Maria Clara 11/11/2017
Vencedor de prêmios de ficção científica como o Hugo Awards e o Nebula Awards, o escritor norteamericano Ted Chiang reuniu, em "História da sua vida e outros contos", oito narrativas diferentes. Tratando principalmente da busca do conhecimento, o livro apresenta histórias ambientadas em diferentes épocas.
O primeiro conto, "A Torre da Babilônia", mostra os esforço dos construtores da também conhecida como Torre de Babel: com o objetivo de chegar até o céu, os trabalhadores passam um ano subindo a torre, e a perca de um tijolo é mais sentida que a morte de um homem. O protagonista, Hillalum, avalia a construção e os mistérios divinos a partir do ponto de vista de um escavador (sua função na construção).
"Entenda", o segundo conto, traz a história de um homem que, depois de um tratamento experimental, adquire consciência completa de sua mente e do funcionamento de seu cérebro. Aos poucos, o peso de tanto conhecimento transforma sua maneira de lidar com a sociedade e com seu próprio potencial, levando a uma interessante disputa psicológica. O enredo lembra o do filme "Lucy", em que Scarlett Johansson vivia uma mulher em situação semelhante.
A história "Divisão por zero" traz um questionamento à matemática. Enquanto desenvolve um formalismo, a professora Renee Norwood faz uma descoberta que muda a noção de exatidão que se tem sobre a aritmética: seria possível provar que "1 = 2"? Seria possível, ainda, provar que quaisquer outros números também são iguais? Rapidamente, o questionamento sobre a matemática se transforma numa dúvida sobre tudo o que a protagonista tinha como certeza.
O conto que dá nome ao livro trata dos esforços da linguista Louise Banks para estabelecer a comunicação com alienígenas que chegaram à terra. Em "História da sua vida", ela mescla o método de contato com os extraterrestres à lembrança de diferentes fatos da vida de sua filha. As duas narrativas lentamente mostram sua relação, misturando noções como o futuro e a capacidade de raciocínio a partir da forma como nos relacionamos com a língua. A história foi adaptada para o cinema, dando origem ao filme "A Chegada" - indicado ao Oscar em oito categorias.
Em "Setenta e duas letras", Chiang trata da geração de vida em seres inanimados. O conto apresenta tentativas de animar autômatos, evocando tanto robôs quanto os golems da tradição judaica. Indo além do que o enredo traz, porém, também é possível ao leitor fazer referência a questões genéticas - como a seleção, ainda em fase embrional, das características que cada indivíduo apresentará ao nascer.
"A Evolução da ciência humana" se diferencia dos outros contos por sua estrutura: mais curto, o texto se assemelha a um artigo de revista. Ao final do livro, nas notas em que fala sobre cada conto, Chiang explicou que se trata realmente de um texto proposto pela revista Nature, em que o autor deveria falar sobre um desenvolvimento científico a ocorrer no milênio seguinte.
Fenômenos ligados a religião são o tema central de "O Inferno é a ausência de Deus". Esta história, porém, acompanha a relação de três pessoas com a aparição de anjos - cujos efeitos podem ser fatais para os humanos. O conto questiona se uma vida virtuosa é garantia para a eternidade no paraíso.
"Gostando do que vê: um documentário" é uma grande discussão sobre a beleza, a importância que damos a ela e suas relações com a discriminação. Ao propor um debate sobre a possibilidade de tornar as pessoas imunes à diferenciação entre "belo" e "feio", Chiang faz com que o próprio leitor se questione sobre o quanto valoriza o quesito estético em suas relações. O texto dispõe os depoimentos como se fosse, realmente, um documentário. O fato de que não há como ver o rosto de cada entrevistado, porém, é um elemento a mais no debate estético, já que não é possível ver a aparência de quem é contra ou a favor da capacidade de enxergar a beleza.
Reunidos, os contos de Chiang oferecem ao leitor não apenas um bom entretenimento, como também oportunidades de pensar sobre a ciência em nosso cotidiano.
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