Luan 24/05/2017
Um clássico moderno, história preferida para a vida toda
Naturalmente, espera-se que todo autor, ao escrever um livro, o faça com um propósito, ou seja, para passar uma mensagem. Alguns o fazem com êxito, e outros nem tanto. Mas poucos, quase raros, conseguem ser tão certeiro como Stieg Larsson, autor da trilogia original de Millennium. Ele foi certeiro na missão de entregar um trabalho cheio de entretenimento da mais alta qualidade ao mesmo tempo que entregou também uma obra reflexiva sobre um tema cada vez mais atual: o espaço da mulher na sociedade e também a violência contra ela.
A rainha do castelo de ar chega pra fechar com maestria a trilogia criada por Larsson. Todos os acontecimentos que tiveram início lá no primeiro, mas especialmente no segundo livro, terão seus desfechos agora, por isso, a sinopse só é indicada para quem já leu os dois primeiros livros. O livro já começa imediatamente narrando os fatos que se desenrolaram depois da confusão entre Lisbeth e o pai. Ela vai para o hospital, com a vida correndo risco e muito encrencada com a polícia. Mikael, por outros lado, precisa provar porquê estava naquele cenário ao mesmo tempo que luta para defender a hacker de acusações séries.
O terceiro livro não fica devendo em nada para os anteriores. Especialmente ao segundo, que tem um nível de qualidade acima do normal. Apesar de ser uma trilogia muito linear, com os três livros beirando a perfeição, o segundo se sobressaiu, sim. Mas o terceiro fica muito pouco atrás, quase nada. Nele a gente vai acompanhar basicamente a polícia e não banda podre da segurança da Suécia, tentando desvendar todos os crimes e bagunças que a gente conheceu anteriormente. O ritmo alucinante de leitura começa logo no início e só vai terminar no fim do livro. É pro leitor perder o folego.
Sobre personagens, por se tratar de um livro conhecido, já não tenho muito o que falar, uma vez que são personagens já descritos e até íntimos. Destaca-se a verdade que eles passam e como o autor consegue construir tipos reais que evoluem conforme a história avança e profundos a ponto de ser confundir com a realidade. Basicamente, há que se destacar o espaço que Annika Giannini, irmã de Mikael, conquista na trama, e o surgimento de Rosa Figuerola e Torsten Edklinth, importantes para o futuro da história. Sobre cenários e descrições, também não há muito o que se falar. Já conhecemos o estilo do autor.
Essa resenha serve basicamente enaltecer o autor e frisar que ele conseguiu reunir de forma primorosa duas necessidade básicas de um livro: divertir e acrescentar ao leitor. Ele fez isso. A trilogia foi criada para debater o papel da mulher na sociedade e a opressão que ela sofre, sem que isso seja chato, ditador ou didático. A história detalhadamente construída vai crescendo e nos entrega uma grande lição de moral com um desfecho único. A luta de Larsson com essa questão teve êxito, e certamente é uma obra a ser indicada para todos com o intuito de refazer pensar sobre conceitos arcaicos e que devem ser mudados.
Houve, sim, pontos, ao longo da trilogia, ou em especial a este terceiro livro, que me deixaram incomodados, afinal, não conheço livro perfeito. Mas eles quase se escondem diante da qualidade. O autor é cuidadoso e detalhista. Ele gosta de uma construção profunda e bastante explicada. Por isso, às vezes ele peca pelo exagero ao explicar como aquele personagem ou aquele fato surgiu no contexto e porque ele vai ser importante lá na frente. Ele faz isso muito bem, mas por ser tão bom, em um momento parece chato. Outro aspecto que incomoda é o Super-Blomkvist. O cara consegue tudo e ainda se safa de tudo. Precisa ser estudado pela ciência. Por fim, um vício do autor ou do tradutor: toda vez que dois personagens têm uma longa conversa, eles ficam conversando por cerca de duas horas. Justamente. Em vários momentos ele usa essa frase "conversaram por duas horas". Por que duas horas? Não poderia ser um ou três? Enfim...
Mesmo sendo um livro não de novos mistérios, e sim de elucidações, o leitor se vê preso do início ao fim. Leitura frenética, ótimas situações, suspense que prende o leitor, viradas que surpreendem, personagens com história palpável para contar. Tudo isso e muito mais a gente encontrou nessa trilogia original, que ganhou um quarto livro, escrito por outro autor (e, que, segundo quem já leu, deixa muito a desejar). Ela é, certamente, a minha preferida entre tantas. Como disse certa vez, uma relíquia. Que grande história esse autor construiu. Fica u única lamento: uma pena enorme ele ter partido tão cedo, antes de deixar outras obras de tamanha qualidade.