Flávio Sanso 28/08/2013
Melancolia Real
Quem entrar na Catedral de São Pedro de Alcântara, em Petrópolis, e caminhar alguns passos para a direita, pode ser acometido por uma estranha sensação de melancolia. Ao menos foi o que eu senti. Por ali estão os restos mortais de D. Pedro II e de alguns de seus familiares mais próximos.
O segundo e último imperador do Brasil conseguiu aquilo com que muitos políticos contemporâneos mais sonham: exerceu o poder prolongadamente – foram exatos 49 anos, 3 meses e 22 dias. Não fossem afoitos os republicanos, por pouco o país teria sido comandado por uma única pessoa durante meio século. Aliás, o comum é que o homem persiga enlouquecidamente o poder. Com D. Pedro II foi diferente. O poder o perseguiu, ou melhor, ficou à sua espera até que os dois se encontrassem quando o jovem imperador nem sequer havia completado 15 anos de idade. Sua mãe havia falecido. Seu pai partira para Portugal. Sem escolha restou-lhe a missão de governar uma gigantesca e problemática nação dos trópicos.
Durante a infância visitei Petrópolis diversas vezes, mas só recentemente me interessei pelos aspectos históricos da cidade, e por consequência li o livro “Perfis Brasileiros – D. Pedro II” de José Murilo de Carvalho. Nessas horas é que vem à mente o clichê tão propalado nas aulas de história, segundo o qual é preciso estudar o passado para entender o presente. Não há dúvida de que o Brasil é vocacionado à tradição de cultivar a imprensa livre (a ditadura é a exceção que confirma regra). Nesse contexto, D. Pedro II, leitor compulsivo, já na sua época fazia questão de não interromper o fluxo da liberdade de imprensa, mesmo que fosse submetido a críticas vorazes que às vezes beiravam à ridicularização. Também impressiona que o Brasil, com a independência recém-proclamada, e por isso ainda cambaleante em todos os aspectos, tenha tido à frente um estadista que conquistou a admiração da Europa e até dos Estados Unidos, país de notória reputação republicana. Conforme destaca José Murilo de Carvalho, D. Pedro II “foi deposto e exilado aos 65 anos, deixando consolidada a unidade do país, abolidos o tráfico e a escravidão, e estabelecidas as bases do sistema representativo graças à ininterrupta realização de eleições e à grande liberdade de imprensa. Pela longevidade do governo e pelas transformações efetuadas em seu transcurso, nenhum outro chefe de Estado marcou mais profundamente a história do país.”
Na catedral, um guia de turismo, que pronunciava orgulhosa e pausadamente todos os vários nomes do imperador, afirmou com dramaticidade que D. Pedro II, considerado um dos oito homens mais cultos de seu tempo, morreu doente, pobre e longe da terra que amava. Minha melancolia tinha a ver com o destino ingrato que se enxergava naquele mausoléu imperial.
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