regifreitas 22/02/2020
OS CRIMES DO MONOGRAMA (The monogram murders, 2014), de Sophie Hannah; tradução Alyne Azuma.
Não sou muito fã desse procedimento de se apropriarem de personagens de outros autores para produzirem novos trabalhos. Mas se é para fazê-lo, pelo menos que seja para subverter ou inovar o material original.
Muito pior são aqueles casos - como vêm acontecendo com Monteiro Lobato - nos quais as mesmas histórias estão sendo reescritas, agora eliminando possíveis controvérsias, como a sombra do preconceito racial atribuído ao autor. Também nessas reescritas estão se inserindo - outro ponto bastante discutível -, tecnologias da modernidade, como justificativa para atrair jovens leitores! Creio que edições com comentários críticos, situando o texto, o autor e o contexto de produção das obras, seriam bem mais úteis. Mas Lobato entrou em domínio público recentemente, e não há muito o que se possa fazer a respeito. Apenas lamentar a estreiteza desse tipo de procedimento.
Não é o caso de OS CRIMES DO MONOGRAMA. Os detentores dos direitos das obras da Dama do Crime gostaram da proposta, e consentiram em que uma nova aventura protagonizada por Hercule Poirot viesse à luz, com Hannah tentando emular o estilo de Agatha Christie. Não que o resultado final seja ruim. É até uma opção decente para quem gosta do gênero. Mas, por maior que tenha sido o empenho apresentado pela autora em recriar o personagem, quem é fã percebe claramente as diferenças. Além de a estrutura do enredo não casar com o estilo mais sucinto e simples, marca de Agatha Christie.
Se Hannah tivesse enveredado por um outro caminho, algum tipo de releitura, talvez tivesse obtido um êxito maior. Existem bons exemplos disso. Em o XANGÔ DE BAKER STREET, de Jô Soares, e NOTURNO, 1894, de Raimundo Caruso, apresentam-se versões renovadas do célebre Sherlock Holmes. Nesses casos, os autores não buscaram imitar o estilo dos escritores originais. Conservando as características essenciais do personagem, partiram para construir algo novo, com personalidade própria. Afinal, ao se optar pela imitação, o resultado final dificilmente será o mesmo de um Conan Doyle. Ou de uma Agatha Christie. Pois estes foram únicos.