale a pena? Se você não for um ENORME fã de ficção científica, mais especificamente cyberpunk, definitivamente NÃO. Agora se você amar MUITO cyberpunk e quiser ver o que está rolando entre nossas produções nacionais, talvez valha a pena.
Continuo em busca de um livro de ficção científica nacional minimamente aceitável. Aceito recomendações.