Adolfo 06/05/2021
Sinceramente, só fala mal dessa trilogia quem a leu errado
Até agora neste 2021 essa trilogia foi a parada mais fora da curva que peguei pra ler, que qualquer um deve ter decidido pegar pra ler e o feito até aqui este final, e certamente por isso se deu uma polarização visível entre várias críticas e resenhas em torno da obra. Então vou tentar não falar demais, e nisso não entrar nos méritos e deméritos dos textos e condução dos mesmos, que de início vão mesmo colonizar o leitor; vão inocular esse brilho nele, e aperfeiçoá-lo ou desfigurá-lo, com certeza mudá-lo.
A esta altura, após lidos os primeiros livros, já deve estar bem claro que a palavra escrita não é a parte crucial da mensagem -- mas na inépcia dos seus limites um convite obscuro. Um artifício obsoleto, ainda que funcional, a uma compreensão abrangente e interseccionada, mas tão dolorosa quanto é limitada a percepção de linguagem. Pois bem, feito as amostras que chegaram ao Comando Sul, postas sob escrutínio rigoroso das expectativas, olhar fixamente para qualquer questão do livro e esperar que ela pisque primeiro só vai causar perplexidade e frustração. Vai transformá-lo a em mais uma criatura que geme entre os juncos, essa galera aqui cheia de mi-mi-mi porque não teve sua curiosidade sossegada.
Este livro não é sobre saciedade, sobre resolução, sobre se conectar com os personagens, mas sobre assimilação e mudança. Sobre um processo em andamento tão sutil quanto inexorável, num ritmo de tal forma próprio que ao se entrar em compasso através dos personagens, nossos portais à Área X e veículos através dela, o ajuste é meticulosa e violentamente brusco. Cada revelação é bíblica aqui, porém não é o livro das revelações o mais obscuro de todos? E falando no Apocalipse, o livro é tão nítido em sua opacidade, em sua exigência de um sacrifício humano ou fucking 38! que mesmo o Rastejador da torre e mesmo a Bióloga parecem ter sido diretamente tirados das descrições de anjos do Velho Testamento... Essa ficção científica, mesmo em sua explicação mais cabal, quase nos pede para simplesmente ter fé naquilo. Aqui o sono da razão só nos traz monstros, feito como nunca esse diabo desses três livros foram uma influência nos meus sonhos essa semana. Cada revelação, desde o final de Controle, é pura e simplesmente assombrosa. Não há mais o deslumbramento, o horror confuso e letárgico de Aniquilação. São bombas que se vê explodir ao longe e até cair a ficha mal sobra tempo de se preparar para a onda de choque.
Por fim, que já escrevi demais, este livro vai concluir a trilogia entretanto não vai oferecer as resoluções esperadas, não trará à luz a maioria das respostas, nem definirá maiores desfechos. Ele é "um enigma embrulhado num quebra-cabeça". Vai se retroalimentar das respostas dadas a nos conduzir a mais especulações. Vai recombinar suas certezas, vai imortalizar suas paranoias numa flor que não morre, vai colocar "alguma coisa no seu olho de que você não consegue se livrar". Este livro é uma verdadeira extensão da Área X nas suas mãos, e pro bem ou para o mal, sem propósito inicial algum, uma contaminação que não poderá ser contida, uma fronteira que vai se expandir sabe-se lá até onde... Sem querer forçar o trocadilho, um verdadeiro "aceita que dói menos".