Caverna 20/06/2015
Três crianças distintas. As famílias biológicas delas mortas. Dois anos depois, as famílias adotivas também são executadas. Três massacres que vão manter a polícia ocupada e repleta de dúvidas.
Houve uma chacina na casa da família adotiva de Teddy Clock. Todos morreram (pai, mãe e as três irmãs), exceto o garoto que conseguiu se refugiar na casa da vizinha. O caso inteiro é um mistério; não há digitais, e apenas um suspeito, o namorado da empregada que já tem sido procurado por roubo. Jane Rizzoli, a detetive convocada para a investigação, logo se choca ao chegar à cena de crime. Só em pensar que uma daquelas garotinhas poderia ser sua filha no lugar, o coração doía. E já que ela era uma das únicas profissionais no local que tinha filho, Jane é encarregada de conversar com o garoto, que até então não soltou nem uma palavra sequer. E Jane descobre o quão assustado Teddy está, com medo de que mais alguém se machuque, pois todos ao seu redor sempre acabam morrendo, e nunca iam parar até conseguir encontrá-lo.
Maura Isles, a patologista, aproveita suas férias para se afastar da confusão que se formou em cima do caso, indo para Evensong, o colégio interno onde Julian, seu filho de consideração, estava estudando. Lá, ela se depara com coisas mais peculiares ainda; aquele não é apenas um colégio interno, e sim um colégio onde todos os alunos e professores perderam alguém. Seja pai, mãe, irmão, qualquer parente próximo que os tenham afetado diretamente. E, além disso, as matérias ensinadas são muito mais avançadas do que o normal. Aos 16 anos, Julian tem aulas de arco e flecha para aprender a se defender, aulas sobre plantas venenosas para poder se proteger, e até mesmo faz parte do clube dos Jackals, que são como cientistas, fazendo pesquisas acirradas. Pareciam lições precipitadas para meras crianças. E mesmo quando teve conversas particulares com os responsáveis pelo lugar, ela continuou com a pulga atrás da orelha. Afinal, será que era uma boa escolha mesmo mantê-los tão longe da sociedade, cercados por portões sem escapatória, interagindo só com pessoas na mesma situação, apenas para aprenderem a lidar com a dor?
E é também em Evensong onde se encontram Claire Ward e Will Yablonski, os dois outros casos semelhantes ao de Teddy. Claire tem 13 anos e foi atingida no crânio por um tiro no dia da morte dos pais biológicos. Isso a deixou com consequências para o resto da vida; Claire continua aparentemente uma garota normal, apesar da cicatriz, mas seus hábitos noturnos mudaram, ela consegue dormir só 4 horas por dia, e também fala qualquer coisa que venha à mente, sem ponderar antes de dizer. Já Will tem 14 anos e é apaixonado por astronomia, seguindo os passos do pai biológico que trabalhava na NASA. E foi justamente por estar observando os cometas do lado de fora da casa que ele escapou da explosão que matou seus tios, que estavam com a guarda dele. Tanto Claire quanto Will são novos em Evensong, ainda se adaptando ao local, mas aqueles aspectos em comum entre as três crianças incomodaram Maura e Jane, mesmo que os três venham de cidades diferentes e que não tenham nenhuma relação entre si. E numa busca desenfreada, Jane vai atrás de informações a respeito das famílias, enquanto Maura se encabe de proteger as crianças, ao mesmo que eventos inusitados passam a acontecer.
Com 384 páginas, A Última Vítima é uma história que tende a parecer mais longa do que realmente é, de tantos palpites que despontam durante todo o decorrer. Esse fator não é algo negativo, já que os diálogos são bem construídos, as cenas sem tantos detalhes espalhafatosos e desnecessários, o que faz com que a leitura te prenda e você acompanhe a trajetória de pensamentos dos personagens com calma. Não é uma obra recheada de ação, isso é verdade, mas quando a ação aparece, é pra valer. É como estar numa montanha russa, onde o começo é tranquilo, e de repente você está lá em cima, sem nem saber como foi parar lá, despencando com tudo e esquecendo de levar a alma junto. Uma hora estamos caminhando na floresta, e de repente alguém surge morto. E por aí vai. E outro detalhe que adorei é como não é nos dado nem uma pontinha de um possível assassino. Lógico, tem o namorado da vizinha, mas isso já nos é dado de mão aberta. Por isso elas passam tanto tempo encucadas, já que pra elas parece tão claro haver uma ligação entre as crianças, mas a ausência de um único suspeito sequer é intrigante.
Como o pai de Will trabalhava na NASA, os colegas dele chegam a afirmar que ele descobriu a existência de extraterrestres. E gente, eles retrataram esse assunto de forma tão delicada, que eu inclusive cheguei a acreditar. Uai, porque não? As duas crianças foram salvas por uma mulher misteriosa que depois desaparecera. Pra mim parecia uma hipótese boa, e até fiquei empolgada, porque mesmo sendo uma obra policial, e não sobrenatural, aquela resposta se encaixaria super bem. Maas, né... Não vou ficar soltando spoilers kkk O livro destaca bastante também resoluções patológicas, como por exemplo nas necropsias. Os alunos da patologista são loucos por perícia criminal, e vivem pedindo pra que ela conte mais sobre o trabalho, mas o interessante é que o livro mostra exatamente o outro lado da perícia, o qual deixamos de lado, o qual esquecemos e colocamos a magia no primeiro lugar. Ele mostra como nem tudo são flores, como é triste ver aqueles corpos, uma família inteira morta, como aquela realidade machuca. Esse foi realmente um ponto positivo, porque é raro ver as pessoas apontando a dor que vão ter de enfrentar nessa profissão, que não é apenas reconhecer os sinais e acabou. Vai muito além disso. Mexe com o emocional da pessoa.
Quanto ao final, é por ele que não dei nota máxima. Porque alguns autores tem a mania de desenvolver o livro de forma magnífica, pra chegar no final e resolverem correr com o término? Talvez eles gastem tanto tempo preparando todo o desenrolar que pro final o que eles mais querem é que acabe logo pra jogar pro ar. Mas eu achei que o final devia ser algo merecido também, e não foi o caso. Aconteceu tudo muito, muito rápido, foi uma enxurrada de revelações que te fazem ficar perdido e se perguntar como diabos chegaram naquelas conclusões. Muitas partes ficaram confusas, sem uma explicação concreta, várias pontas soltas, então o desfecho realmente deixou a desejar. É uma pena, porque todo o resto é maravilhoso, e se for considerar essa parte, eu super recomendo a leitura. É ágil, engenhosa, e aborda o assunto com foco e maestria.
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