Queria Estar Lendo 23/07/2016
Resenha: Six of Crows: Sangue e Mentiras
Eu sei que estou sempre falando isso quando um livro me impressiona muito, o que foi o caso de Six of Crows. Então vamos lá: o novo livro da Leigh Bardugo, lançamento da editora Gutenberg, foi a minha melhor leitura do ano até agora. E, definitivamente, uma das melhores coisas que já li na vida!
Seis criminosos, um alvo. Uma recompensa imensurável em troca do resgate de um prisioneiro numa das mais fortificadas prisões de todo aquele mundo. Uma chance de começar de novo para cada um deles, e uma oportunidade de deixar suas marcas na história como foras da lei implacáveis. Six of Crows é a história sobre um grupo de criminosos tentando salvar o seu mundo.
Ainda estamos no universo da trilogia Grisha, mas em outra parte do mapa. A ilha de Kerch tem como principal cidade a portuária Ketterdam, onde mercadores e apostadores procuram bons negócios nos bairros mais sombrios. Em especial, o Barril, antro dos mais vis e perigosos foras da lei daquela região. Kaz Brekker é dono de uma casa de apostas, tem contatos em todos os lugares e é um nome temido e adorado por todos no Barril. Ele é um órfão sombrio, perigoso e ambicioso. E quando uma fortuna lhe é oferecida em troca de um resgate, Kaz resolve aceitar o risco. Afinal de contas, ele tem ao seu lado os melhores criminosos de toda Kerch. Com sua astúcia e ideias mirabolantes quase suicidas, porém geniais, Kaz é o líder da empreitada até um território hostil muito fortificado.
Uma ameaça paira sobre sua realidade, uma droga capaz de aumentar e potencializar imensuravelmente o poder dos Grishas. Um Sangrador pode dobrar homens e evaporar o sangue deles, um Aero pode voar e um Hidros pode se dissolver e atravessar espaços sólidos. A droga é um perigo nas mãos das pessoas erradas, e todos que estão atrás dela são errados; a missão desse grupo é resgatar o criador da droga de uma prisão e trazê-lo de volta para Kerch, onde ele encontrará abrigo seguro para escapar dos criminosos que querem a fórmula do poder supremo.
"Quando todo mundo acha que você é um monstro, não é preciso perder tempo fazendo monstruosidades."
Kaz e sua bengala com uma cabeça de corvo na ponta. Inej e seu conjunto de facas mortíferas. Jesper e suas pistolas que nunca erram um tiro. Wylan e seus mapas e explosivos. Nina e seu poder Grisha. Matthias e sua memória, fé e convicção. Seis indivíduos habilidosos, seis símbolos. Esse é o grupo, esses são os protagonistas. Nenhum deles é mais importante que o outro; todos pertencem e movem a trama.
"Inej uma vez tinha se oferecido para ensiná-lo a cair. "O truque é não ser derrubado", ele lhe disse com uma risada. "Não, Kaz", disse ela, "o truque é se levantar de novo."."
Kaz e Inej são uma balança equilibrada. Onde Kaz é sombrio e soturno, Inej é séria e radiante. Inej era uma escrava do prazer, castigada por um erro tolo, e encontrou sua liberdade quando o chefe de Kaz compra seu contrato. Ela agora serve ao Barril, e se torna a Espectro. Uma ladra, uma assassina, uma sombra impiedosa nas noites. Inej se torna os olhos e os ouvidos de Kaz, sua melhor aposta, sua melhor lutadora e defensora. A força e a coragem de Inej estão em seus passos e em seus pensamentos, na sua fé por deuses que nem sempre respondem suas orações, na sua fé em si mesma. Inej é uma garota quebrada pela vida, mas uma mulher fortificada por ela. Diferente de Kaz, fechado e solitário, Inej é aberta às circunstâncias e às pessoas, amiga dos companheiros de luta, apaixonada pela liberdade. Ela é um raio de sol onde Kaz é a noite escura. Apesar das poucas palavras com maior carga emocional trocada entre eles, seus gestos e trejeitos e ações mostram como um depende do outro.
"E o que você quer, então?"
As velhas respostas vieram fáceis à sua mente. Dinheiro. Vingança. Silenciar para sempre a voz de Jordie de minha cabeça. Mas uma resposta diferente ganhou vida dentro dele, alta, insistente e inoportuna. Você, Inej. Eu quero você."
O mais poderoso na relação de confiança entre eles é isso; o quanto, apesar de parecer o mais cruel e perigoso e inquebrável membro do grupo, Kaz é extremamente frágil perante a Inej. Ela o dobra, ela o quebra, ela rouba o seu coração. E ele não é capaz de entender isso, quanto mais lidar. Kaz viveu muito da dor e da angústia para entender das coisas boas. No decorrer do livro, no entanto, vemos o avanço do que pode ser algo mais. Algo impensado e inesperado e incrivelmente importante. Algo que vai definir os rumos da trama do segundo livro, com toda a certeza.
"Isen ne bejstrum", ela completou. A água escuta e entende. O gelo não perdoa."
Nina e Matthias dividem um passado turbulento. Por causa dela, Matthias estava preso. Por causa dele, Nina quase foi morta. O povo de Matthias caçava e matava Grishas, e Nina é uma. No agora, no entanto, apesar da mágoa e da sensação de que ambos se amam, mas se afastam por essas traições, as interações se tornam mais intensas e gentis com o andamento da trama. Apesar de serem de raças diferentes e de pertencerem a culturas diferentes, ambos dividem um amor pela vida e pela justiça. Matthias é um convicto atrelado à sua fé, e a sua fé nunca ditou nada sobre crueldade e morte. Nina é mais uma libertina, dedicada à própria força, determinada a retornar para casa, onde existe verdadeira paz.
"Eles a temem como um dia eu a temi", ele disse. "Como um dia você me temeu. Todo mundo é o monstro de alguém, Nina."
Ambos viveram guerras diferentes, mas guardam consigo o que os empodera. E o amor sutil que existe entre os dois pelo passado renasce ali no presente. Matthias é o guia do grupo, o cérebro por trás das passagens secretas e do mapa do castelo que precisam invadir, e Nina é o truque na manga, a mágica que aparece quando precisam de sua ajuda, uma Sangradora forte capaz de dobrar homens diante de si. O final dos dois foi tão intenso e incrível! A Nina é tão maravilhosa, tão cheia de si, tão determinada e confiante. Eu amo a força dela, suas nuances de fraqueza e de incerteza e como ela batalha contra isso, e amo como o Matthias a ama e em certos momentos deixa isso incrivelmente óbvio.
Jesper e Wylan são a última dupla compondo esse grupo desigual. Jesper é um personagem canonicamente bissexual, Wylan é homossexual e isso é extremamente importante. Em um livro que possui críticas sobre preconceito racial, a luta contra uma droga destruidora e a inclusão de pessoas tidas como diferentes em uma sociedade rígida, ter representatividade assim é indispensável! Six of Crows é uma fantasia realista, e que os céus abençoem Leigh Bardugo por tudo que ela faz neste livro!
"Sem luto."
"Sem funerais."
Wylan é filho de um mercador importante, de grande renome, e embarca como membro do grupo para provar seu valor e porque não tem mais nada esperando por ele em sua casa. Expulso por motivos misteriosos, Wylan é um gênio solitário, com um bom humor peculiar e um curiosidade inocente sobre o mundo. Ele nunca viu muito dele, nem mesmo da sua ilha natal, e essa viagem é uma inesperada surpresa, cheia de perigos mortíferos. Wylan é um garoto doce e querido e merece ser protegido a todos os custos! Do outro lado, Jesper é um fanfarrão. Apostador meio que viciado na jogatina, Jesper é também o melhor pistoleiro de Kerch, um dos mais habilidosos do grupo de Kaz. Jesper tem pontos de decepção e tristeza em sua passado, coisas que o guiaram até a vida de criminoso, e a ingenuidade dele se equilibra às suas ideias perspicazes. Amo como tanto ele quanto Wylan dividem umas rixas por determinados pontos de suas vidas, e compreensão por outros. Eles são um OTP lindo, e o que nasce entre eles durante o livro vai se expandir ainda mais no segundo volume - até porque de carga dramática amorosa, esses dois são os menos propensos a ficar chorando em vez de se beijar!
"Melhor verdades terríveis do que mentiras gentis."
A história é sobre esses personagens, e também sobre o resgate. As ameaças que pairam sobre o grupo são enormes e desconhecidas, tal como o terreno que eles precisam desbravar. As cenas de ação foram grandiosas e muito bem escritas, a narrativa é impecável e única para cada um dos personagens, e o final foi arrebatador. Do tipo "SOCORRO EU QUERO MAIS!". Leigh Bardugo é uma rainha mesmo, senhoras e senhores.
"O sol estava brilhante, e Inej tinha virado o rosto para ele. O vento do porto levantou seus cabelos escuros, e por um momento Kaz era um garoto novamente, certo de que havia magia neste mundo."
Você pode ler Six of Crows se ainda não leu a Trilogia Grisha, aliás. É um spin-off interligado, porém independente. Alguns pontos da trama podem soar como spoilers para quando você for ler os outros livros, mas são pequenos easter eggs que a Leigh colocou só para nos fazer chorar em posição fetal lembrando a Alina e de outros personagens queridos. No mais, Six of Crows é essencial na sua estante. Acredite em mim.