Estêvão 19/11/2020Normalmente, quando lemos livro grandes, estabelecemos uma relação com o personagens, pessoas com quem vivemos meses, horas por dia. No caso de A cabana do Pai Tomás, de Harriet Beecher, isso não aconteceu, e ao longo de três meses e das quase 700 páginas, o desejo era de logo acabar a leitura. Muito disso se deu devido ao estilo da autora, aos personagens rasos e à forma como a escravidão é representada. .
Basicamente, a obra conta a história de Tomás, um escravo de uma casa em Kentucky conhecido por sua devoção e pela rigidez de espírito que, por diversos motivos, vê, após sucessivas compras, sua fé testada. Paralelamente, outros escravos também têm suas vidas narradas, construindo um quadro do que foi a escravidão naquela região. .
Porém, apesar de o livro ter a escravidão com alvo de suas críticas, a autora faz isso de forma problemática, havendo um excesso de religiosidade nos argumentos, bem como na construção de alguns personagens, como Tomás. O desequilíbrio entre a fé e uma submissão tem por fim transformar Tomás em um mártir pelo fim da escravidão, mas o que nos deixa nas entrelinhas é uma incapacidade de expor abertamente o papel da igreja para a manutenção da estrutura escravocrata. .
Esse problema se repete também na construção dos personagens, como os donos de escravos, estes também cristãos, e por isso pintados com condescendência, que se contrasta com os capatazes e vendedores de escravos, estes ateus, e por isso cruéis. Além da óbvia esquematização entre bem e mal, há aqui também uma ausência de olhar crítico para o papel da igreja nesse cenário, pois os personagens cristãos possuem atitudes respeitosas com seus escravos, que vivem bem em suas casas.
Curiosamente, de alguma forma isso deu certo na época, pois a obra é apontada como um dos marcos para o fim da escravidão nos Estados Unidos. Porém, o livro tem problemas, como apontei, e é enfadonho, uma ladainha religiosa exagerada que se torna repetitiva em muitas partes. .
Como também é problemático o capítulo final, que destoa de todo o resto, podendo muito bem ser um posfácio, pois trata-se de respostas da autora para cartas que recebia quando os capítulo saiam em folhetins. .
Além disso, esta edição da @amarilyseditora é bastante descuidada com a escrita, repleta de erros de grafia. Porém, há outra edição disponível, que não li, mas que, por conhecer a qualidade dos livros da @carambaia , acredito que seja uma melhor opção. .
Enfim, A cabana do pai Tomás é um clássico da literatura dos EUA que envelheceu mal, é simplório, pouco emocionante e opta por construir suas críticas a partir de uma ótica religiosa que soa condescendente e esquemática.
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