Lari 28/10/2010
Diário de um Cucaracha
Devo começar essa resenha com um chavão: todos os livros correspondem à parte de alguém. Não é um chavão? Para mim é. Cada livro que leio é uma história de amor, umas bem sucedidas e outras não, ‘Diário de um Cucaracha’ definitivamente foi bem sucedida.
Como todas as histórias começarei pelo início, a capa (ou aparência) o titulo, escrito com nítida associação a bandeira dos EUA, e uma barata, mais que o suficiente para lê-lo. Não? Se a capa não bastasse para ler essa obra o autor certamente bastaria: Henfil.
Se ainda assim alguém ficou em dúvida entre ler ou não uma última informação sobre o livro é definitiva, trate-se de uma coletânea de cartas escritas pelo próprio Henfil á parentes e amigos, que correspondem ao tempo que o autor passou nos Estados Unidos.
As cartas datam de 1973 a 1975 e são paralelas a momentos críticos do regime militar brasileiro. Nelas podemos verificar ocasiões vividas por Henfil como o exílio de seu irmão, caçado pelos militares, ou as constantes investidas da censura ao Pasquim (semanário brasileiro que existiu entre 1969 e 1991, idealizado por nomes como Ziraldo, Millôr e Jaguar, onde Henfil era colaborador).
Sou apaixonada por história, e seria mentira dizer que não achei emocionante ver, da perspectiva de alguém que vivenciava aquele momento, o que foi a ditadura militar. Sim, mas essa é só uma das atrações deste livro, a menor delas na minha singela opinião.
O livro conta principalmente a vida de Henfil nos EUA, a vida dos cucarachas (baratas, apelido dado pelos norte-americanos aos centro e sul-americanos imigrantes) na “Terra Prometida”, a rotina de um cartunista prestigiado no Brasil em um país no qual não é reconhecido, aliás não é ninguém. Como ele sobrevive em um lugar com cultura e língua diferentes, sem sequer falar o idioma. Essas histórias são contadas com o humor típico do autor, tornando-as ainda mais fascinantes. No livro podemos acompanhar a primeira vez em que o autor viu neve, ou ainda suas aventuras no sistema público de saúde americano.
Essa é a temática das cartas, e é extasiante. Mas o que torna esse livro simplesmente espetacular não é temática em si, é a linguagem. Por se tratar de cartas particulares é óbvio que a escrita é muito íntima, é óbvio, mas ainda assim notável. A leitura se torna prazerosa, como se você fizesse parte daquilo tudo. Como ler cartas trocadas entre Henfil e Tárik de Souza (importante repórter e crítico músical) e não se impressionar? Se ainda assim você não se interessou pela obra, sou obrigada a fazer um último apelo, leia a entrevista feita ao Henfil por Jaguar, Ziraldo, Sérgio Cabral e Millôr, ela foi censurada pela ditadura e nunca chegou a ser publicada no Pasquim, no livro pode-se lê-la na integra, é simplesmente espetacular.
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