Larissa Guedes de Souza 26/07/2022
Esse é daqueles livros que você tem tomar seu tempo para ler. Eu demorei umas semanas para terminar de ler, mas não porque era chato, ou difícil, ou qualquer coisa do tipo. Não, eu só precisava dar umas pausas às vezes para refletir, para ficar revoltada, para ficar triste, ou sei lá. Eu senti tanto com essa narrativa que recomendo imensamente a todos ler esse livro. É uma aula sobre a ditadura de uma forma sensível. O autor narra como se estivesse conversando com um amigo e contando momentos do seu passado.
O livro fala sobre o período da ditadura militar, mas não exatamente daquele jeito histórico. O Marcelo Rubens Paiva conta a sua própria história, a história da sua família, que infelizmente representa a história de centenas de famílias brasileiras. O pai dele, Rubens Paiva, que já tinha sido deputado federal, foi exilado político, preso e depois "desaparecido" da ditadura. Eunice Paiva, mãe de Marcelo e mais 4 irmãos, virou advogada respeitada e ativista em lutas sociais e políticas.
A história não é narrada de forma linear, nem é gráfica sobre os horrores da ditadura, mas ainda assim é um dos relatos mais fortes que li sobre o período. Porque tudo é contado da perspectiva do autor, que no início era uma criança que de repente nunca mais viu seu pai, que cresceu em meio a esse regime político perverso, que viu sua mãe lutar por 25 anos para finalmente conseguir um "simples" atestado de óbito e depois perecer aos poucos para o Alzheimer.
Muita gente pensa que a ditadura militar brasileira, ou qualquer período de guerra ou ditaduras em qualquer lugar do mundo, é tiro, porrada e bomba 24 horas por dia, em toda esquina. Já vi pessoas quererem relativizar e chamar de "ditabranda", pois já viu fotos de pessoas na praia, ou mostrando que tinham novelas e outras coisas acontecendo, "então, não podia ser tão ruim assim". Elas não entendem que a vida continua, mesmo durante uma ditadura. Sim, muita gente está sendo torturada e assassinada, mas na mesma hora tem gente curtindo um churrasco e passeando no shopping. Tem gente se casando e tem gente com o marido desaparecido para sempre.
O livro mostra muito isso. A vida família Paiva seguindo em frente, mas sempre sob aquela sombra do desaparecimento (leia-se: assassinato) de Rubens Paiva. Como Marcelo viajava com os amigos, paquerava garotas, sua mãe trabalhava para cuidar dos 5 filhos, tudo isso enquanto viviam em um limbo burocrático, pois sabiam que o ex-deputado estava morto, mas oficialmente estava vivo, pois não havia um corpo.
Eu senti o livro como um desabafo. É surreal você pensar que hoje tem gente que minimiza e até debocha dos mortos e desaparecidos da ditadura, que dizem que "gente de bem não sofreu nada", que o Golpe de 64 foi na verdade uma revolução e fazem celebrações no seu aniversário. A história conta dos horrores cotidianos de uma família despedaçada. E eu precisava dar minhas pausas na leitura para refletir sobre vários pontos abordados, ou para conseguir digerir como eles conseguiram passar por tudo aquilo. Não é apelativo, mas eu senti tudo.
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