spoiler visualizarAllan Kenayt 22/05/2021
O Quarto de Despejo ainda continua?
O Quarto de Despejo ainda continua?
I.
Falar de "Quarto de despejo: diário de uma favelada", da Carolina Maria de Jesus, implica falar de muitas coisas; tocar e abrir algumas feridas na carne, no pessoal, no cotidiano, no social, etc. pois, mais que um diário, é um relato, é um registro de um tempo que se comparado com o agora — 2021 —, poucas foram as mudanças e muitas, as pioras.
II.
Acaso podemos dizer que houve redução na miséria e na desigualdade?
Acaso podemos dizer que este país — com sua política de favores — tem favorecido os menos favorecidos?
Não, não podemos.
Seria mentir a realidade que nos cerca.
E o que esse livro faz é nos expor à aquilo que por vezes queremos ignorar: a própria realidade.
Então, nessa leitura — diria obrigatória — pesada, como se pisasse no abismo, tu estarás em convívio, na pele na carne e nos ossos, da vida dentro e além da favela.
III.
Uma favela é composta de gente, porém, nem toda a gente é flor que se cheire. Seja dentro, ou se fora, da favela.
E no decorrer da leitura encontramos esse tipo de gente — e alguns monstros.
Gente que buscará tirar proveito do pobre de várias maneiras — até com as propostas indecentes.
O pobre tirando proveito de outro pobre.
O negro cometendo racismo à outro negro; e não fica claro se foi voluntário ou se em razão de estar num grupo de pessoas brancas.
Os que bebem e brigam.
Os que bebem e acabaram incentivando uma criança a beber.
O nojo do incesto. O assédio. O possível crime sexual...
Os que perderam a esperança.
A Miséria alimentícia. A Miséria moral. A Miséria.
E outras coisas mais.
Nisso, te pergunto: Estás preparado para ver uma parte podre, realmente podre, da raça humana?
Queres mesmo ler isso?
Queres sentir o que sentes a Carolina?
[ Há nesse livro, uma escassa alegria. ]
Pois esse livro não é um passeio no campo com pássaros cantando e o sol brilhando ao fundo.
Esse livro é o fato passado, possivelmente o fato presente, e [ tomara que não ] o fato futuro.
Porque muito desse livro publicado no ano de 1960, é ainda o agora, de 2021.
IV.
Carolina Maria de Jesus é uma mulher afro-brasileira, uma mulher negra; e suas palavras ecoam de tal forma nesse livro, que chegam a rasgar os lábios na pronúncia de cada palavra.
Esse livro é a memória que gostaríamos de esquecer, mas não podemos, mas não poderemos, porque nos assombra se comparamos alguns contextos daquele tempo com alguns contextos de agora — 2021.
[ E passa a sensação de que quase nada mudou... ]
V.
De fato, há muito para se dizer sobre esse livro, mas convido vocês a descobrirem; caso tenham a coragem necessária; pois como dito, esse livro não é uma carícia mas a própria ferida que torce-se para cicatrizar-se.
Ou, é uma ferida sem tempo de se cicatrizar...
VI.
Enfim, valorizem a literatura nacional.
PRINCIPALMENTE, a literatura nacional escrita por MULHERES.
E AINDA MAIS, a literatura nacional escrita por MULHERES NEGRAS.
NÃO SE ESQUEÇAM DELAS! LEMBREM DELAS! LEMBREM-SE DELAS!
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P.S.¹: algumas cousas foram adicionadas após um diálogo que tive com a minha querida irmã, Karolaynne.
P.S.²: a estrutura dessa "resenha" foi baseada na estrutura utilizada pelo querido amigo José Danilo Rangel.
site: https://www.instagram.com/allan.kenayt/