Tamirez | @resenhandosonhos 22/08/2018Neve e CinzasEu estava super curiosa com o livro em função da capa chamar muito a atenção e de estar super bem falado lá fora, porém minha experiência com Neve e Cinzas foi extremamente conflitante e enquanto amei certas coisas outras foram muito clichês ou previsíveis, prejudicando um pouco o resultado final.
A coisa mais legal do livro é com toda a certeza o mundo e a organização política e mágica determinada. Gosto bastante das divisões de reinos, principalmente dos Reinos Estação que é onde o foco desse primeiro livro está. As quatro estações ficam ao sul desse continente e cada um dos reinos possui as características da estação que representa, não só no clima, mas também alterando a estrutura física de seu povo. Por exemplo, os invernianos possuem a pele muito clara e o cabelo branco, portanto podem ser identificados somente com um olhar e o território é frio e com gelo, me lembrando um pouco o cenário de Frozen ou de Winterfel da série As Crônicas de Gelo e Fogo.
Além dessas características, também é possível perceber que há uma pequena rixa com os Reinos Ritmo e que eles não conversam muito entre si, ficando cada um no seu canto. Isso faz com que Outono e Verão fiquem também a mercê de um possível ataque de Primavera se o momento chegar, já que nenhum dos dois reinos possui estabilidade ou poderio para ir contra o Rei Angra. E, sendo assim, nenhum deles tem verdadeiramente o poder para ajudar Inverno e seu povo a se reerguer.
O fato de os Condutores serem ligados não só às linhagens de sangue mas também de gênero me deixou encantada. Além da divisão de quatro e quatro quanto aos reinos, isso também acontece com relação aos gêneros. Temos quatro reinos com condutores de linhagem feminina e quatro reinos com condutores de linhagem masculina, o que impõe um obstáculo a mais na linha de sucessão, já que aparentemente o que importa é o filho que nascer com o gênero certo primeiro.
Esse fator gera um dos conflitos interessantes do livro que é sobre o Príncipe Herdeiro Mather. Mesmo que ele recupere as duas partes do amuleto do Inverno, que pertencia a Rainha e sua mãe Hannah Dynam, será que isso realmente vai ajuda-lo a libertar seu povo? Não há nenhuma evidencia de que ele poderá controlar o poder do Condutor, pois ele não possui todos os requisitos, ele é um homem em uma linhagem de poder feminina. Mas, apensas de tudo, ele treina e se esforça muito para estar a altura do título e da esperança que as pessoas tem nele.
“Quanto tempo levou para que parassem de esperar que os libertássemos? Quanto tempo levou até que a tortura de Angra tirasse das mentes deles a esperança de uma fuga? Quanto tempo levarei para sentir o mesmo?”
O povo de Inverno foi escravizado e vive em condições horríveis na mão do Rei da Primavera. Ele os pôs para fazer trabalho escravo e os mantém em constante exaustão, dos mais velhos às crianças. Porém ainda há uma chama entre eles. Eles sabem que o herdeiro do trono está vivo e que em algum momento ele pode aparecer e os resgatar.
Porém, Mather não é o protagonista da história e sim Meira, a garota órfã que cresceu entre os sobreviventes e que mesmo nunca tendo visto sua terra, nunca tendo posto os pés em Inverno, sabe da importância de encontrar as duas partes do amuleto e retomar o que é dos invernianos por direito. Meira tenta se manter útil, mas é sempre deixada de lado e isso a irrita profundamente. Porém, ela terá o seu papel na história e, quando revelado o que ela terá que fazer, não fica exatamente satisfeita.
“Tenho sido tão egoísta, não tenho? Egoísta e limitada e errada, porque queria ser importante para Inverno, mas do meu jeito.”
Essa é sem dúvida a personagem com quem mais eu tenho conflito e, ela ser a principal não ajuda. Primeiro ela consegue ter um sentimento de “mimada” em um mundo onde ela é oprimida. Ela quer ajudar a sua terra, mas só fazendo as coisas que ela quer, que lhe deem glória. Se significar sacrifício é hora de fazer o drama e por o beicinho pra frente, sem realmente parar, pensar, e tentar encontrar uma forma de raciocinar a situação. Esse fato, aliada a situação mais clichê IMPOSSÍVEL que é de ela se apaixonar pelo Príncipe que ela jamais poderá ter porque ele casará por aliança, fez com que eu ficasse extremamente desgostosa da garota.
É claro que ela melhora com o decorrer do livro, mas ainda assim deixa bastante a desejar em termos de carisma. O que ela pensa, como a quote elencada a cima, muitas das vezes não condiz com o que ela faz e, por mais que constate que as vezes é um pouco egoísta demais, segue agindo da mesma forma. Seu crescimento acontece bem ao fim do livro, quando parece que ela “se toca” do que está acontecendo, mas não tenho certeza se a maturidade irá se firmar no segundo livro ou se ela perderá novamente a linha correta de agir.
Mas essas coisas não são inéditas de livros de fantasia, temos a mesma coisa acontecendo nos dois primeiros volumes de A Queda dos Reinos, por exemplo. O que realmente me desanimou foi ter sacado a história antes de alcançar a página 100. Eu vi muitas resenhas de gente que achou o livro muito bom e que se surpreendeu super com o desfecho. Adorei ler que eram pessoas que estavam começando na fantasia pois sustenta exatamente a minha linha de pensamento. O que acontece no fim desse livro não é inédito de Sara Raasch, mas também não está escancarado para qualquer um ver, o problema é que eu leio muito do gênero e, como qualquer gênero, tem seus próprios clichês e coisas que se repetem.
“Um dia seremos mais do que palavras no escuro.”
Quando alguns flashbacks são inseridos eu formulei duas teorias. Ao fim do livro vi que ambas haviam se confirmado e que era um mix das opções que eu pensei. Para quem não lê muita fantasia ou não leu livros específicos onde algumas coisas semelhantes acontecem, tenho certeza que a experiência será bacana e que você pode se surpreender muito com o livro. Mas, se você é uma ursa velha dos mundos fantásticos assim como eu sou, prepare-se para matar a charada antes da metade do livro e, depois q o final chegou, pareceu ainda mais óbvio que eu fico pensando como que até quem não tem as manhãs não percebe o que está rolando. Mas enfim. É a experiência de cada um e eu acabei tendo o mesmo sentimento de quando eu li A Maldição do Vencedor, outro livro super hypado, que me entregou uma história nada surpreendente com um final previsível. Ambos os livros são bons, mas a relação leitor-história vai depender da sua bagagem literária, anota ai.
A estrutura política e mágica do livro é lindamente construída, a trama é interessante e esse é provavelmente um dos universos fantásticos que eu mais adorei conhecer em 2016, mas o livros tem muitos “poréns” para serem ignorados por mim e isso me deixou bem triste. Vocês conseguem ver o conflito? Eu sempre brigo por os livros não trabalharem bem seus universos e focarem em romances ou histórias paralelas e aqui temos um mundo muito legal que acabou tendo o seu valor ofuscado pela possível obviedade da solução do dilema do livro e por problemas com as personalidades e enredos dos personagens.
Aos leitores não calejados tenho certeza que o livro passará uma história muito bacana, como vi acontecer pelas resenhas que já vi saindo, mas acredito bastante no potencial da série e que ela poderá surpreender daqui pra frente. Há muitas coisas que podem acontecer a partir do final de Neve e Cinzas e espero poder ver um tom mais maduro na continuação, tanto da parte de desenvolvimento da trama, quanto do perfil dos personagens.
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