Avalon2 03/06/2024
Não se pode voltar ao paraíso perdido
Gostaria muito de fazer uma resenha longa e elaborada sobre o livro, mas para isso eu preciso de tempo (confesso que o tenho) porém necessito falar sobre ele de forma urgente, botar para fora minhas percepções e sentimentos.
Grandes Esperanças é uma história sobre crescimento, amadurecimento e redenção moral; e a menos que o leitor seja uma espécie de santo, é impossível não se identificar com o Pip com o decorrer da leitura. Um menino muito pobre, que ao ser introduzido a um ambiente e pessoas que pela primeira vez o faz questionar-se e envergonhar-se de suas origens, Pip passa a sonhar com uma fortuna, para poder tornar-se um cavalheiro. E quando, de forma inesperada, ele herda certa fortuna de um bem-feitor anônimo, Pip passa a ter grandes esperanças sobre sua vida e o que com elas, o que antes apenas almejava, agora pode conseguir.
Não vou estender-me no arco do personagem, mas sim na construção da história do ponto de vista literário. Como tudo é belo e possui significado! Muitas coisas pude perceber por conta própria, já outras, pela belíssima introdução contida nessa edição. É incrível perceber como todos que de alguma maneira prejudicaram/ofenderam Pip (principalmente no passado quando ele era apenas um menino) de alguma forma pagaram pelo o que fizeram. A moça de frio coração que o rejeitou para casar-se com um homem cruel da pior espécie teve um casamento infeliz; o homem que o azucrinava durante a infância e contava vantagem às suas custas teve a loja saqueda e sua boca grande calada pelas sementes que vendia.
Mas também há o próprio Pip, e diversas escolhas no decorrer de sua vida o prejudicaram como também o beneficiaram, quando foram sábias. Mas o que eu gostei de ter percebido, além da óbvia já comentada redenção moral, em que ele vai do nada ao tudo e do tudo ao nada novamente, foi como ele também foi punido por suas próprias escolhas. Quando, logo assim que herdou a fortuna, de forma bem arrogante Pip deixou claro para Biddy que ela não seria boa o suficiente para casar-se com ele; contudo, após perder tudo, ele não imaginava que iria querer voltar atrás de suas ações e palavras, mas já seria tarde demais, pois, caso já não tivesse outro ocupando "seu lugar" talvez ele quem já não fosse bom o suficiente para ela, apesar de sua redenção moral já ter sido iniciada. "[...] minha última esperança frustrada."
Pip desprezou as pessoas que com ele sempre se importaram, e apesar de ter feito boas amizades durante o caminho, aprendeu dores das piores maneiras irreversíveis possíveis. Assim como Estella. Que, enquanto o coração dela era de duro e gelado, o de Pip era quente e sensível. Ambos aprenderam suas lições, que neles deixaram marcas que o tempo nunca seria capaz de apagar. Contudo, nunca é tarde para novos recomeços, mesmo que pequenos e, inicialmente, incertos.
"Somos amigos", disse eu, levantando-me e debruçando-me sobre Estella, enquanto ela levantava também.
"E continuaremos amigos à distância", disse ela.
Tomei-lhe a mão e saímos daquelas ruínas; [...] e naquela extensão de luz tranquila [...] não vi nenhuma sombra de um adeus de Estella."
Seria isso, quem sabe, o nascimento de uma pequena esperança?