Gabriela3935 24/04/2021
"Falando as mesmas palavras, as pessoas não se entendiam."
Ao classificar este livro, tentei não levar em consideração a história de sua autora - assim como do diretor do filme - em sua filiação ao partido nazista, e acho que consegui; ainda assim, não deixarei de citar aqui para não colaborar com o esquecimento de atos hediondos. Thea Von Harbou foi uma mulher influente que não apenas se filiou ao nazismo como colaborou na escrita de muitos filmes para o partido. Usualmente ela escrevia em parceria com seu ex-marido que dirigia os filmes baseados nos livros dela, inclusive Metrópolis, enquanto estavam juntos.
O que isso tem a ver com o enredo do livro em si? Não muito além do fato de ser transformado em filme. Filme e livro que, por sinal, foram muito ambiciosos e referência para obras até os dias atuais.
Distopia? Ficção científica? Robôs? Há tudo aqui! Antes de Huxley, Harbou já falava de uma sociedade trabalhadora explorada que não fazia menos do que aceitar sua condição. Antes de Star Wars já tínhamos um robô humanoide andando por aí. E, nessa visão futurista, a autora conseguiu, ainda, incluir uma narrativa tão atrelada à bíblia que é impressionante.
Pois bem, Metrópolis é uma distopia em que as máquinas são os novos deuses, e não à toa recebem o nome destes (Ganhesha, Baal, etc.), e esses deuses exigem sacrifícios, que é nada mais nada menos que o suor e exploração da classe trabalhadora, em suas máquinas infernais por 10h por dia, sem descanso, e vivendo no subsolo da cidade. Enquanto isso, no topo, temos a classe dominante com seu dinheiro e vivendo em grandes arranha céus. É nela que aparece o salvador Freder, filho de Joh Fredersen o dono da Metrópolis, um jovem apaixonado por uma revolucionária pacifista, Maria, que percebe que entre Cérebro (Joh Fredersen) e Mãos (operários) é preciso ter um coração. Utópico, não?
A obra tem, realmente, pontos revolucionários para a escrita e uma visão muito esperançosa de enredo, é interessante ver como Harbou escreveu pensando no roteiro e, sabendo que sua obra se tornaria filme, trouxe uma narrativa um tanto quanto rápida e objetiva: tudo acontece muito facilmente e o visual é o que mais tem destaque.
Ainda assim, o enredo em si deixa a desejar para nós leitores com consciência de classe. Afinal, vê-se uma horda de trabalhadores que não pensam, não têm história e nem familiares e que, mesmo em sua revolução, as ações são controladas por um elemento externo e não por eles mesmos, pessoas que perderam sua humanidade e estão literalmente em estado de escravidão e que apenas aguardam a próxima ordem. Não se prega uma revolução, mas sim, o contrário, fala-se dos perigos da revolução, os perigos de ir contra o que te escraviza. Uma história que diz ao pobre: tenha medo. Para eles não há redenção, a redenção é destinada apenas à elite, como sempre. Uma conclusão esperançosa para quem está no comando e conformista para quem está no proletariado.
E é justamente por isso que indico o livro, para que não caia do esquecimento, para que não tenhamos novamente uma narrativa como essa vista como aceitável. E, para aqueles que buscam diversão, que seja possível ter contato com a ficção científica e distópica em uma de suas versões mais iniciais.
"'O que vocês querem?', perguntei. E uma pessoa respondeu: 'Estamos esperando, sr. Fredersen.'
'O quê?', perguntei.
'Estamos esperando', continuou o porta-voz, 'que alguém venha e nos diga qual caminho seguir.'"