Uma mesma noite

Uma mesma noite Leopoldo Brizuela




Resenhas - Uma Mesma Noite


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Toni 26/11/2018

Estima-se que a última ditadura argentina (1976-1983) somou quase 30 mil vítimas, entre mortos, desaparecidos e torturados (ainda há divergências quanto ao número). O romance de Brizuela se debruça sobre esse período da história de nossos irmãos portenhos para refletir não apenas sobre vítimas e algozes, mas sobretudo sobre o papel das testemunhas, daqueles que viram e optaram pela omissão, seja por medo de represálias ou por concordarem intimamente com o ódio que os opressores disseminavam contra os “subversivos”. O narrador, escritor de renome, se vê forçado a lembrar a noite em que acredita que seu pai contribuiu para o sequestro de uma vizinha envolvida com a resistência contra o regime de Videla/Massera e percebe, em seu silêncio de mais de trinta anos, a atitude conivente de uma burguesia que prefere esquecer a pensar no dia em que aprendeu a calar.
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Atormentado pela noite em que “não foram bons”, o escritor Leonardo Bazán resolve fazer da literatura um campo para revolver os despojos da memória privada e coletiva, apresentando o vai-e-vem narrativo entre presente (2010) e passado (1977) como memória de um medo. No entanto (e sem spoilers), ao final do livro compreende-se que aquilo que o romance de Bazán articula é, na verdade, um profundo medo da memória, a impureza de sobreviver e não querer lembrar. “O que está acontecendo ao nosso lado, mãe, é a nossa derrota”, diz o jovem narrador na noite em questão.
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Qualquer um pode fazer coisas horríveis e se transformar em monstro, mas o que resta à testemunha dessa transformação? Qual a ética do esquecimento? Cada uma das quatro partes do livro—Romance, Memória, História, Sonho—busca responder a essa pergunta. Através de capítulos nomeados por letras do alfabeto espanhol, Bazán encontra as palavras para contar seus 10 minutos de infame protagonismo. A “última palavra” do livro, todavia, no capítulo Z, é um retângulo preto que ocupa toda a página—símbolo infinito, não só da impossibilidade de articular a dor do silenciamento, como também visão futura de um país entregue ao apologista de torturadores.
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