Roberto 06/06/2021
Nesta obra sensacional, Alex Haley narrou a trajetória de sua família, desde o século XVIII, na aldeia de Juffure, em Gâmbia, na África até chegar a si mesmo. A ideia de escrever o livro veio das histórias contadas por sua avó e suas tias velhas sobre seu ancestral chamado de Kunta Kinte, capturado próximo a sua aldeia e levado aos Estados Unidos como escravizado.
É possível dividir o livro em duas partes, de acordo com o cenário em que se passa a história. A primeira parte acontece na África e se inicia com o nascimento de Kunta, primeiro filho de Omoro e Binta Kinte. O autor descreve a cultura mandinga com riqueza de detalhes, à medida em que narra a história dos personagens. Vemos aqui várias tradições desse grupo étnico do qual fizeram parte vários dos negros que também foram trazidos para o Brasil: a escolha de um nome relevante pelo pai da criança, que deve ser revelado primeiramente a ela, no oitavo dia após seu nascimento; sua religiosidade, que mescla o islamismo com o culto aos ancestrais; o processo de socialização na escola islâmica da aldeia, que culmina com o árduo rito de passagem, depois do qual o menino com aproximadamente 12 anos passa a ser considerado homem; dentre outras. Gosto muito também da distinção tratada no livro entre a escravidão praticada pelos os negros dentro da África e a escravidão imputada aos negros pelos brancos europeus. Essa distinção joga por terra qualquer justificação do tráfico negreiro e da escravidão transatlântica pelo fato de já haver escravidão na África antes da chegada dos brancos.
A captura de Kunta, o triste relato do drama vivido por aqueles seres humanos escravizados nos navios negreiros e a chegada do jovem mandinga aos Estados Unidos, onde foi logo vendido, marca a transição para a segunda parte do livro, que se passa na propalada terra da liberdade, mas que se construiu pela exploração do trabalho escravo. Aqui, Kunta cresce em meio a muito sofrimento, se casa, tem uma filha e passa o protagonismo narrativo para seus descendentes a partir dela. A história da família de Kunta, que em vez de manter o sobrenome Kinte, adota os sobrenomes dos vários fazendeiros que a adquire, se confunde com a história dos Estados Unidos. Vários momentos importantes da história desse país são comentados pelos protagonistas, como a guerra de independência, os ecos da Revolução Haitiana, a campanha abolicionista, a guerra de secessão, dentre outros. Muito engraçado é ler a opinião dos negros sobre esses eventos, principalmente quando eles comentam que os brancos buscavam a independência para serem livres, sendo que eles pareciam muito livres para os negros.
O livro tem muitas passagens admiráveis, outras tantas tristes e desalentadoras e mais algumas que enchem o coração de alegria. Leitura recomendadíssima para todos aqueles que se interessam minimamente pela discussão das relações etnicorraciais. Não há como o ler e ficar impassível diante do sofrimento de todo um contingente populacional, sofrimento este que muitas vezes se perpetua até os dias de hoje seja nos Estados Unidos, seja no Brasil, ou em qualquer outro lugar onde vigorou a escravidão de negros africanos.